CNH sem autoescolas: Duas horas de aulas práticas, carros sem duplo comando e instrutores autônomos. Confira em detalhes a nova resolução do Contran
Normas aprovadas pelo Conselho trazem flexibilidade e digitalização, reduzindo as exigências de cursos e exames para a formação de condutores
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A nova resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) - autoridade máxima em Legislação de trânsito no País - sobre as novas regras para a formação dos condutores no Brasil ainda não foi publicada oficialmente no Diário Oficial da União (DOU), mas o JC teve acesso ao texto original. A Resolução Nº 1.020 normatiza os procedimentos sobre a aprendizagem e a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e, em resumo, flexibiliza de todas as formas possíveis as exigências que desde 1997 estão em vigor com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
De um lado, o governo federal, autor da proposta via Ministério dos Transportes e Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), faz a leitura de que a Resolução Nº 1.020 tem como objetivo central estabelecer um modelo mais acessível e flexível, desburocratizado o processo de habilitação dos condutores brasileiros. E, assim, barateando a retirada da CNH em até 80% - como tem garantido o ministro dos Transportes, Renan Filho, e o secretário Nacional de Trânsito, Adrualdo Catão.
Mas, quando a leitura sobre as novas mudanças é feita pelos Centros de Formação de Condutores (CFCs) - os mais afetados economicamente pela nova resolução - e pelos setores que de alguma forma lidam com a segurança viária e a educação de trânsito (Detrans, médicos de tráfego e educadores) a flexibilização é bastante criticada.
O entendimento é de que a redução do custo de obtenção de uma habilitação - necessária, concordam - deveria ser amplamente discutida e viabilizada de outras formas que não seja comprometendo o ensino dos futuros motoristas. Principalmente com a retirada da exigência mínima de aulas teóricas e a redução de 20 horas para apenas duas horas de aulas práticas de direção.
Quem é contra as mudanças - implantadas a toque de caixa e com uma eleição nacional já se configurando - avalia que a transferência de autonomia para o cidadão sobre o processo de educação antes da realização dos testes teóricos e práticos - que não mudam - é perigosa. Muito perigosa.
Principalmente num País com uma ampla desigualdade social, onde a motocicleta virou instrumento de trabalho - veja a explosão do Uber e 99 Moto no Brasil - e onde o trânsito mata 34 mil pessoas por ano e deixa outras 200 mil mutiladas.
APENAS DUAS AULAS PRÁTICAS E DESOBRIGAÇÃO DE SER NA AUTOESCOLA
Segundo a Resolução 1.020 do Contran, a carga horária mínima exigida para as aulas práticas de direção passa a ser de apenas duas horas, podendo ser cumprida de forma contínua ou fracionada. Antes, eram exigidas 20 horas. Os candidatos que optarem pela obtenção concomitante das categorias A e B deverão cumprir a carga horária mínima de duas horas para cada categoria.
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As aulas práticas de direção veicular são obrigatórias para a obtenção da CNH, mas agora dispensadas para a Autorização para Conduzir Ciclomotor (ACC). As aulas práticas, entretanto, devem ser realizadas sob acompanhamento e supervisão permanente de um instrutor de trânsito devidamente autorizado.
Outra grande mudança é que, agora, o curso prático poderá ser realizado junto a instrutores de trânsito autônomos, ou instrutores vinculados a autoescolas, Escolas Públicas de Trânsito ou órgãos integrantes do Sistema Nacional de Trânsito.
CURSO TEÓRICO SEM CARGA HORÁRIA MÍNIMA
Os cursos teóricos destinados ao processo de obtenção da CNH ou da ACC não estão mais sujeitos a uma carga horária mínima pré-definida. Antes, eram 45 horas. A duração e a estrutura podem ser livremente estabelecidas pelos órgãos ou entidades responsáveis, desde que sigam o conteúdo didático-pedagógico e as diretrizes do órgão máximo executivo de trânsito da União - no caso a Senatran. O curso pode ser oferecido por diversas entidades, incluindo:
- Órgão máximo executivo de trânsito da União (modalidade EaD assíncrono).
- Autoescolas (presencial ou EaD síncrono ou assíncrono).
- Entidades especializadas de ensino EaD.
Escolas Públicas de Trânsito ou órgãos ou entidades integrantes do Sistema Nacional de Trânsito (presencial ou EaD síncrono ou assíncrono).
- A escolha do órgão ou entidade, bem como da modalidade de aprendizagem, é exclusiva do candidato, que pode optar pela combinação de mais de uma opção de formação, de modo concomitante ou sucessivo.
- A conclusão do curso é determinada pelo órgão ou entidade que o oferece, com base em critérios como controle de interação com o conteúdo (EaD), avaliações de aprendizagem (todas as modalidades) ou controle de frequência (presencial e EaD síncrono).
EXAMES TEÓRICOS PODERÃO SER FEITOS ATÉ DE CASA
Os exames teóricos consistem em provas objetivas, compostas por trinta questões escritas de múltipla escolha, com quatro alternativas e apenas uma correta. A finalidade é avaliar o domínio do candidato sobre os conteúdos para aferir sua aptidão quanto aos conhecimentos indispensáveis à segurança viária e à formação cidadã no trânsito.
O Banco Nacional de Questões, utilizado para extrair as perguntas, é organizado e mantido pelo órgão máximo executivo de trânsito da União e estará disponível à sociedade.
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Em relação ao formato e aplicação, os exames deverão ter formato eletrônico (em ambiente digital) e, em caráter excepcional, físico (em meio impresso). A aplicação poderá ser presencial (sob supervisão direta), híbrida (monitoramento eletrônico em local designado) ou remota (monitoramento eletrônico em local de escolha do candidato).
A duração dos exames é de, no mínimo, uma hora, sendo obrigatoriamente dobrada para candidatos com dislexia, TDAH ou Transtorno do Espectro Autista (TEA). Para a aprovação, o candidato deve alcançar um aproveitamento mínimo de vinte acertos. Caso reprove, o candidato poderá submeter-se a novas avaliações sem limitação de tentativas e com o primeiro reteste realizado sem a cobrança de taxas adicionais do candidato.
Outra novidade que vem sendo criticada pelo setor de educação de trânsito é a ordem dos exames médicos, que passarão a ser realizados apenas se o candidato for aprovado no teste teórico de habilitação. Hoje em dia é feito antes mesmo do início das aulas.
INSTRUTORES DE TRÂNSITO PODERÃO SER AUTÔNOMOS
Além da flexibilização da carga horária para as aulas práticas e teóricas, a segunda maior novidade das novas regras aprovadas pelo Contran é a criação do instrutor de trânsito autônomo. Agora, eles poderão atuar de forma autônoma ou vinculados a autoescolas, órgãos e entidades.
É exigido que os instrutores apresentem certidão negativa de antecedentes criminais e atendam a requisitos legais. A validação de todos os instrutores autônomos será feita no site e app oficial de toda a mudança - que se chamará CNH do Brasil, uma versão ampliada da Carteira Digital de Trânsito (CDT).
É vedado aos instrutores divulgar dados, informações ou imagens das aulas sem autorização expressa do aluno, ou utilizar equipamentos eletrônicos não relacionados à atividade durante a instrução. As penalidades para instrutores incluem advertência, suspensão ou cancelamento da autorização em casos de fraude ou conduta incompatível.
VEÍCULOS: FIM DA OBRIGATORIEDADE DE ADAPTAÇÕES E LIBERAÇÃO DO CARRO AUTOMÁTICO PARA AULAS
A nova regulamentação também flexibiliza a utilização de veículos destinados à formação de condutores, seja para o aprendizado ou para os exames de direção veicular. E mais: não é exigida mais qualquer adaptação ou modificação no veículo para a realização dessas atividades - entre elas o uso do duplo comando, até hoje uma exigência para as aulas de direção e teste prático.
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Apenas a identificação veicular permanece. Os veículos destinados à formação de condutores (categoria de aprendizagem) devem ter a faixa amarela de vinte centímetros de largura pintada ao longo da carroçaria, com a inscrição "AUTOESCOLA" na cor preta. Enquanto que os veículos eventualmente utilizados devem ter uma faixa branca removível.
FORMAÇÃO DE MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS, POLICIAIS E BOMBEIROS
Militares das Forças Armadas e Auxiliares, bem como policiais e bombeiros dos órgãos de segurança pública, poderão realizar seu processo de formação para condução de veículos de qualquer categoria inteiramente junto às suas respectivas corporações.
Essa possibilidade é outra novidade da Resolução 1.020 do Contran. Este processo interno abrange a realização de exames aplicáveis, cursos especializados, reciclagem, processos de mudança ou adição de categoria, e a renovação da CNH.
As corporações devem solicitar autorização prévia ao órgão máximo executivo de trânsito da União, apresentando o plano de curso e a relação de instrutores e examinadores. As instituições autorizadas devem observar a legislação, manter instrutores devidamente capacitados, dispor de veículos e materiais compatíveis e manter as informações atualizadas junto ao órgão máximo executivo de trânsito da União. Além disso, as corporações são responsáveis por providenciar e arcar com os custos da coleta dos dados biométricos dos profissionais aprovados.
PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PARA O TRÂNSITO
Foi instituído o Programa Nacional de Educação para o Trânsito nas Escolas, focado na educação de crianças, adolescentes, jovens e adultos. O Programa será implementado de forma integrada entre os órgãos do Sistema Nacional de Trânsito e os sistemas de ensino. E contemplará conteúdos e práticas adequados a cada etapa de ensino, com uma abordagem interdisciplinar e contextualizada.
Para candidatos matriculados no ensino médio de instituições de ensino integradas ao Programa, o processo de obtenção da CNH ou da ACC poderá ser iniciado como uma atividade extracurricular. Esta atividade extracurricular, se desenvolvida em conformidade com a Resolução, será reconhecida para fins de cumprimento da etapa do curso teórico.
Os docentes das instituições de ensino poderão ministrar as aulas teóricas, desde que realizem capacitação técnica específica. As escolas também podem firmar parcerias com autoescolas e outras entidades para a oferta do curso teórico.