Transporte por moto: STF suspende proibição de mototáxi em São Paulo e abre caminho para os serviços de app, como Uber e 99 Moto
A suspensão se refere à Lei Estadual 18.156 que, na prática, condicionava a liberação do motoapp à autorização e regulamentação dos municípios

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A guerra jurídica-administrativa entre as plataformas de transporte de passageiros com motos, como Uber e 99 Moto, e a gestão pública da maior capital do País - São Paulo - ganhou novos capítulos. E, agora, envolvendo até mesmo o Supremo Tribunal Federal (STF).
Nesta segunda-feira (22/9), o Supremo suspendeu, de forma cautelar, a legislação estadual que proíbe o serviço de mototáxi na capital paulista, abrindo caminho para a operação dos apps que fazem o transporte de passageiros com motocicletas, como o Uber e o 99 Moto.
A suspensão se refere à Lei Estadual 18.156/2025, que, na prática, condicionava a liberação do transporte de moto por aplicativo à autorização e regulamentação dos municípios, o que a Confederação Nacional de Serviços (CNS) alega ser uma forma de proibição para plataformas como 99 e Uber em São Paulo. A decisão liminar será agora analisada pelo plenário da Corte para que os demais ministros referendem a medida, em data ainda não definida.
A liminar foi concedida pelo ministro Alexandre de Moraes e atendeu a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pela CNS, que vem lutando desde o início do ano para garantir a operação do Uber e 99 Moto na capital paulista.
O ministro Moraes fundamentou sua decisão no princípio constitucional de que a competência para legislar sobre diretrizes da política nacional de transportes e trânsito é privativa da União. Segundo ele, a lei estadual impugnada contrasta com decisões anteriores do STF sobre a matéria.
O VELHO EMBATE DA COMPETÊNCIA FEDERATIVA
A CNS defendeu que a lei paulista é inconstitucional por usurpar a competência federal, que é privativa da União Federal para legislar sobre trânsito e transporte. A entidade também argumenta que a norma estadual viola os princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da defesa do consumidor.
A União Federal, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), também se manifestou pela inconstitucionalidade da norma. A União avaliou que o Estado de São Paulo ofendeu a competência privativa federal ao disciplinar a utilização de motocicletas para transporte individual privado remunerado de passageiros através da Lei 18.156/2025, em afronta ao artigo 22, inciso XI, da Constituição.
Moraes apontou que estava presente a probabilidade do direito e o "periculum in mora" (risco de dano pela demora). Ele considerou que a cautelar é necessária para evitar o "efeito multiplicador" de leis de teor similar nos demais estados da federação. A AGU endossou esse argumento, afirmando que a suspensão da lei evitará que outros entes federativos editem normas semelhantes, considerando que a Lei nº 18.156 entrou em vigor em 24 de junho de 2025.
O ministro destacou, ainda, a possível inconstitucionalidade formal da lei estadual por subverter o esquema constitucional de divisão de competências ao permitir que os municípios controlem a oferta de transporte remunerado via aplicativos, exigindo prévia autorização e podendo regulamentar o serviço de forma incompatível com a legislação federal.
DISPUTA JUDICIAL E RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE
Desde o início de 2025, a Prefeitura de São Paulo e as plataformas de aplicativos têm travado uma disputa judicial sobre a permissão do serviço na cidade. Enquanto as empresas recorrem à Lei Federal 12.587/2012 (Lei da Mobilidade Urbana) que, em seu entendimento, autoriza a prestação do serviço no País, a prefeitura editou o Decreto Municipal 62.144 contrário aos mototáxis. A justificativa municipal para a proibição tem como base os riscos aos motoqueiros e aos passageiros do serviço de transporte com motos.
A segurança é o ponto central no debate. Segundo a Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet), um sinistro envolvendo moto tem 17 vezes mais chance de ser letal em comparação com um automóvel.
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Por outro lado, a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa empresas como Uber e 99, defende que, embora as prefeituras tenham a prerrogativa de regulamentar e fiscalizar a atividade, elas não podem proibir o serviço.
Na petição inicial, a CSN argumentou que o STF já reconheceu a constitucionalidade da atividade de “mototaxista”, compreendendo sua importância para a política nacional de transporte, apesar dos riscos inerentes. O Tribunal consolidou o entendimento de que não pode haver proibição ou restrição ao transporte privado individual de passageiros, cabendo aos municípios a regulamentação e fiscalização, desde que observando os parâmetros fixados pela União Federal (Lei Federal 12.587/2012).
JUSTIÇA DE SÃO PAULO LIBEROU SERVIÇO, MAS EXIGIU REGULAMENTAÇÃO
No início de setembro, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) declarou inconstitucional o decreto da prefeitura que proibia o transporte remunerado de passageiros por motocicleta na capital. Em decisão unânime, o Órgão Especial da corte entendeu que um município não pode legislar sobre trânsito para proibir uma modalidade de transporte, uma vez que essa competência é do governo federal.
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O TJSP, entretanto, exigiu que a regulamentação do serviço de Uber e 99 Moto seja realizada no prazo de até 90 dias. A proibição foi instituída em janeiro de 2023 pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), por meio do Decreto Municipal 62.144, que suspendeu a atividade. Na época, um grupo de trabalho da prefeitura concluiu que o modal poderia elevar o número de sinistros de trânsito na cidade. A norma foi questionada judicialmente pela Confederação Nacional de Serviços (CNS) em uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI), que resultou na derrubada do decreto.
O relator do caso, desembargador Ricardo Dip, baseou seu voto no fato de que a legislação federal não proíbe o serviço e que o Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou sobre a competência federal para legislar sobre o tema. "Os municípios não podem inovar no trânsito e transporte impedindo a utilização de motocicletas para o transporte individual e remunerado de passageiros [...] se a legislação federal não possui proibição similar", afirmou Dip. Ele acrescentou que o decreto também feria os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência.
LEI ESTADUAL CRIADA POR TARCÍSIO DE FREITAS FOI USADA COMO ARGUMENTO
A lei estadual sancionada em junho pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) condicionava a operação de mototáxi e motoapps à "autorização e regulamentação dos municípios". A lei, inclusive, foi citada pelo desembargador relator Ricardo Dip, que usou a legislação como exemplo para fundamentar sua decisão porque ela determina que o serviço de mototáxi só pode ser prestado mediante autorização e regulamentação pelas prefeituras dos municípios de São Paulo.
Aprovada com articulação do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), a lei estabelecia exigências para a prestação do serviço, como:
- CNH na categoria A com autorização para atividade remunerada e certidão de antecedentes criminais para o motociclista.
- Inscrição do condutor como contribuinte no INSS.
- Recolhimento de Imposto Sobre Serviço (ISS) e oferta de seguro de acidentes pessoais pelas plataformas de aplicativo.