Transporte por moto: Saúde pública do Brasil à beira do colapso com os ocupantes das motocicletas, agora também mulheres
Números do estrago que o transporte por moto está provocando nas cidades brasileiras, principalmente capitais, impactam a saúde em bilhões

Enquanto o poder público assiste - quase inerte - à explosão do uso de motocicletas pela população urbana, limitando sua atuação à uma ineficiente fiscalização de trânsito, a saúde pública grita. E grita alto. Na verdade, alerta que está à beira de um colapso com suas unidades de trauma abarrotadas de vítimas de quedas e colisões com motos.
Um paciente que custa caro porque tem sequelas gravíssimas na quase totalidade dos casos, que tem uma longa permanência de internação e que exige ainda mais do sistema de saúde quando deixa os hospitais.
Não faltam números recentes do estrago que o uso indiscriminado e pouco fiscalizado das motos - agora potencializado pela introdução de passageiros desacostumados a andar na garupa do veículo - tem provocado na sistema brasileiro de saúde pública. E são os ocupantes das duas rodas os mais feridos, mutilados e mortos no trânsito brasileiro.
O custo para a saúde pública é uma das abordagens da série de reportagens Transporte por moto: O Brasil precisa enfrentar, que discute a necessidade de o País enfrentar a criação de regras para o transporte de passageiros com motos
INTERNAÇÕES DE VÍTIMAS DO TRÂNSITO CUSTARAM R$ 3,8 BILHÕES AO SUS EM UMA DÉCADA
Os sinistros de trânsito - com destaque para os que envolvem ocupantes de motocicletas - geraram um custo de R$ 3,8 bilhões com as internações hospitalares de vítimas das colisões, quedas e atropelamentos na saúde pública do Brasil em uma década. Dados do Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS), analisados por médicos do tráfego e das emergências, apontam que, entre 2015 e 2024, o sistema contabilizou 1,8 milhão de internações por sinistros de trânsito, segundo as bases oficiais do Ministério da Saúde.
Segundo os médicos, essas ocorrências pressionam cada vez mais os leitos de UTI e prolongam as internações, agregando outros custos com múltiplos procedimentos e reabilitação, com impacto também sobre a previdência e a assistência social.
O alerta foi feito pelas Associações Brasileiras de Medicina do Tráfego (Abramet) e Medicina de Emergência (Abramede), com base em um levantamento realizado a partir dos dados do DataSUS. E está sendo divulgado agora devido ao Maio Amarelo 2025, campanha de conscientização pela saúde e segurança no trânsito.
Com os R$ 3,8 bilhões gastos diretamente pelos SUS com internações por sinistros de trânsito, calculam as entidades, seria possível construir de 32 a 64 hospitais de médio porte, implantar até 35 mil quilômetros de ciclovias urbanas, duplicar cerca de 505 quilômetros de rodovias federais, adquirir mais de 15 mil ambulâncias básicas ou habilitar quase 13 mil novos leitos de UTI.
NORDESTE AMARGA MAIS DE MEIO MILHÃO DE INTERNAÇÕES POR SINISTROS DE TRÂNSITO


O cenário regional também preocupa. A Região Nordeste apresentou uma escalada nos atendimentos hospitalares por sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se define, segundo o CTB e a ABNT). Em 2024, foram 65.788 internações, consolidando uma tendência de alta desde 2021. No acumulado entre 2015 e 2024, a região somou mais de meio milhão (514.702) de internações, o que representa uma fatia significativa do total nacional.
Essa realidade revela não apenas o impacto dos sinistros de trânsito sobre a saúde pública, mas também pressiona o orçamento destinado à assistência hospitalar de urgência e emergência.
CUSTO DE INTERNAÇÕES NO SUS EM PERNAMBUCO ULTRAPASSA R$ 10 MILHÕES EM 2024
Os gastos com internações também cresceram em Pernambuco. Em 2024, o Estado destinou R$ 10,3 milhões para custear os atendimentos hospitalares decorrentes de sinistros de trânsito – o maior valor desde 2015. No acumulado da década, o total gasto foi de R$ 79,1 milhões.
Os dados evidenciam o impacto financeiro direto dos sinistros de trânsito para os cofres públicos, além dos efeitos indiretos para a Previdência Social com o afastamento do trabalho e a sobrecarga do sistema de saúde.
NORDESTE GASTA QUASE R$ 98 MILHÕES COM SINISTROS EM 2024
Na Região Nordeste, os custos com internações chegaram a R$ 97,7 milhões em 2024, também o maior valor da série. Desde 2015, o total desembolsado na região com atendimentos de emergência por acidentes de trânsito alcançou quase R$ 1 bilhão (R$ 877,7 milhões).
O crescimento nos custos reflete o aumento das internações, mas também uma maior complexidade nos atendimentos e aumento no tempo de permanência hospitalar, já que a grande maioria das vítimas são ocupantes de motocicletas.