Incêndio no Metrô do Recife: Irresponsabilidade e omissão do poder público chegaram ao limite, colocando passageiros e metroviários em risco
Incêndio em vagão provocado por curto circuito na rede aérea é alerta que precarização coloca em risco a segurança de passageiros e operadores
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O sucateamento intencional do Metrô do Recife pelo governo federal - pelo histórico de abandono, acredito que podemos afirmar isso - chegou ao limite. Aliás, ultrapassou qualquer limite, inclusive o da responsabilidade constitucional do poder público em preservar a vida da população. O incêndio que destruiu parcialmente um vagão do Metrô do Recife no último sábado (25/10) foi algo inadmissível e que deixou mais do que evidente o risco que os passageiros e operadores estão correndo ao usar o sistema.
Que os usuários e frequentadores do Metrô do Recife não se iludam: estão correndo, sim, risco de se ferir ou até de morrer usando o sistema metroviário da Região Metropolitana do Recife. Não dá mais para esconder essa realidade, com todo respeito aos profissionais sérios que todos os dias vencem desafios gigantes e reais para fazer o metrô operar - nem que seja com intervalos de 20 minutos no horário de pico.
A Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) nunca irá afirmar ou reconhecer publicamente esse risco, mas o fogo em parte da composição - uma das menos velhas do sistema, inclusive - é um alerta assustador do perigo que se transformou a operação diária do metrô.
Sinais vêm sendo dados e outros episódios perigosos também já aconteceram, mas nada como o incêndio de sábado. Aliás, pelas informações que circulam entre os metroviários, se não fosse a habilidade do maquinista, talvez estivéssemos lamentando mortes no Grande Recife.
O maquinista foi mais rápido e perspicaz do que o CCO (Centro de Controle Operacional), os ‘olhos’ do metrô, digamos assim. Ao ser informado do princípio de incêndio, abriu as portas e mandou os passageiros descerem. A agilidade deu tempo de todos saírem, sem ferimentos.
Mas o Metrô do Recife não aguenta mais viver de heróis como o maquinista de sábado. Aliás, um sistema de transporte sobre trilhos - principalmente - não pode operar na insegurança que o metrô vem operando porque falta tudo: a infraestrutura está sucateada devido ao corte de 50% do orçamento de custeio há pelo menos cinco anos; alguns trilhos vem sendo trocado somente agora, após 41 anos de operação do sistema; a rede aérea é velha e comprometida; e os trens são insuficientes, velhos e sucateados pela ausência de peças de reposição.
E tudo isso com o passageiro da Região Metropolitana do Recife pagando R$ 4,25 para correr riscos, uma tarifa alta quando é considerado o perfil social do usuário do Metrô do Recife. As pessoas que tiveram que sair às pressas, assustadas, algumas em pânico, entendem a revolta que esse texto tenta passar. Só sabe a sensação de estar num vagão de metrô quente, lento, sufocante e, ainda mais, com fogo, quem viveu o que os passageiros viveram no sábado.
E a verdade é que nem o presidente Lula, nem a governadora Raquel Lyra sabem o que é. Só os passageiros e os operadores.
RESPONSABILIDADE DIRETA É DO GOVERNO FEDERAL, MAS GOVERNO DE PERNAMBUCO TAMBÉM TEM PARTICIPAÇÃO
O que, oficialmente, a CBTU definiu simplesmente como um curto-circuito na rede aérea do metrô provocado após uma queda de energia, é resultado da ausência de investimentos - que afeta o sistema há quase dez anos - e, agora mais do que nunca, da inércia política-administrativa do poder público.
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E aí leia-se governo federal, representado pelos Ministérios da Casa Civil e das Cidades, e governo de Pernambuco, que sempre ignorou os problemas do Metrô do Recife, mas na gestão da governadora Raquel Lyra prometeu “ser parte da solução” para o fim do sucateamento do sistema.
As idas e vindas nas negociações sobre o futuro do Metrô do Recife - que se arrastam desde 2019 - já cansaram a todos, principalmente a população que depende do sistema e precisa vê-lo operando. Pouco importa se ele terá uma operação privada ou pública.
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Os ‘ideais de metrô’ público ou privado defendidos por cada um dos lados envolvidos no imbróglio político-administrativo que virou o processo de concessão pública do Metrô do Recife pouco importam ao trabalhador que todos os dias precisa sair - em sua grande maioria - dos extremos do Grande Recife para chegar às áreas centrais da capital e sabe que, no ônibus sem prioridade viária, levará o dobro do tempo.
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Até porque ele já paga caro e tem um péssimo serviço de transporte, com vagões quentes, lentos e que têm intervalos de 20 minutos entre as viagens nos horários de pico. Ele sabe que pior não poderia ficar. Só se o sistema deixasse de operar, como já acontece aos domingos desde setembro de 2024.
SE NÃO HÁ MAIS CONDIÇÕES, QUE O PODER PÚBLICO TENHA CORAGEM DE REDUZIR A OPERAÇÃO OU ATÉ FECHAR O METRÔ
Enquanto o governo do presidente Lula e as equipes da governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, não chegam a um consenso sobre o ‘arcabouço’ financeiro-administrativo de uma possível concessão pública do sistema ou esquecem a possibilidade de ‘privatização’ e fazem um investimento maciço no Metrô do Recife - algo em torno de R$ 4 bilhões para reerguer sua infraestrutura - o passageiro e o operador do sistema sofrem.
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E o que é ainda mais grave: correm risco de morte. Isso precisa ser reforçado. Estamos apenas esperando o pior acontecer e, do jeito que a situação do Metrô do Recife vem sendo empurrada com a barriga por todos - incluindo nesse pacote deputados federais e senadores, que lucraram politicamente com discursos sobre o sistema e nada conseguiram na prática -, uma tragédia está prestes a acontecer.
Metroviários sabem disso e, por consequência, gestores públicos e políticos dos médios e altos escalões. O presidente Lula também, assim como a governadora.
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O simbolismo que o incêndio no vagão do Metrô do Recife representou diante do histórico de degradação do sistema metropolitano exige ações urgentes. Para ontem. Caso não seja possível, que o presidente Lula, o Ministério das Cidades e a CBTU tenham a coragem e a decência de reduzir ainda mais a operação comercial ou até mesmo fechar o metrô definitivamente para evitar a perda de vidas.
O passageiro agradece.
GOVERNO DE PERNAMBUCO SE POSICIONA, ENQUANTO GOVERNO FEDERAL SILENCIA
Confira a nota que o governo de Pernambuco encaminhou à reportagem sobre a cobrança pela indefinição sobre o futuro financeiro e operacional do Metrô do Recife. Nela o Estado diz que está tentando obter recursos para ajudar o sistema:
“Ciente da necessidade de viabilizar grandes investimentos para o metrô do Recife, o Governo do Estado procurou, desde 2023, o governo federal para tratar do tema. A gestão estadual chegou a solicitar recursos do Novo PAC/Seleções, que estão sob a responsabilidade da CBTU.
O governo federal está coordenando estudos sobre a concessão dos serviços metroviários na Região Metropolitana do Recife (RMR). Independentemente de tais discussões em andamento, o Estado segue buscando mais investimentos imediatos que ofereçam maior segurança e melhorem as condições de prestação de serviços aos usuários”.
O governo federal não se posicionou sobre a demanda da reportagem. Os Ministérios das Cidades, da Casa Civil, a CBTU e o BNDES foram procurados, mas apenas a assessoria de imprensa do banco retornou, informando que não caberia a ele se posicionar.