Mobilidade | Notícia

Crise Metrô do Recife: Sistema completa mais de 24 horas de paralisação parcial e, em crise, caminha para a concessão pública

Dessa vez, um curto-circuito foi a razão da paralisação, em mais um efeito do sucateamento do sistema há anos pelo governo federal

Por Roberta Soares Publicado em 28/08/2025 às 13:21 | Atualizado em 28/08/2025 às 15:23

Clique aqui e escute a matéria

A mais recente paralisação do Metrô do Recife, agora da Linha Sul, completa mais de 24 horas e escancara o ‘definhamento’ financeiro e estrutural a que vem sendo submetido o sistema metroferroviário da Região Metropolitana do Recife.

O Metrô do Recife, que atende a 160 mil passageiros por dia, vive uma crise financeira há pelo menos dez anos, mas que se agravou nos últimos cinco anos sob risco de colapso e paralisação total de pelo menos a Linha Sul. A crise é tão séria que a operação comercial aos domingos já foi suspensa desde setembro de 2024 em todo o sistema.

Dessa vez, um curto-circuito foi a razão da paralisação total da Linha Sul, que teria atingido com gravidade dois pontos da rede aérea: próximo das Estações Porta Larga e Imbiribeira. Segundo a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), houve danos graves e extensos da rede aérea.

O curto-circuito aconteceu por volta das 10h30 da quarta-feira (27/8) e, pelas informações atuais, é provável que a operação só seja retomada na sexta-feira (29). O problema desativou toda a operação nas 12 estações da Linha Sul que conectam o Centro do Recife ao bairro de Cajueiro Seco, em Jaboatão dos Guararapes.

MINISTRO DA CASA CIVIL CONFIRMA CONCESSÃO DO METRÔ E ANÚNCIO EM ATÉ DUAS SEMANAS

A mais recente pane aconteceu no mesmo dia e poucas horas depois de o Ministro da Casa Civil, Rui Costa, confirmar, mais uma vez, a concessão pública do Metrô do Recife. A declaração foi dada durante o programa do governo federal 'Bom Dia, Ministro', na quarta-feira (27). Rui Costa afirmou que a concessão é certa, tem como objetivo modernizar o Metrô do Recife e deverá ser anunciada em até duas semanas. 

ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
Linha sul do Metrô do Recife da CBTU. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM

Segundo o ministro, as negociações com o governo de Pernambuco sobre os valores de contrapartida e fontes de investimento estão perto de serem finalizadas e o anúncio da concessão será feito em breve.“Em uma ou duas semanas vamos finalizar o diálogo sobre o Metrô do Recife com o governo do Estado. É o governo estadual que fará o leilão da concessão. Em alguns dias, faremos a assinatura dos documentos finais e, por fim, o leilão, que será conduzido pelo governo de Pernambuco”, afirmou.

O último entrave para o anúncio da concessão seria exatamente o que vem sendo discutido desde o fim de 2024: as garantias financeiras dos próprios recursos da União e as que serão dadas pelo governo federal ao governo de Pernambuco, que teme um corte financeiro.

O serviço de transporte metroferroviário operado pela CBTU em Pernambuco atende diretamente aos municípios de Recife, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe e Cabo de Santo Agostinho, compreendendo 3 linhas em operação, 36 estações e 71,5 km de extensão, dos quais 37,8 km são eletrificados e 33,7 km não-eletrificados (a diesel).

INVESTIMENTOS DE R$ 3 BILHÕES PARA “REERGUER” O METRÔ DO RECIFE

O acordo entre a União e o Estado prevê investimentos do governo federal de mais de R$ 3 bilhões em uma requalificação completa do sistema, que inclui a via permanente, a frota de trens, a rede aérea e as edificações. Pelo menos é o que consta no primeiro estudo realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e que em 2024 foi refeito pela mesma equipe ao custo de R$ 4 milhões do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Uma novidade é que, com o avanço das negociações com o governo de Pernambuco, o leilão da concessão aconteceria apenas em 2027 porque não haveria tempo hábil para finalizar o processo devido aos procedimentos necessários, que incluem a análise do Tribunal de Contas da União (TCU) e a preparação do edital.

Segundo o primeiro cronograma oficial do BNDES, ao qual a Coluna Mobilidade teve acesso em maio, o leilão do sistema aconteceria no fim de 2026 e a nova operação privada começaria em 2027.

O cronograma faz parte do projeto de desestatização da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e de concessão do serviço de transporte ferroviário urbano de passageiros na Região Metropolitana do Recife (PE), desenvolvido pelo BNDES.

INVESTIMENTO BILIONÁRIO E DESAFIOS NAS GARANTIAS FINANCEIRAS

A modelagem do projeto prevê uma Parceria Público-Privada (PPP). O aporte federal seria de aproximadamente R$ 3 bilhões, e o governo de Pernambuco contribuiria com pouco mais de R$ 150 milhões - contrapartida que teve uma grande redução pelo valor original, que era de R$ 700 milhões. Os recursos seriam investidos com o pagamento de contraprestações financeiras à futura concessionária.

A modalidade seria necessária, segundo apontou o estudo do BNDES, porque a operação do Metrô do Recife não consegue garantir a receita suficiente, exigindo um complemento do poder público para garantir a viabilidade econômica da concessão.

O último entrave para o anúncio da concessão seria exatamente o que vem sendo discutido desde o fim de 2024: as garantias financeiras dos próprios recursos da União e as que serão dadas pelo governo federal ao governo de Pernambuco, que teme um corte financeiro.

Alguns atores do Estado explicaram que o temor da governadora é com o risco de descontinuidade futura nos pagamentos das contraprestações pela União, temendo que o ônus recaia sobre o caixa do Estado. Por isso, agora segundo a reportagem da CNN Brasil, pelo menos três hipóteses estariam sendo estudadas na Casa Civil para resolver essa questão.

O cuidado com o futuro financeiro tem fundamento porque o Metrô do Recife definha e sua administradora, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), também. Em 2024, registrou um prejuízo de R$ 1,1 bilhão.

Nessa conta de prejuízo entram, além do Metrô do Recife, os sistemas de trens urbanos em outras três capitais do Nordeste: João Pessoa, Natal e Maceió. Mas, das quatro, a única rede apta à concessão seria o Recife por enquanto, também segundo já foi mapeado pelo BNDES ainda em 2019.

ACORDO TRABALHISTA PARA GARANTIR EMPREGOS

Outra sinalização de que a concessão à iniciativa privada do metrô é um caminho sem volta foi o acordo trabalhista já costurado para que a CBTU possa preservar os empregados do sistema e realocar funcionários que não sejam mais necessários na operação. O governo federal também pretende realizar uma consulta pública após o anúncio da concessão.

O repasse da operação do Metrô do Recife para a iniciativa privada - caso confirmado - será o segundo da CBTU. O Metrô de Belo Horizonte, também administrado pela Companhia até o início de 2023, foi privatizado na reta final do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com as operações assumidas pelo grupo de transporte por ônibus Comporte, responsável também pela construção de uma segunda linha na capital mineira.

ENTENDA O PROCESSO DE OPERAÇÃO PRIVADA DO METRÔ DO RECIFE

O processo de estadualização e concessão pública do Metrô do Recife seria iniciado ainda em maio de 2022. A modelagem e os valores foram apresentados ao Ministério da Economia no fim de 2021 e já tinham sido validados pela equipe técnica que está à frente dos estudos.

O governo de Pernambuco seria o gestor do futuro contrato de concessão pública do Metrô do Recife, no valor de R$ 8,4 bilhões e com validade de 30 anos. Desse total, R$ 3,8 bilhões seriam aportes públicos para reerguer o sistema e cobrir a diferença entre receita tarifária e despesa de operação.

Sendo, R$ 3,1 bilhões mobilizados pelo governo federal e R$ 700 milhões pelo governo de Pernambuco - valor que seria, agora, reduzido para R$ 150 milhões. E, dos R$ 3,1 bilhões bancados pela União (Ministério da Economia), R$ 1,4 bilhão seriam recursos que ficariam guardados para serem utilizados pelo Estado ao longo do contrato de concessão pública.

O R$ 1,4 bilhão seria a reserva para garantir o equilíbrio econômico financeiro do contrato, já que os estudos realizados em dois anos já apontaram que a receita gerada pela demanda de passageiros do Metrô do Recife não seria suficiente para cobrir o custo de operação.

O modelo a ser adotado pelo governo do Estado seria de concessão pública simples, sem contrapartida financeira ao longo do contrato. Mas tudo foi engavetado pelo então governador de Pernambuco (PSB), Paulo Câmara, às vésperas das eleições estaduais e a pedido dos metroviários.

Compartilhe

Tags