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Privatização do metrô: quanto custaria ao País manter o Metrô do Recife público e desistir da concessão privada

Manutenção pública do sistema do Grande Recife custaria bilhões de reais, mas seria um recurso próximo ao previsto no processo de concessão

Por Roberta Soares Publicado em 29/05/2025 às 18:39

O Metrô do Recife, um dos pilares do transporte público na Região Metropolitana, encontra-se em um estado crítico, à beira de um colapso operacional que ameaça não apenas a eficiência do serviço, mas também a segurança dos passageiros. Para evitar essa catástrofe e manter o sistema como um serviço público, seria necessário um investimento inicial de R$ 3,5 bilhões para sua reestruturação completa, além de um custeio anual de R$ 200 milhões a R$ 250 milhões. Essa é a estimativa unânime da gestão da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) no Recife e dos próprios metroviários, que defendem a manutenção do metrô sob controle estatal.

A superintendente da CBTU-Recife, Marcela Campos, e o presidente do Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (SindMetro), Luiz Soares, alertaram para a urgência da situação durante debate realizado na Rádio Jornal nesta quinta-feira (29/5), no qual foi discutido o futuro do metrô diante do avanço do processo de concessão à iniciativa privada

Os dois alertaram que os problemas se espalham por toda a operação: via permanente, rede aérea, edificações e um custeio que há anos se mostra insuficiente. A falta de recursos é tão severa que a paralisação parcial das operações, como já acontece aos domingos desde setembro de 2024 para a realização de melhorias mínimas na via, é uma possibilidade real.

O DILEMA DA PRIVATIZAÇÃO X O INVESTIMENTO NECESSÁRIO

Enquanto os debates sobre a concessão do metrô à iniciativa privada seguem sem consenso entre os governos federal e estadual, o sistema segue em deterioração. Marcela Campos, com quase duas décadas de experiência na CBTU, ressaltou que o setor metroferroviário exige tempo para a aquisição de equipamentos – anos, no caso da substituição dos antigos trens Santa Matilde, que já estão em risco de não operar mais.

ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
Os R$ 3,5 bilhões estimados para a reestruturação do sistema seriam aplicados na recuperação de quatro pilares essenciais: via permanente, rede aérea, frota e edificações - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM

"A situação é muito crítica e preocupante. Independentemente da decisão de conceder a operação à iniciativa privada ou não, precisamos começar a fazer investimentos no sistema", enfatizou.
Luiz Soares, do SindMetro, reforçou que "reerguer o metrô é um processo que levará de cinco a sete anos" devido às complexidades da operação. Para os metroviários, a solução passa por um metrô público, com tarifa social de R$ 2, focado no atendimento à população que mais precisa.

OS NÚMEROS POR TRÁS DA MANUTENÇÃO PÚBLICA

Os R$ 3,5 bilhões estimados para a reestruturação do sistema seriam aplicados na recuperação de quatro pilares essenciais: via permanente, rede aérea, frota e edificações. Esse valor, inclusive, é similar ao projetado no primeiro estudo de concessão do metrô realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e teria sido reafirmado na revisão deste estudo, que está sendo conduzida com recursos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Além desse investimento inicial, a garantia de repasses integrais para o custeio anual, estimado entre R$ 200 milhões e R$ 250 milhões, é fundamental, juntamente com investimentos periódicos para melhorias e expansão da rede. Atualmente, o Metrô do Recife recebe apenas 25% da quantia necessária para operar bem diariamente.

Ambos os gestores e metroviários comparam a necessidade do metrô com o subsídio anual de R$ 300 milhões que o governo de Pernambuco destina ao sistema de ônibus da Região Metropolitana. Eles defendem que o transporte metroviário oferece ganhos sociais e urbanos inestimáveis, como a redução de congestionamentos, a promoção da sustentabilidade e um deslocamento rápido para a população.

RETROSPECTIVA DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO METRÔ DO RECIFE

O processo de privatização do metrô do Recife, que envolve a concessão do serviço à iniciativa privada, tem sido um tema de intensos debates e movimentações por parte do governo federal e demais atores envolvidos. Abaixo, uma retrospectiva em tópicos dos principais momentos e características desse processo:

Início dos Estudos (2019): O processo de privatização do metrô do Recife começou em 2019, durante o governo federal de Jair Bolsonaro e o governo estadual de Paulo Câmara (PSB). A ideia inicial era passar todos os sistemas operados pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) para a iniciativa privada.

Papel do BNDES: O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem sido uma peça central na estruturação do projeto de desestatização e concessão. Estudos de viabilidade técnica e econômica são conduzidos pelo banco, com o objetivo de definir o modelo de concessão e os investimentos necessários.

Modelo de Concessão: O modelo em discussão tem sido o de concessão pública simples, sem contrapartida financeira do Estado ao longo do contrato, mas com a necessidade de um aporte de recursos públicos substanciais para a recuperação do sistema antes da concessão.

Valores de Investimento: Estudos indicam a necessidade de bilhões de reais para a recuperação e modernização do metrô. Valores como R$ 3,5 bilhões para reerguer o sistema foram mencionados para a recuperação de pilares como via permanente, rede aérea, frota e edificações. Houve também estimativas de que o projeto de concessão poderia prever um pacote de R$ 8,4 bilhões em 30 anos, com R$ 3,8 bilhões em aportes públicos.

Custeio Anual: Além do investimento inicial, a garantia de repasses para o custeio anual do metrô também é crucial, com estimativas entre R$ 200 milhões e R$ 250 milhões por ano para a operação.

Engavetamento e Retomada: O processo já passou por momentos de estagnação. Em um determinado momento, o então governador Paulo Câmara (PSB) teria engavetado a proposta de concessão, a pedido dos metroviários. No entanto, o governo federal atual, sob a gestão Lula, avançou novamente na privatização, com a autorização expressa da passagem do metrô para a iniciativa privada em maio de 2025.

Críticas e Resistência: Desde o início, o processo de privatização enfrenta forte resistência dos metroviários, representados pelo SindMetro-PE. Eles argumentam que o metrô, por sua natureza, deve ser um serviço público e que a privatização pode levar à demissão de trabalhadores, perda de direitos e aumento de tarifas, sem garantia de melhoria do serviço. Greves foram realizadas em 2022 e 2023 em protesto contra a privatização.

Posição do Governo do Estado: A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, tem se manifestado sobre a necessidade de investimentos no metrô e a disposição de o Estado assumir o sistema, mas com condições relacionadas aos aportes federais. A negociação sobre a partilha de recursos entre União e Estado tem sido um entrave.

Acordo com Metroviários: Em meio às discussões, houve a assinatura de um acordo de manutenção de empregos dos metroviários em caso de privatização, buscando agilizar o processo.

Cronograma Atual (Maio de 2025): O cronograma mais recente do BNDES prevê as seguintes etapas:
3º trimestre de 2025: Estudos Técnicos e Consulta Pública
2º trimestre de 2026: Aprovação dos órgãos de controle e Lançamento do edital
4º trimestre de 2026: Leilão
1º trimestre de 2027: Formalização do Contrato e início da nova operação

O processo de privatização do metrô do Recife continua em andamento, com a necessidade urgente de investimentos para evitar o colapso do sistema, enquanto os debates sobre a gestão pública versus privada permanecem centrais para o futuro do transporte na Região Metropolitana.

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