TRANSPORTE SOBRE TRILHOS | Notícia

Privatização do metrô: "Metrô do Recife está à beira do colapso, independente de ser ou não concedido", alerta gestão do sistema

Com ou sem gestão privada, sistema metroferroviário do Grande Recife precisa urgentemente de investimentos. Alerta foi feito em debate na Rádio Jornal

Por Roberta Soares Publicado em 29/05/2025 às 14:55 | Atualizado em 29/05/2025 às 17:58

Sendo ou não concedido à iniciativa privada, o Metrô do Recife precisa de investimentos urgentemente porque está à beira de um colapso operacional, inclusive sob risco de episódios que comprometam a segurança dos passageiros, como um descarrilamento. O alerta foi, mais uma vez, fortalecido pela gestão do sistema metroferroviário da Região Metropolitana do Recife e validado pelos metroviários.

Em debate na Rádio Jornal para discutir o futuro do Metrô do Recife, nesta quinta-feira (29/5), a superintendente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) no Recife, Marcela Campos, alertou que, enquanto os governos federal e estadual negociam sem se entender sobre a praticamente certa concessão pública de sua operação, o sistema precisa de recursos para garantir o mínimo.

A superintendente, inclusive, fez uma previsão assustadora, deixando claro que o Metrô do Recife poderá, sim, paralisar parcialmente a operação em breve, caso não sejam aumentados os valores de custeio - que há pelo menos seis anos cobrem praticamente metade da necessidade do sistema - e, principalmente, feitos investimentos.

“A situação é muito crítica e preocupante. Independentemente da decisão de conceder a operação à iniciativa privada ou não, precisamos começar a fazer investimentos no sistema. Temos problemas sérios em todas as áreas da operação: via permanente, rede aérea e edificações, além de um custeio insuficiente”, alertou Marcela Campos.

PRAZO PARA REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA ESTÁ CHEGANDO AO FIM

Roberta Soares/JC
Superintendente do Metrô do Recife, Marcela Campos, fez uma previsão assustadora, deixando claro que o Metrô do Recife poderá, sim, paralisar parcialmente a operação em breve - Roberta Soares/JC

Segundo a gestora, que tem 18 anos de CBTU e está à frente da superintendência no Recife há quase dois anos, a situação já foi apresentada ao governo federal outras vezes, mas o prazo de ação está no limite porque reestruturar o Metrô do Recife leva tempo. São necessários anos e, no caso do sistema da RMR, pelo menos três anos para aquisição, por exemplo, de novos trens.

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Luiz Soares, presidente do Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (SindMetro) participou do debate na Rádio Jornal sobre o futuro do Metrô do Recife - Divulgação

“O setor metroferroviário é muito específico e técnico. Os equipamentos do transporte sobre trilhos não estão disponíveis nas prateleiras. São equipamentos que precisam ser encomendados e produzidos. A substituição dos nossos trens mais antigos, os Santa Matilde, que chegaram na criação do metrô, é imprescindível. Eles estão na iminência de não conseguirem mais operar. E o mais angustiante é que não temos perspectivas de quando esses investimentos aconteçam”, alertou.

Vale ressaltar que a operação do sistema metroferroviário do Grande Recife já está comprometida aos domingos desde o início de setembro de 2024, com o metrô deixado de operar nesses dias - com pouquíssimas exceções - para que uma discreta melhoria na via permanente (trilhos) seja realizada a passos lentos, também por falta de recursos.

A situação crítica do metrô foi validada pelo presidente do Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (SindMetro), Luiz Soares, que também participou do debate na Rádio Jornal. “É mais do que urgente. Muita gente não sabe, mas reerguer o metrô é um processo que levará de cinco a sete anos pelas especificidades da operação metroferroviária. E o governo federal tem condições e deveria ter o compromisso em fazê-lo. Por isso os metroviários lutam por um metrô público, com uma tarifa social de R$ 2 e que mantenha-se no seu princípio básico que é atender à população que mais precisa”, disse.

QUANTO CUSTARIA AO PAÍS MANTER O METRÔ DO RECIFE PÚBLICO

SIDNEY LUCENA/JC IMAGEM
Vale ressaltar que a operação do sistema metroferroviário do Grande Recife já está comprometida aos domingos desde o início de setembro de 2024, com o metrô deixado de operar nesses dias - SIDNEY LUCENA/JC IMAGEM

Durante o debate, foram apresentados dados que mostram ser possível ao governo federal investir recursos para reestruturar o metrô e, em seguida, manter a gestão pública. Segundo números colocados por Marcela Campos e Luiz Soares, um estudo feito internamente pela CBTU Recife mostrou que com R$ 3,5 bilhões seria possível reerguer o sistema, a partir da recuperação de quatro pilares: via permanente, rede aérea, frota e edificações - que compõem o alicerce do sistema.

Esse valor, inclusive, é quase a mesma quantia de investimentos públicos projetados para serem feitos no primeiro estudo de concessão do metrô realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). E que, pelas informações extra-oficiais, teria sido reafirmado na revisão deste estudo, que está sendo realizada desde o ano passado com recursos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Também seria necessária a garantia de repasse de valores integrais para o custeio do metrô, estimado entre R$ 200 e R$ 250 milhões por ano, além de investimentos periódicos para melhorias e expansão da rede metroferroviária. Há pelo menos seis anos, entretanto, o sistema da RMR vem recebendo algo próximo a 25% da quantia que necessita para operar bem diariamente.

“Desde a pandemia, o governo de Pernambuco subsidia o sistema de ônibus da Região Metropolitana do Recife com valores que chegam a R$ 300 milhões. É o que o metrô precisaria”, afirmaram tanto a superintendente da CBTU como o presidente do SindMetro. “Além disso, é preciso considerar o cunho social do transporte metroferroviário no Grande Recife. São muitos ganhos embutidos para a sociedade e as cidades. O metrô evita congestionamentos e torna as cidades mais sustentáveis, além de garantir um deslocamento rápido para a população”, reforçou Luiz Soares.

RETROSPECTIVA DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO METRÔ DO RECIFE

O processo de privatização do metrô do Recife, que envolve a concessão do serviço à iniciativa privada, tem sido um tema de intensos debates e movimentações por parte do governo federal e demais atores envolvidos. Abaixo, uma retrospectiva em tópicos dos principais momentos e características desse processo:

Início dos Estudos (2019): O processo de privatização do metrô do Recife começou em 2019, durante o governo federal de Jair Bolsonaro e o governo estadual de Paulo Câmara (PSB). A ideia inicial era passar todos os sistemas operados pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) para a iniciativa privada.

Papel do BNDES: O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem sido uma peça central na estruturação do projeto de desestatização e concessão. Estudos de viabilidade técnica e econômica são conduzidos pelo banco, com o objetivo de definir o modelo de concessão e os investimentos necessários.

Modelo de Concessão: O modelo em discussão tem sido o de concessão pública simples, sem contrapartida financeira do Estado ao longo do contrato, mas com a necessidade de um aporte de recursos públicos substanciais para a recuperação do sistema antes da concessão.

Valores de Investimento: Estudos indicam a necessidade de bilhões de reais para a recuperação e modernização do metrô. Valores como R$ 3,5 bilhões para reerguer o sistema foram mencionados para a recuperação de pilares como via permanente, rede aérea, frota e edificações. Houve também estimativas de que o projeto de concessão poderia prever um pacote de R$ 8,4 bilhões em 30 anos, com R$ 3,8 bilhões em aportes públicos.

Custeio Anual: Além do investimento inicial, a garantia de repasses para o custeio anual do metrô também é crucial, com estimativas entre R$ 200 milhões e R$ 250 milhões por ano para a operação.
Engavetamento e Retomada: O processo já passou por momentos de estagnação. Em um determinado momento, o então governador Paulo Câmara (PSB) teria engavetado a proposta de concessão, a pedido dos metroviários. No entanto, o governo federal atual, sob a gestão Lula, avançou novamente na privatização, com a autorização expressa da passagem do metrô para a iniciativa privada em maio de 2025.

Críticas e Resistência: Desde o início, o processo de privatização enfrenta forte resistência dos metroviários, representados pelo SindMetro-PE. Eles argumentam que o metrô, por sua natureza, deve ser um serviço público e que a privatização pode levar à demissão de trabalhadores, perda de direitos e aumento de tarifas, sem garantia de melhoria do serviço. Greves foram realizadas em 2022 e 2023 em protesto contra a privatização.

Posição do Governo do Estado: A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, tem se manifestado sobre a necessidade de investimentos no metrô e a disposição de o Estado assumir o sistema, mas com condições relacionadas aos aportes federais. A negociação sobre a partilha de recursos entre União e Estado tem sido um entrave.

Acordo com Metroviários: Em meio às discussões, houve a assinatura de um acordo de manutenção de empregos dos metroviários em caso de privatização, buscando agilizar o processo.

Cronograma Atual (Maio de 2025): O cronograma mais recente do BNDES prevê as seguintes etapas:
3º trimestre de 2025: Estudos Técnicos e Consulta Pública
2º trimestre de 2026: Aprovação dos órgãos de controle e Lançamento do edital
4º trimestre de 2026: Leilão
1º trimestre de 2027: Formalização do Contrato e início da nova operação

O processo de privatização do metrô do Recife continua em andamento, com a necessidade urgente de investimentos para evitar o colapso do sistema, enquanto os debates sobre a gestão pública versus privada permanecem centrais para o futuro do transporte na Região Metropolitana.

 

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