Transporte público: com nova gestão, setor de transporte promete se reinventar e deixar de ser passivo na busca por melhorias para os sistemas de ônibus do Brasil
Nova gestão da NTU, eleita em abril, alertou que as cidades brasileiras poderão entrar em colapso com o avanço do transporte individual no País

O Brasil é coletivo. Com essa frase, dita, escrita em todos os lugares e repetida diversas vezes, o setor de transporte público urbano do País anunciou uma nova estratégia nacional para enfrentar a depreciação estrutural, mas principalmente moral, que os sistemas brasileiros de ônibus urbano têm vivido nas últimas décadas. E que tem sido ainda mais potencializada pela explosão do transporte individual, especialmente com a expansão, desde o fim de 2021, do serviço de aplicativos com motos, como o Uber e o 99 Moto, já presentes em quase 4 mil cidades sem qualquer tipo de regulamentação e com poucas reações contrárias.
A promessa, agora, é que o setor irá se articular politicamente e lutar ainda mais publicamente, saindo da passividade que sempre o caracterizou, contra a já histórica ausência de políticas públicas nacionais que incentivem a melhoria da operação dos ônibus urbanos e da infraestrutura de transporte - leia-se aqui principalmente corredores e faixas exclusivas - nas médias e grandes cidades brasileiras.
Pelo menos esse foi o recado repassado nesta terça-feira (27/5), durante evento realizado em Brasília para apresentação da nova direção da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). O encontro, que reuniu empresários do setor em todo o País, autoridades do Executivo, Legislativo, parlamentares e especialistas em mobilidade urbana, foi apresentado como o início de um novo ciclo voltado ao fortalecimento do transporte público como política de Estado e instrumento essencial para a sustentabilidade e qualidade de vida das cidades.
E na linha de frente desse novo momento - responsável pela articulação política para reerguer e moralizar política e socialmente os sistemas de ônibus do País - está Edmundo Pinheiro, eleito presidente do Conselho Diretor da NTU. Pinheiro é empresário do setor com atuação no transporte público de Goiânia (GO) e muito respeitado no setor, já sendo integrante do conselho da entidade, que reúne os operadores de ônibus urbano coletivo do Brasil.
CIDADES VÃO ENTRAR EM COLAPSO COM O AVANÇO DO TRANSPORTE INDIVIDUAL
No evento, a nova gestão da NTU alertou que as cidades brasileiras estão à beira do colapso devido à explosão e prioridade que o transporte individual tem ganhado no País, principalmente pós pandemia de covid-19. E para embasar esse risco de colapso caso o modelo baseado no transporte individual continue avançando, relembrou dados da Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana 2024, que aponta que os deslocamentos por carros e motos ultrapassaram, pela primeira vez na história do País, os realizados por ônibus, em algumas capitais.
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“Sem o resgate do transporte público coletivo o Brasil vai parar. Nossas cidades vão colapsar. Nosso objetivo é servir à mobilidade urbana das cidades e reforçar que, só com o transporte coletivo, é possível avançar de forma sustentável e justa socialmente. Precisamos de cidades feitas para as pessoas e, não, para os carros, como temos visto o Brasil caminhar. Não há cidades sustentáveis sem transporte coletivo eficiente. Por isso estamos nessa busca para ressignificar o setor. Porque o Brasil é e precisa ser coletivo”, destacou Edmundo Pinheiro.
Uma das principais metas prometidas pela NTU é buscar a recuperação integral da demanda de passageiros registrada antes da pandemia - quando os sistemas chegaram a ter uma queda superior a 80% no País -, investindo na ampliação da oferta de serviços, conforto, segurança e eficiência. Outro objetivo é a separação das tarifas pública (cobrada do passageiro) e técnica (que de fato cobre o custo da operação) como forma de fortalecer as empresas e garantir o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de operação. E, ainda, a implementação de políticas públicas que desonerem o impacto das gratuidades, hoje responsáveis por 22% do custo médio das tarifas do setor.
A adoção de subsídios públicos aos passageiros pagantes como uma política permanente para assegurar tarifas públicas mais acessíveis é um dos pontos defendidos pelo setor há anos e que agora, com a nova gestão, ganhará um fôlego maior. Atualmente, existem 395 cidades que têm subsídio para o transporte coletivo, mas apenas 148 adotam a separação tarifária, prevista na Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU). Segundo o IBGE, o Brasil possui 2.703 municípios atendidos por serviços organizados de transporte público por ônibus.
CRÍTICAS AO MODISMO DA ELETRIFICAÇÃO ANTES DE OUTRAS PRIORIDADES


A entidade também fez críticas à onda da eletrificação do transporte urbano coletivo vivenciada no Brasil, principalmente em São Paulo, afirmando que coisas básicas, como infraestrutura de corredores e faixas exclusivas, linhas de financiamento para renovação da frota de ônibus e políticas públicas que sustentem a operação eficiente, deveriam estar em primeiro lugar, antes da eletrificação.
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“É preciso frear esse avanço e promover uma transição que vá além da questão energética. Trata-se de uma transição modal, que reposicione o transporte coletivo como eixo central do planejamento urbano”, defendeu.
Outro eixo de atuação da nova gestão da NTU será o estímulo à aquisição de novos veículos, com metas que retomem os volumes históricos das frotas de ônibus e promovam a modernização do serviço. “A meta é superar 13 mil ônibus adquiridos por ano no transporte coletivo das cidades brasileiras, aproveitando a capacidade instalada da indústria nacional”, explicou Edmundo Pinheiro. Vale ressaltar que a mesma Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana 2024 revelou, também, que a frota de ônibus do Brasil nunca foi tão velha.