Transporte público: Perda de confiabilidade faz Metrô do Recife perder força como transporte no Grande Recife, aponta pesquisa
Pesquisa sobre a qualidade do transporte público na RMR confirma que o transporte sobre trilhos perdeu força com o sucateamento do sistema

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O impacto dos constantes e sequenciados problemas de infraestrutura do Metrô do Recife, que há pelo menos sete anos sofre com o contingenciamento de recursos até mesmo para as despesas básicas de operação, é grande e tem provocado uma fuga do passageiro do sistema. O transporte sobre trilhos da Região Metropolitana do Recife, que já foi referência nacional no setor, perdeu força e, consequentemente, importância na rede de mobilidade coletiva do Grande Recife.
Pelo menos é o que constatou uma pesquisa do Núcleo de Inteligência de Mercado do Centro Universitário Frassinetti do Recife (UniFafire). Nela, foi verificado que a participação do metrô para o passageiro do transporte público da RMR virou algo ‘modesto’, com 5,62% apenas de utilização pelas pessoas entrevistadas.
É claro que a rede do Metrô do Recife, de 75 quilômetros, não sofre expansão há mais de uma década e segue extremamente dependente da rede de ônibus, mas a perda de confiabilidade no serviço, provocada pelo sucateamento do metrô (trens, rede área, trilhos e estações) pesou muito.
A perda de participação do transporte sobre trilhos - que deveria estar em plena expansão no Grande Recife e, não, ao contrário - chamou a atenção do coordenador da pesquisa e professor da UniFafire, João Paulo Nogueira.
Para ele, o recorte deixa claro que a RMR está indo na contramão da mobilidade urbana sustentável, o que é melhor para a população, as cidades e o planeta. “Os números indicam oportunidades para políticas que incentivem transportes sustentáveis e ampliem a infraestrutura de mobilidade”, observa.
E segue: “Os dados reforçam a necessidade de um planejamento integrado com equilíbrio entre eficiência coletiva e demanda por flexibilidade, que nesse caso vem sendo ocupada pelos aplicativos. Revelam uma quase paridade entre o uso combinado do transporte público coletivo (ônibus + metrô + vans com 42,41%) e do transporte individual motorizado (carro particular + moto particular + carro por app + moto por app com 42,07%)”, coloca.
Ao lado da baixa participação do metrô, a pesquisa também mostra que os modos ativos (bicicleta e caminhar) também precisam de atenção dos gestores públicos. A opção pelo caminhar entre os entrevistados foi de 11,72% e pela bicicleta foi de apenas 2,87%.





A pesquisa foi realizada entre os meses de maio e junho deste ano, e que entrevistou 851 pessoas em diversos espaços públicos do Recife, localizados nos bairros da Boa Vista (Centro), Boa Viagem e Pina (Zona Sul), Várzea e Cidade Universitária (Zona Oeste), Campo Grande e Encruzilhada (Zona Norte), e Ibura (Zona Sul), além de Piedade, bairro de Jaboatão dos Guararapes, na RMR.
PROBLEMAS ESTRUTURAIS AGRAVAM A INSATISFAÇÃO DIÁRIA
A pesquisa detalha as múltiplas deficiências que culminam na profunda insatisfação dos passageiros. A superlotação é um problema crítico e estrutural, com 71,59% dos usuários classificando-a como "ruim" ou "muito ruim". E nessa avaliação pesa, sem dúvida, a falta de prioridade viária no trânsito - faixas e corredores exclusivos para os ônibus.
A segurança é outro ponto de grave crise, sendo avaliada negativamente por 75% dos usuários nos veículos e 74,89% nos terminais e paradas. O conforto dos veículos é considerado "muito ruim" ou "ruim" por 70,31% dos passageiros, evidenciando um problema estrutural na qualidade do serviço.
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Outras áreas com alta reprovação incluem a pontualidade, com 50,47% das avaliações negativas, e o longo tempo de espera, criticado por 66,08% dos entrevistados - aqui, mais uma vez, dois dos efeitos mais negativos da falta de prioridade viária para o transporte público.
A limpeza dos veículos também teve destaque ruim, sendo insatisfatória para 54,23% dos usuários. O custo da tarifa é percebido como elevado ou inadequado por 60,8% dos usuários, sendo um dos principais pontos de insatisfação. Além disso, a acessibilidade para idosos e pessoas com deficiência (PcD) é avaliada negativamente por 57,42% dos usuários.




Esse quadro de deficiências se reflete na percepção de estagnação do serviço: 43,78% dos entrevistados acreditam que a situação do transporte público permaneceu a mesma nos últimos dois anos, enquanto 33,69% afirmam que piorou, e apenas 12,09% enxergam melhorias.
ÔNIBUS AINDA PREDOMINAM, MAS APLICATIVOS CONQUISTAM CADA VEZ MAIS TERRENO
Apesar das críticas, o ônibus ainda se mantém como o meio de locomoção predominante na RMR, utilizado por 35,15% dos entrevistados. No entanto, a pesquisa destaca uma clara mudança nos padrões de deslocamento, impulsionada pela busca por maior conveniência e flexibilidade. Os serviços de transporte por aplicativo (carros e motos) somam 23,08% da preferência, superando ligeiramente o uso do carro particular (13,83%).
O crescimento do uso dos aplicativos de transporte de passageiros com motos - puxado pelo Uber e 99 Moto - se reflete na pesquisa: dos 23,08% que usam os apps, mais de 9% já estão fazendo seus deslocamentos com o serviço de motos.
O estudo revela que o uso combinado do transporte público coletivo (ônibus, metrô e vans), que atinge 42,41%, está em quase paridade com o transporte individual motorizado (carro particular, moto particular, carro por aplicativo e moto por aplicativo), que soma 42,07%.
Essa estatística reforça a demanda por flexibilidade e o crescimento dos aplicativos como uma alternativa viável e cada vez mais utilizada pela população do Grande Recife. A frequência de uso do transporte público também corrobora essa dinâmica: embora 41,08% o utilizem diariamente, uma parcela significativa (22,18%) o usa "raramente" e 7,28% "nunca" utilizam, possivelmente devido à preferência por outros meios, como os aplicativos. Os principais motivos para o uso do transporte público ainda são trabalho (37,56%) e estudo (34,51%), indicando um sistema focado em deslocamentos essenciais.
CARTÃO VEM E ATENDIMENTO AOS MOTORISTAS BEM AVALIADOS
UniFafire Inteligência de Mercado - Transporte Público by Roberta Soares
Em meio a um cenário de insatisfação generalizada, a pesquisa aponta alguns pontos positivos isolados que indicam um caminho para futuras melhorias. O cartão VEM, por exemplo, é amplamente utilizado por 65,96% dos passageiros. Além disso, 61,62% dos usuários acreditam que a utilização do cartão VEM melhorou o uso do transporte público, reconhecendo-o como um avanço significativo na modernização do sistema e um facilitador da mobilidade urbana.
Outro aspecto com avaliação relativamente mais favorável é o atendimento dos motoristas: 39,67% o classificam como "regular", e 34,27% o avaliam positivamente ("bom" ou "muito bom"). Este resultado sugere que ações de capacitação e humanização podem estar surtindo efeito positivo, diferenciando este aspecto de outras críticas severas ao sistema.
Os dados da UniFafire Inteligência de Mercado reforçam a urgência de intervenções integradas e políticas públicas eficazes para transformar o transporte público da RMR em um serviço de qualidade, capaz de atender às necessidades da população e promover uma mobilidade verdadeiramente inclusiva e eficiente.
A fuga para os aplicativos é um sintoma claro da falha do sistema atual em prover conforto, segurança e eficiência, sinalizando a necessidade de investimentos na frota, infraestrutura e gestão para restaurar a confiança dos passageiros e reverter o quadro de insatisfação predominante.