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Transporte por moto: Brasileiros trocam transporte público por aplicativos de motos em busca de conforto e agilidade

Passageiro já queria sair do sistema de transporte público e tem no serviço como Uber e 99 Moto a saída, mesmo sabendo dos riscos no trânsito

Por Roberta Soares Publicado em 19/06/2025 às 7:30

A fome com a vontade de comer. Essa é a comparação simples e direta entre o passageiro que depende do transporte público brasileiro e os aplicativos de transporte com moto, como o Uber e 99 Moto. A fuga é certa e compreendida, já que o serviço de transporte coletivo do País é ruim, sendo muito, muito ruim em algumas cidades.

O cidadão enxerga no motoapp a possibilidade de ter um deslocamento pela cidade mais rápido e barato, além de acessível - o Uber e 99 Moto vão onde o ônibus não vai, é fato. Mesmo sabendo que mais da metade das vítimas do trânsito brasileiro são ocupantes de motocicletas - não só condutores, mas agora também passageiros. E muitos.

“Uso com frequência o serviço de moto exatamente porque ele me dá mais confiança do que o ônibus ou o metrô. Deixei de usar o metrô há algum tempo porque ficou muito ruim: quente e imprevisível. Fui para o ônibus, mas é difícil para quem mora mais distante, como é meu caso. O Uber e 99 Moto te pegam em casa, é bem mais barato e ganhamos tempo no trânsito”, diz o atendente de marketing Márcio Ferraz, resumindo as vantagens do serviço.

Mas e o risco de uma queda, colisão, perder um dedo, uma perna ou até mesmo morrer numa viagem de moto, conduzida por uma pessoa que você não faz ideia da habilidade sobre duas rodas?

“Existe o risco sim, sei disso. Quem usa sabe, mas aposta no melhor e na necessidade. Se pudesse, usaria apenas os apps de carro, mas sai muito caro. Infelizmente. Mas andar no transporte público também é conviver com o medo de um assalto, por exemplo”, segue na defesa dos aplicativos de transporte com motos.

Esse é mais um recorte da série de reportagens Transporte por moto: O Brasil precisa enfrentar, publicada pela Coluna Mobilidade do JC para discutir a necessidade de o País enfrentar a criação de regras para o transporte de passageiros com motos.

PASSAGEIROS ESTÃO SENDO ‘ROUBADOS’ PELOS APLICATIVOS DE TRANSPORTE, ESPECIALMENTE COM MOTO

A saída dos passageiros do transporte público coletivo e urbano no Brasil não é um fenômeno novo, acontecendo há pelo menos duas décadas. Contudo, com a ascensão dos aplicativos de transporte, especialmente os de motocicletas, o desafio de reverter essa tendência tornou-se significativamente maior. O poder público e os operadores de transporte enfrentam uma competição acirrada, pois os passageiros têm sido "roubados" pelos aplicativos, cansados da qualidade defasada dos serviços de ônibus, metrôs e trens nas cidades. Enquanto antes as alternativas eram limitadas e caras, os aplicativos democratizaram a mobilidade, oferecendo novas opções.

Essa migração foi mais uma vez confirmada pela Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana, divulgada em agosto de 2024. O estudo revelou uma evolução expressiva na saída do passageiro do transporte público para os apps, saltando de 1,0% em 2017 para 11,1% em 2024. O crescimento é notável principalmente entre a população de baixa renda: 56,6% dos que trocaram o ônibus por aplicativos pertencem à classe C, e 20,1% às classes D/E.

Quase 60% dos entrevistados (56,9%) afirmaram ter parado de usar o ônibus totalmente (29,4%) ou diminuído seu uso (27,5%). Sete anos atrás, em 2017, apenas 1% das pessoas usavam aplicativos, um número que explodiu para 11% em 2024, impulsionado também pelo surgimento da modalidade com motos no final de 2021.

IMAGEM NEGATIVA DO TRANSPORTE PÚBLICO SÓ AUMENTA NO PAÍS

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Aplicativos de motos estão roubando o passageiro, que já queria fugir do transporte público ruim - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

A pesquisa também constata que a imagem negativa do transporte público brasileiro se agravou, com a parcela da população que o considera um problema quase dobrando em sete anos, passando de 12,4% para 24,3%. O percentual de pessoas que utilizam o ônibus diminuiu 14,3% em comparação com 2017 (quando era de 45,2%), enquanto os sistemas de metrô tiveram uma redução bem menor (de 4,6% para 4,2%), explicada pela previsibilidade e agilidade dos trilhos. Fatores como o aumento da utilização de carro próprio (de 22,2% para 29,6%) e moto própria (de 5,1% para 10,9%) também podem ter influenciado essa queda.

MESMO COM RISCOS E CUSTOS, CONFORTO E AGILIDADE CONQUISTAM O PASSAGEIRO

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
O transporte público do Grande Recife e de boa parte do Brasil parou no tempo. Ficou velho, desatualizado. Não se modernizou - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Mesmo diante dos riscos iminentes de sinistros de trânsito, a população não desiste das viagens em aplicativos de moto. A Pesquisa CNT aponta que mais da metade dos usuários de Uber e 99 Moto (58,5%) reconhecem o risco de quedas e colisões na garupa. A falta de equipamentos de segurança adequados, como EPIs e capacetes seguros, também é uma preocupação para 17,1% dos entrevistados.

Curiosamente, a migração para os aplicativos de moto acontece com força, mesmo com um aumento de mais de 10% no custo desses transportes desde 2017. Apesar de o valor das passagens ser um fator que influencia a fuga dos passageiros – com mais de 60% apontando a redução da tarifa como um atrativo para retornar ao sistema – um dado surpreendente da Pesquisa CNT é a disposição de uma parcela significativa dos passageiros em pagar mais por viagens mais confortáveis e menos impactantes ao meio ambiente. 

Confira a Pesquisa CNT de Mobilidade Urbana na íntegra:

Pesquisa de Mobilidade Urba... by Roberta Soares

Mais de 57% dos entrevistados estão dispostos a pagar uma tarifa mais cara para viajar somente sentados nos ônibus. Em relação à sustentabilidade, 52,6% afirmaram estar dispostos a pagar uma tarifa diferenciada pelo uso de veículos menos poluentes, e 32,1% por ônibus elétricos. A Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana, cuja primeira versão foi em 2017 e atualizada em 2024, realizou mais de 3 mil entrevistas em 35 municípios do País.

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