Uber e 99 Moto: condutor e passageira de aplicativo de moto ficam feridos em colisão na BR-101, no Recife
Colisões com motos têm sido cada vez mais comuns com a explosão do Uber e 99 Moto, enquanto prefeitos se omitem sobre regulamentação do serviço

Enquanto quase a totalidade dos prefeitos brasileiros se omite sobre a proibição ou regulamentação dos aplicativos de transporte de passageiros com motocicletas, como o Uber e 99 Moto, as cidades seguem contando os mortos e feridos. O Recife é uma delas.
Nesta quarta-feira (16/4), um pouco antes das 9h, mais uma colisão envolvendo condutores e passageiros do serviço de motos foi registrada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) na capital pernambucana. E, mais uma vez, em rodovias federais - no caso a BR-101 -, onde a maioria dos sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se define, segundo o CTB e a ABNT) com os aplicativos de transporte tem acontecido, potencializando a fatalidade por serem vias de tráfego intenso, pesado e rápido.
A colisão aconteceu no Km 65 da BR-101, na altura do bairro da Iputinga, na Zona Oeste do Recife. Segundo a PRF, o condutor da motocicleta teria perdido o controle do veículo e colidiu contra um caminhão e o parachoque de um carro. Os dois ocupantes ficaram feridos e receberam atendimento do SAMU.
O motoqueiro teria 51 anos e a passageira do aplicativo, 35. Os dois foram encaminhados para a UPA dos Torrões, na mesma região. A PRF confirmou que o condutor fazia o serviço de aplicativo de transporte e transportava a passageira.
PELO MENOS NO CASO DO RECIFE, SERVIÇO NÃO TEM QUALQUER PREVISÃO DE SER PROIBIDO OU REGULAMENTADO
Recentemente, o prefeito do Recife, João Campos (PSB), afirmou que só decidirá sobre a proibição ou regulamentação do Uber e 99 Moto após realizar uma articulação nacional sobre o serviço.
Segundo o gestor municipal, a capital está analisando o crescimento do serviço - e seus consequentes impactos para a mobilidade urbana e a saúde pública - e vai buscar uma discussão coletiva e nacional com outras grandes cidades brasileiras para decidir o futuro do transporte com motocicletas.
A perspectiva foi dada pelo prefeito no início do mês de abril, ao ser questionado sobre os planos da gestão municipal sobre o serviço: se irá proibir ou se enfrentará a complexa regulamentação do Uber e 99 Moto. Segundo João Campos, o tema precisa ter solução nacional, articulada com os prefeitos das maiores cidades brasileiras para ter efetividade. Só assim, e a partir disso, é que a capital pernambucana vai se posicionar oficialmente.
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“O Recife não tem uma decisão tomada sobre o transporte de passageiros com motos e não irá por um caminho isolado, sem articulação com as demais grandes cidades do País. E não o fará porque, na prática, é uma questão nacional. Não adianta uma cidade ser uma gota no oceano e decidir isoladamente, sem ter um entendimento maior, coletivo. Se não, vira um embate, termina numa suprema corte, vira uma decisão isolada e não conseguimos, efetivamente, melhorar o que tem que ser melhorado”, afirmou.
O questionamento foi feito ao prefeito porque, em outubro de 2024, após a Prefeitura do Recife perder - segundo o Supremo Tribunal Federal (STF) - o prazo de um recurso, a ação que era movida pela plataforma 99 desde 2020 transitou em julgado, impedindo a gestão municipal de fiscalizar, sob a ótica do transporte de passageiros, os carros de aplicativos. A ação, inclusive, nunca analisou o serviço com motos, que só foi criado pela Uber a partir de dezembro de 2021.
ARTICULAÇÃO COLETIVA VIA FRENTE NACIONAL DOS PREFEITOS
João Campos garantiu que começou a tratar nacionalmente do tema via Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), onde está atuando como vice-presidente de Relações Institucionais. Também reconheceu que o crescimento do Uber e 99 Moto é uma demanda antiga e que precisa de solução.
“No encontro da FNP realizado no dia 7/4 tive a oportunidade de conversar com alguns prefeitos de grandes cidades para que possamos construir um entendimento harmônico entre as cidades sobre o Uber e 99 Moto. Isso, porque o foco de todo mundo é poder cuidar das pessoas, seja de quem usa o transporte por motos, seja de quem trabalha com o transporte ou de quem precisa de condições adequadas de trabalho”, disse.
ESTRATÉGIA COLETIVA PARA EVITAR JUDICIALIZAÇÕES
Na visão do prefeito do Recife, a decisão de proibir ou regulamentar o Uber e 99 Moto precisa estar bem fundamentada legalmente para evitar judicializações desnecessárias, como vem acontecendo desde que as gigantes da mobilidade urbana, Uber e 99, chegaram ao Brasil, ainda em 2015 e apenas com os carros de aplicativos.
“Tendo em vista que essa pauta não é de hoje, já é de muitos anos e com muitos anos de embate judicial e de insegurança jurídica quanto ao papel e os limites que o município pode ter, acho que chegou a hora de, no ambiente da FNP, buscar essa sinergia. É isso que a gente vai tentar. Ações isoladas geram litígios e insegurança para todo mundo”, afirmou.
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João Campos, entretanto, também garantiu que, enquanto busca a discussão nacional via FNP, o crescimento e as possíveis soluções para o Uber e 99 Moto estão sendo analisadas internamente. “A gente está com a Secretaria de Segurança e Ordem Pública cuidando dessa avaliação interna para definir os próximos passos relativos ao Recife.”
Ao se referir às ações judiciais, o prefeito citou o exemplo de São Paulo, onde a prefeitura trava - isoladamente no País - uma batalha judicial contra as plataformas Uber e 99. “Todas as cidades estão observando o que São Paulo tem feito, mas você vê o desafio que a maior cidade brasileira tem enfrentado para conduzir uma pauta desta de forma isolada. Então, por isso defendo que o correto, o que o bom senso preza, é conversar nacionalmente, unindo as grandes cidades”, disse.
SENTIMENTO DE QUE RECIFE NÃO DEVE PROIBIR O SERVIÇO
“Eu conversei com Eduardo Paes, presidente da FNP e prefeito do Rio de Janeiro, para que a gente possa ter maior sinergia nessa situação porque o senso comum de todo mundo está focado nas pessoas, tanto nas que conduzem como nas que são conduzidas”, afirmou. E continuou, dando a entender que busca a regulamentação do Uber e 99 Moto e, não, a proibição:
“O que a gente quer é ter um ambiente com segurança, com bem estar das pessoas, com as regulações que a legislação determina. Isso porque, se criarmos um embate entre o poder público, as empresas de tecnologia (que são duas ou três), e se não tivermos cuidado, vamos terminar penalizando quem está na ponta, seja um trabalhador, seja um pai ou uma mãe de família que utiliza o serviço. Então, vamos estar tratando disso na FNP porque é um tema extremamente importante. E repito: se for tratado de forma isolada em cada cidade, corremos o risco de ter grandes confusões e poucos resultados”, finalizou.
QUASE 200 ATENDIMENTOS A VÍTIMAS DAS MOTOS NO RECIFE E NA RMR POR FIM DE SEMANA
Enquanto o prefeito João Campos busca uma solução nacional para o Uber e 99 Moto, o número de atendimentos do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) a ocupantes de motocicletas - condutores e passageiros - voltou a assustar o Recife e a RMR. Para se ter ideia da gravidade da situação, devido à pouca habilidade dos motoqueiros, potencializada pela vulnerabilidade intrínseca das motos, o SAMU tem realizado uma média de 200 atendimentos entre as noites das sextas-feiras e as manhãs das segundas.
No fim de semana de 29 a 31/3, por exemplo, foram atendidos 147 sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se define, segundo o CTB e a ABNT) envolvendo ocupantes de motocicletas. Os registros foram feitos entre as 19h da sexta e às 6h da segunda.
E não para por aí: entre as 6h e as 12h da segunda, foram mais 29 atendimentos a colisões com motos, totalizando 176 registros num único fim de semana. Dos três óbitos registrados no local de atendimento do SAMU, dois foram de ocupantes de motos.
A média de atendimentos do SAMU nos fins de semana tem sido de 150 a 200 pelo menos desde 2024. As ocorrências, inclusive, representam mais da metade dos envios de ambulância do serviço.
EXPLOSÃO DE CASOS APÓS CRESCIMENTO DO UBER E 99 MOTO
A Região Metropolitana do Recife tem acompanhado um crescimento gradativo dos atendimentos a ocupantes das motocicletas desde 2022, com um pico ainda maior em 2023 e 204, sendo impossível não fazer uma associação com a expansão do serviço de transporte de passageiros com motos via aplicativo, como Uber e 99 Moto.
Em maio de 2024, os números do SAMU já revelavam uma explosão da má condução de motocicletas no trânsito da Região Metropolitana do Recife e, principalmente, da capital pernambucana. Foram 2.464 casos a mais de atendimentos a ocupantes de motos - condutor e passageiro - nos 14 municípios da Região Metropolitana do Recife em 2023. A comparação é com o ano de 2022.
Entre 2021 e março de 2024, a RMR teve nada menos do que 25.738 atendimentos de vítimas de motos pelo SAMU. Enquanto a capital teve 14.636. A capital pernambucana é a cidade que lidera o ranking negativo do SAMU e, mesmo assim, a Prefeitura do Recife segue sem reagir ao crescimento do serviço de Uber e 99 Moto.
JABOATÃO DOS GUARARAPES E OLINDA COM ALTOS ÍNDICES
Depois da capital pernambucana, as cidades com os maiores índices de atendimentos a feridos em quedas e colisões com motos na Região Metropolitana são Jaboatão dos Guararapes e Olinda. Enquanto o Recife acumulava 14.636 casos entre 2021 e março de 2024, Jaboatão tinha 2.749, e Olinda, 2.023.
Dos quase 26 mil casos registrados pelo SAMU na RMR desde 2021 e até março de 2024, 19.200 foram entre 2022 e 2024 - exatamente o período de entrada do Uber e 99 Moto no Grande Recife. Quando o recorte é feito apenas sobre a capital pernambucana, o mesmo cenário preocupante se destaca. Dos 14.636 atendimentos, 11.059 foram registrados entre 2022 e 2024.
MAIORIA DAS VÍTIMAS TÊM SIDO OS PASSAGEIROS DAS MOTOCICLETAS
As principais vítimas das motocicletas após a explosão dos apps de transporte têm sido os passageiros. São eles quem mais sofrem e que têm as maiores lesões. Segundo profissionais da área de saúde ouvidos em outras reportagens pelo JC, os condutores das motos conseguem se antecipar à colisão ou à queda. Mas o passageiro não. Geralmente está distraído na garupa, solto, e no celular. Muitos, inclusive, não utilizam, sequer, um capacete adequado.
Outro aspecto perigoso evidenciado é a frequência de atendimentos a ocorrências em rodovias que cortam o Grande Recife, inclusive BRs. E os sinistros nas rodovias são de maior energia porque são sempre entre motos e caminhões ou motos e carros, tendo o óbito como desfecho comum. Quando a morte não acontece, são fraturas com amputação ou expostas.