Uber e 99 Moto: Prefeitura do Recife não fiscaliza aplicativos de transporte com motos porque não quer. Justiça não proíbe. Entenda
Ação da 99 contra fiscalização de carros de aplicativos é encerrada na Justiça e não proíbe Prefeitura do Recife de fiscalizar serviço com motos

Pelo menos no caso do Recife, o transporte remunerado de passageiros com motos, como Uber e 99 Moto, não é proibido ou fiscalizado porque a gestão municipal não quer. O argumento que vem sendo usado pela Prefeitura do Recife desde que o serviço entrou em operação na cidade, ainda em 2022, de que não poderia agir para proibir ou regulamentar os aplicativos de motocicletas porque existia uma ação judicial tramitando em relação aos carros, não tem base legal, apenas política.
Isso porque a ação judicial a que se refere a gestão municipal, movida pela empresa 99 Tecnologia ainda em 2020, não cita o transporte com motos, apenas o serviço tradicional da Uber e 99, operado por carros. A interpretação equivocada da gestão municipal ficou evidente agora porque a ação que a plataforma 99 movia contra a Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU) foi encerrada recentemente, inclusive com uma falha jurídica da gestão municipal que impediu a análise do último recurso pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A conclusão da ação e a exclusão das motocicletas do processo foram confirmadas pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) à Coluna Mobilidade. Segundo o tribunal, quando a ação original foi iniciada no Judiciário, o serviço de transporte de passageiros com motos não existia. Assim, a decisão não poderia se estender, agora, às motos, porque ela não era objeto do processo no início.
“A decisão proferida no bojo da ação movida pela 99 Tecnologia contra a Prefeitura do Recife não afeta o serviço com motos, considerando que o seu objeto litigioso versou apenas sobre carros de aplicativo”, explicou o TJPE por nota oficial.
Ou seja, uma possível regulamentação ou proibição do transporte com motos no Recife, como Uber e 99 Moto, é uma decisão político-administrativa da gestão do prefeito João Campos (PSB). Ou a prefeitura proíbe, via decreto, como foi feito pela Prefeitura de São Paulo ; ou enfrenta a regulamentação do serviço; ou segue ignorando a oferta do serviço na cidade, a mesma estratégia de outros prefeitos da Região Metropolitana do Recife, principalmente os de Jaboatão dos Guararapes e Olinda, que lideram as estatísticas de quedas e colisões de ocupantes de motos do SAMU depois da capital.
Ainda de acordo com o TJPE, sobre o serviço com motos, a Prefeitura do Recife teria que entrar com uma nova ação no Judiciário ou esperar, como aconteceu com os carros de aplicativos, um acionamento das próprias plataformas Uber e 99. O que não seria possível é pegar a decisão judicial para os aplicativos de transporte com carros e estender ao serviço com motos ou qualquer outro que surgiu depois - estratégia que vem sendo usada desde a primeira gestão João Campos, em 2020.
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Chegou ao fim a disputa judicial em que a Prefeitura do Recife é ré desde 2020, provocada pela plataforma 99, que na época tentava evitar, às vésperas do Carnaval, a efetivação da Lei Municipal 18.528/2018, aprovada pela Câmara de Vereadores e sancionada em 2018 para regulamentar os aplicativos de transporte com carros.
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E, segundo informações dos autos, a tentativa da Procuradoria Geral do Município do Recife de recorrer ao STF não deu certo. O tribunal negou o recurso sob alegação de que a gestão municipal perdeu o prazo legal de apresentá-lo e ainda colocou o município para custear os honorários do processo.
“O acórdão recorrido foi publicado em 06.01.2023, tendo o recurso extraordinário sido interposto somente em 09.03.2023. Dessa forma, ele é inadmissível, porquanto intempestivo, visto que foi interposto fora do prazo estabelecido no art. 1.003, § 5º, do CPC/2015”, afirma o STF em sua decisão.
E segue: “Vistos, relatados e discutidos estes autos, em conformidade com a ata de julgamento, em Sessão Virtual, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo, com imposição de multa e majoração de honorários, nos termos do voto do Relator”, finaliza. A decisão foi do fim de setembro de 2024 e nunca divulgada pela Prefeitura do Recife.
Assim, o processo transitou em julgado e nada mais pode ser feito. “Uma vez certificado o trânsito em julgado do acórdão proferido pela 2ª Câmara de Direito Público, o processo foi remetido pelo STF à 2ª Vice-Presidência deste tribunal, a qual dará os encaminhamentos necessários à baixa dos autos ao Juízo de origem, para que seja promovido o seu arquivamento. Ressaltamos que, uma vez transitado em julgado o acórdão proferido pela 2ª Câmara de Direito Público, não cabem mais recursos no processo”, afirmou a assessoria do desembargador Francisco Bandeira de Mello, do TJPE.
CONFIRA abaixo a decisão do STF:
Document - Acórdão Com Inteiro Teor STF by Roberta Soares
DECISÃO QUE VALE IMPEDE A FISCALIZAÇÃO DOS APLICATIVOS COMO TRANSPORTE DE PASSAGEIROS, APENAS PELO CTB, MAS EXCLUI SERVIÇO DE MOTOS
A decisão que passa a valer é a da 2ª Câmara de Direito Público do TJPE, que, na prática, beneficia as gigantes da mobilidade urbana: 99, autora da ação, mais a Uber e todas as outras na sequência. A decisão impede a fiscalização dos carros de aplicativos como transporte remunerado de passageiros ao proibir o uso dos principais pontos da Lei Municipal 18.528/2018.
Embora a decisão afirme que a 99 deve se submeter à competência fiscalizatória da CTTU prevista na Lei Federal nº 13.640/2018, proíbe a autarquia de verificar 11 pontos fundamentais na caracterização da efetiva fiscalização do transporte. Confira:
1) Realizar credenciamento prévio;
2) Efetuar o pagamento de preço público;
3) Disponibilizar a base de dados das operações realizadas à CTTU;
4) Garantir tarifa aos usuários;
5) Ser responsável pela veracidade das informações cadastrais e da base de dados apresentadas;
6) Descredenciar o motorista que tenha praticado infração administrativa;
7) Garantir ao passageiro a possibilidade de cancelar a corrida em até 5 (cinco) minutos;
8) Disponibilizar um espaço de fácil acesso para que o usuário efetue registro de qualquer ocorrência com relação ao serviço;
9) Fixar domicílio fiscal no Município do Recife, para efeito de cobrança de ISS;
10) Guardar registros referentes aos serviços prestados intermediados pela plataforma pelo período de 05 (cinco) anos;
11) Exigir do motorista parceiro certificado de inspeção veicular, curso específico para condutores de Transporte Remunerado Privado Individual de Passageiros (TRPIP) e emplacamento em Municípios no Estado de Pernambuco.
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Ou seja, vale apenas a fiscalização via Código de Trânsito Brasileiro (CTB), como qualquer veículo e cidadão comum. “Dessa forma, remanesce vigente e eficaz o acórdão de julgamento proferido pela 2ª Câmara de Direito Público, que deu provimento parcial ao Reexame Necessário, prejudicados os apelos voluntários do Município do Recife e da CTTU, para, reformando em parte a sentença a quo, assentar que a empresa 99 Tecnologia Ltda. deve se submeter à competência fiscalizatória da CTTU, no tocante às exigências contidas na Lei Federal nº 12.587/2012, alterada pela Lei Federal nº 13.640/2018, que integrem o conjunto de atribuições da referida autarquia de trânsito, mantidos os demais termos da sentença a quo, notadamente a parte que desobrigou a empresa 99 Tecnologia Ltda de … (cita os 11 pontos colocados acima)”.
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A reportagem tentou conversar com a Prefeitura do Recife, via CTTU e PGM, mas obteve poucas informações, enviadas em pequenas notas oficiais. Quando as repostas foram questionadas, não foi dado nenhum retorno.
A CTTU não se posicionou sobre o fato de a ação da 99, desde 2020, não incluir o transporte com motos, ou seja, o Uber e 99 Moto. Apenas disse que os aplicativos serão fiscalizados pelo CTB. Já a PGM negou que tenha perdido o prazo legal de recurso, como afirmado pelo STF. Confira o que diz a PCR.
“A Prefeitura do Recife informa que cumpriu todos os prazos em todas as instâncias na ação judicial que envolve a empresa e que respeita a decisão proferida pela Justiça em relação à matéria. A fiscalização dos condutores de aplicativo seguirá sendo feita dentro do que prevê o Código de Trânsito Brasileiro (CTB)”.