Empréstimo de R$ 1,7 bilhão já demora mais na Alepe do que pedido de R$ 1,5 bi, símbolo da tensão entre poderes
Assunto foi calo do governo no primeiro semestre e voltou ao centro das negociações neste fim de ano, provocando esvaziamento do plenário
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O pedido de autorização para o empréstimo de R$ 1,7 bilhão enviado pelo governo Raquel Lyra (PSD) à Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) já tramita há mais tempo que o projeto anterior, de R$ 1,5 bilhão, que se tornou símbolo do desgaste entre Executivo e Legislativo ao longo de 2025 e demorou mais de 5 meses para ser aprovado.
Apresentado pelo governo em junho, o texto completa 178 dias na Casa Legislativa neste domingo (30), e permanece fora da pauta do plenário, apesar de já ter sido aprovado pelas três comissões iniciais.
Já o pedido de R$ 1,5 bilhão chegou à Alepe em março e passou 173 dias na Casa até ser aprovado no plenário em 9 de setembro, não sem antes passar por entraves, disputas políticas e mudanças de rota.
O resultado dessa demora é mais um foco de tensão entre o Palácio do Campo das Princesas a Alepe, prolongando o clima de desconfiança instaurado ao longo do ano e mantendo travada uma das principais prioridades fiscais do governo.
Crédito é prioridade para Raquel Lyra
Embora tenha sido pulicado no Diário Oficial do Legislativo no dia 18 de junho, o projeto foi enviado pelo governo à Alepe no dia 5 de junho. Depois disso, o texto só começou a andar em 12 de agosto, após o recesso legislativo do meio do ano, quando foi colocado para distribuição na Comissão de Constituição, Legislação e Justiça (CCLJ).
Sob relatoria da deputada governista Débora Almeida (PSDB), o texto foi aprovado no colegiado em 2 de setembro. Em seguida, recebeu aval das comissões de Finanças, Orçamento e Tributação e de Administração Pública em 9 de setembro.
Desde então, o projeto não avançou. O presidente da Alepe, deputado Álvaro Porto (PSDB), já afirmou publicamente que só levará a matéria ao plenário em 2026, estendendo ainda mais o impasse político.
A governadora Raquel Lyra, por sua vez, vem reforçando em entrevistas e discursos os pedidos para que o Legislativo destrave o projeto, lembrando que ele passou por todas as etapas regimentais e aguarda apenas votação em plenário.
O governo argumenta que o recurso, de R$ 1.749.327.484,00, será destinado a projetos estruturantes em diversas áreas, em linha com o planejamento de investimentos estaduais de grande porte.
Empréstimo vem gerando esvaziamento do plenário
A demora na votação, contudo, se insere em um ambiente de disputa explícita entre os Poderes. A base governista vem esvaziando o plenário para impedir votações de interesse da Assembleia enquanto a operação de crédito não for apreciada. Do outro lado, o comando da Casa condiciona a análise do empréstimo à construção de consenso em torno dessas outras matérias.
Na semana passada, havia a expectativa de que o empréstimo fosse votado com presença massiva da base governista. Contudo, o presidente da Casa também sinalizou que votaria no mesmo dia a PEC 31/2025, que aumenta o valor das emendas parlamentares em 1,55% da Receita Corrente Líquida, percentual acima do planejado pelo governo.
Ao constatar que a base de Raquel Lyra não apoiaria o aumento das emendas, Álvaro Porto retirou o empréstimo de pauta e elevou novamente a tensão entre Executivo e Legislativo.
A disputa ganhou novos contornos com a discussão sobre a PEC 30/2025 e o Projeto de Lei Complementar (PLC) 3578, que tratam de mudanças na Constituição Estadual e na tramitação de emendas parlamentares, e chegaram a ser negociados de forma paralela ao projeto de crédito de R$ 1,7 bilhão.
Um entendimento costurado entre parlamentares, a Procuradoria da Alepe e o secretário da Casa Civil, Túlio Vilaça, na segunda-feira (24), previa a votação imediata de apenas três trechos da PEC 30, por meio de um substitutivo, deixando demais mudanças para análise posterior.
A acomodação, contudo, ruiu em poucas horas. Parlamentares relataram que, após o reunião, o Palácio do Campo das Princesas comunicou que não aceitaria o acordo e que a prioridade do governo continuava sendo a votação do empréstimo de R$ 1,7 bilhão.
Na quarta-feira (26), a base governista esvaziou o plenário mais uma vez para evitar a votação da PEC. A recomendação é que os aliados da governadora, que são maioria na Casa, só deem quórum quando o empréstimo for colocado na pauta.
Diante do embate, o presidente da Casa decidiu não pautar mais a PEC nesta semana que se encerrou.
Operação de R$ 1,5 bilhão também foi travada
Antes da análise do empréstimo de R$ 1,7 bilhão, o pedido de contratação de R$ 1,5 bilhão foi a peça principal da tensão entre Legislativo e Executivo no primeiro semestre.
O texto começou a tramitar na Comissão de Justiça cinco dias após a apresentação, em março, com a indicação do deputado oposicionista Waldemar Borges como relator. Ele solicitou informações detalhadas ao governo sobre a destinação dos recursos, prática que prolongou o debate no colegiado.
A proposta avançou para a Comissão de Finanças em abril, onde enfrentou um dos momentos mais sensíveis da tramitação: o deputado Antônio Coelho (União Brasil) apresentou um substitutivo destinando metade do montante diretamente aos municípios, o que acentuou o conflito entre governistas e oposição.
Durante maio e junho, a pauta ficou travada num limbo que tinha como plano de fundo o pagamento das emendas parlamentares de 2024 atrasadas. Votações foram adiadas por falta de quórum e a Casa chegou a ter a pauta geral travada.
O empréstimo só avançou após o recesso dos deputados. Em 18 de agosto, a CCLJ aprovou um novo relatório de Waldemar Borges, com um substitutivo que determinava repasses aos municípios e maior transparência na destinação dos recursos.
Apesar do acordo parcial, a base governista derrubou o substitutivo em plenário e aprovou o texto original do Executivo em 9 de setembro. A sanção veio uma semana depois, em 16 de setembro, com a promessa de que o recurso será usado em obras de grande porte, como o Arco Metropolitano.
Assim como ocorreu com o empréstimo de R$ 1,5 bilhão, a pressão pelo desfecho tende a crescer neste fim de ano, já que o projeto de R$ 1,7 bilhão terá que ir ao plenário em algum momento. E vale lembrar que o recesso do legislativo começa no dia 22 de dezembro. Depois disso, os deputados só voltarão a trabalhar em fevereiro.
Nos corredores da Alepe, há a expectativa de que o assunto seja pacificado nesta semana, mas para isso alguém terá que dar o braço a torcer.