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Radares: Quanto mais fiscalização eletrônica de velocidade, menos multas são aplicadas no trânsito, confirma estudo nacional

Estudo coloca por terra discurso fácil da indústria de multas. A média nacional é dois radares de velocidade para cada grupo de 10 mil veículos

Por Roberta Soares Publicado em 25/11/2025 às 13:36 | Atualizado em 25/11/2025 às 15:25

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Para aqueles que concordam ou alimentam o discurso fácil de que existe uma indústria da multa nas ruas, avenidas e estradas do Brasil, mais um estudo nacional mostra que essa afirmativa não procede. E mais: que a fiscalização eletrônica de velocidade reduz o número de infrações porque força o condutor a ser mais prudente, evitando colisões e - o que mais importa - salvando vidas no trânsito.

O estudo constata que a fiscalização eletrônica com câmeras de segurança - os chamados radares - são determinantes para coibir o excesso de velocidade. Isso porque há uma correlação direta entre o nível de fiscalização e o comportamento dos condutores. “Quanto mais radares instalados, menor é o número de infrações por câmera, o que revela maior obediência às leis de trânsito e mudança de comportamento”, conclui o levantamento.

Apresentado nesta terça-feira (25/11), o estudo, intitulado “Indicadores Brasileiros sobre Fiscalização de Velocidade”, foi realizado pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e com apoio da Associação Brasileira das Empresas de Engenharia de Trânsito (Abeetrans).

A partir dos resultados, o estudo pretende ser uma base segura para decisões públicas e políticas na gestão do trânsito no País. “Todas as unidades da federação que apresentam maior densidade de fiscalização eletrônica de velocidade têm altos índices de vítimas no trânsito. Isso ficou constatado no estudo. É uma grande quebra no discurso fácil e demagógico que radares são instalados para multar e, consequentemente, arrecadar mais. Ficou comprovado exatamente o contrário: quando existem mais equipamentos ativos, menos multas são aplicadas por equipamento. É uma forma de enxergar a política e pressionar o poder público”, afirma o CEO do Observatório Nacional de Segurança Viária, Paulo Guimarães.

BRASIL TEM DOIS RADARES PARA CADA 10 MIL VEÍCULOS E DISCREPÂNCIA NO PAÍS IMPRESSIONA

BERG ALVES/JC IMAGEM
A fiscalização no Brasil é majoritariamente baseada em câmeras de segurança do tipo fixo. A distribuição dessas câmeras é equilibrada, com 50,5% em vias urbanas e 49,5% em rodovias - BERG ALVES/JC IMAGEM

A análise dos indicadores de desempenho da segurança viária se concentrou nos dispositivos de fiscalização eletrônica, devido à disponibilidade de dados publicados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Adotando nove indicadores para avaliar o nível de fiscalização, o estudo revelou que a média nacional é de 2,09 câmeras de segurança por grupo de 10 mil veículos.

A fiscalização no Brasil é majoritariamente baseada em câmeras de segurança do tipo fixo. A distribuição dessas câmeras é equilibrada, com 50,5% em vias urbanas e 49,5% em rodovias. Contudo, a análise demonstrou uma discrepância considerável em relação ao nível de fiscalização eletrônica geral entre os estados:

- O Distrito Federal apresentou o maior índice, com 7,50 câmeras de segurança por 10 mil veículos.
- O Amazonas registrou o menor índice, com apenas 0,12 câmeras de segurança por 10 mil veículos.

Essa disparidade regional também se reflete no indicador de infrações relacionadas à velocidade. O valor médio no Brasil é de 0,31 infrações por veículo, variando de 0,97 no Distrito Federal a 0,05 no Amazonas.

Estudo - Indicadores Brasileiros Sobre Fiscalizacao de Velocidade 29102025-108172 (1) by Roberta Soares

"O estudo e a discrepância evidente no País são fortes subsídios para se cobrar mais fiscalização eletrônica de velocidade da gestão pública”, destaca o professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e coordenador da análise, Tiago Bastos.

Cada câmera de segurança detecta em média 1,5 mil infrações por ano, mas há disparidades entre estados. No Rio Grande do Sul, onde há um sistema mais consolidado, o número é de cerca de 700 infrações por equipamento, enquanto no Amazonas chega a aproximadamente 4,5 mil, indicando menor respeito aos limites de velocidade.

RANKING DAS CAPITAIS

Em relação à quantidade de equipamentos nas capitais, Goiânia (GO) aparece com o maior número de câmeras em vias urbanas (4,75 por 10 mil veículos), seguida por Palmas (TO) e Cuiabá (MT), com 3,98 e 3,81, respectivamente. Já Maceió (AL), Manaus (AM), Vitória (ES) e Florianópolis (SC) não possuem câmeras em áreas urbanas.

Confira os dados por estados e capitais AQUI

O estudo integrou dados públicos do Inmetro, DataSUS, Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Foram mapeados todos os pontos de fiscalização eletrônica de velocidade no País e os dados foram cruzados com o número das frotas, infrações e mortalidades no trânsito das cidades. 

ALERTA NACIONAL PARA AMPLIAÇÃO DA FISCALIZAÇÃO DE VELOCIDADE

Guga Matos/JC Imagem
Não é à toa que a Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que a velocidade é a principal causa de mortes no trânsito, respondendo por 50% dos óbitos. A análise demonstrou uma discrepância considerável em relação ao nível de fiscalização eletrônica geral entre os estados - Guga Matos/JC Imagem

Silvio Médici, presidente da Abeetrans, destacou na coletiva que o estudo foi elaborado exatamente para servir de alerta à violência no trânsito que o Brasil voltou a viver desde a pandemia de covid-19. “Nós estamos muito preocupados com a situação do País. Não podemos mais ignorar o custo humano e social. O Brasil mata 36 mil pessoas em sinistros de trânsito por ano. E este número terrível não é apenas uma estatística, ele impacta na economia, nos sistemas de saúde e previdenciário”, afirmou.

“Temos que enfrentar essa realidade de maneira técnica. Precisamos buscar a pesquisa e a academia, pois são estas entidades que podem, de fato, mudar a visão, principalmente das autoridades que fazem a gestão do trânsito. É fundamental que essa mudança de visão atinja a gestão do trânsito nas rodovias, mas principalmente nos municípios”, reforçou.

E seguiu: “Acreditamos que este estudo que apresentamos hoje pode ser eficiente para isso, ainda mais em época de eleição, quando a atenção à política pública se acentua. Os achados que temos confirmam o que defendemos no nosso projeto Desacelere com infraestrutura. A solução não é única. A segurança viária exige um balanço estratégico. É preciso que tenhamos os dois: infraestrutura boa e fiscalização”, finalizou.

PRINCIPAIS CONCLUSÕES DO ESTUDO

Foto: Oswaldo Corneti/Fotos Públicas
Brasil já teve radares desligados nas rodovias duas vezes por decisões políticas equivocadas ou corte de recursos. Recife ficou mais de um ano com os radares desativados parcialmente por problemas na licitação pública para o novo contrato - Foto: Oswaldo Corneti/Fotos Públicas

A análise detalhada sobre a gestão de velocidades e a fiscalização viária no Brasil apontou para uma grande lacuna entre os preceitos dos sistemas seguros e a realidade nacional, especialmente em relação às recomendações internacionais. Uma conclusão que tem relação direta com as quase 37 mil mortes registradas no trânsito brasileiro por ano.

Por outro lado, a análise indica que, apesar do cenário prático estar distante dos padrões ideais, o Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans), revisado em 2024, incorpora claramente a estratégia da política nacional de segurança viária em relação à gestão de velocidades. O que pode ser uma esperança para o Brasil.

Para funcionar como parâmetro para gestores públicos do trânsito, o estudo finaliza destacando uma série de intervenções de gestão de velocidade com efetividade comprovada na diminuição dos sinistros. Confira as principais táticas bem-sucedidas:

- Implementação de áreas com limite de velocidade a 30 km/h.
- Implantação de elementos físicos como lombadas, ilhas de refúgio, extensões do meio-fio, calçadas e ciclovias.
- Criação de faixas e interseções elevadas, rotatórias, e a redução de velocidade nas entradas das cidades.
- Estreitamento da via e estímulo ao comércio para atrair movimento.
- Fiscalização dos limites de velocidade.

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