Ex-secretário é intimado a depor em processo de PM acusado de atirar e cegar trabalhador no Recife
Delegado federal Humberto Freire foi convocado como testemunha de defesa do 3º sargento Reinaldo Belmiro Lins, que responde por lesão corporal grave
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Após mais de um ano com processo parado, a Vara da Justiça Militar vai retomar a audiência de instrução e julgamento do 3º sargento do Batalhão de Choque Reinaldo Belmiro Lins, acusado de atirar e cegar um trabalhador durante a dispersão de um protesto no Centro do Recife. O delegado federal Humberto Freire, ex-secretário estadual de Defesa Social, foi convocado a depor.
A continuidade da audiência presencial está marcada para o próximo dia 28 de novembro, a partir das 11h, na Vara da Justiça Militar. A previsão é de que sejam ouvidas as testemunhas de defesa, além do interrogatório do réu. Como Freire não está mais morando no Estado, o depoimento dele será por videoconferência, com autorização do juiz Francisco de Assis Galindo.
A vítima da ação policial foi Jonas Correia de França, que havia acabado de largar do trabalho, na tarde de 29 de maio de 2021. Na ocasião, ele decidiu fazer uma chamada de vídeo com a esposa para explicar que iria demorar um pouco para chegar em casa por causa da dispersão do protesto, realizado nacionalmente com críticas à gestão do então presidente Jair Bolsonaro em relação ao combate à covid-19.
Ao filmar a ação dos policiais, na Ponte Princesa Isabel, no bairro da Boa Vista, Jonas foi atingido por um tiro de elastômero (bala de borracha). Ele perdeu a visão do olho direito.
A investigação apontou Reinaldo como o responsável pelo tiro, por isso ele virou réu por lesão corporal grave. A pena pode chegar a cinco anos de prisão, em caso de condenação.
Na época do caso, com repercussão nacional, o então secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua, foi exonerado do cargo. Ele foi substituído por Freire, até então executivo da pasta estadual.
A defesa do policial, representada pelo departamento jurídico da Associação Pernambucana de Cabos e Soldados Policiais e Bombeiros Militares, afirmou que o acusado "está exercendo o seu direito de defesa, albergado pelos princípios constitucionais da ampla defesa".
MILITAR RECEBEU PUNIÇÃO
Em fevereiro de 2024, as investigações da Corregedoria da SDS resultaram em punição administrativa ao militar. A portaria destacou que ele realizou o disparo "sem que houvesse necessidade, mesmo sendo de menor potencial ofensivo (MPO) o armamento utilizado".
As investigações indicaram que o militar "não observou a distância adequada para utilização do armamento de MPO". Apesar disso, a Corregedoria destacou que as provas não apontaram que ele tenha disparado o tiro com intenção de atingir o olho da vítima.
A portaria determinou a prisão do militar por 30 dias e aplicou mais duas punições, cada uma com 21 dias de detenção.
Jonas fechou um acordo com o Estado e recebeu indenização.
OUTRO TRABALHADOR FICOU CEGO
Jonas Correia não foi o único ferido. O adesivador Daniel Campelo da Silva caminhava pela Ponte Duarte Coelho quando foi atingido no olho esquerdo e perdeu a visão. Ele também não participava do protesto.
Em abril de 2022, segundo informou a SDS na época, o PM que atirou em Daniel foi identificado e indiciado por lesão corporal gravíssima (cuja pena pode chegar a oito anos de prisão) e por omissão de socorro (seis meses de detenção ou multa). O nome dele não chegou a ser divulgado.
Outros oito policiais do Batalhão de Radiopatrulha também foram indiciados por omissão de socorro à vítima.
Ao contrário de Jonas, Daniel não fechou acordo com o Estado. No mês passado, a 5ª Vara da Fazenda Pública da Capital condenou o governo a pagar uma indenização de 300 mil por danos morais, além de pensão vitalícia no valor de dois salários mínimos ao trabalhador.