MPF denuncia que presos continuam dando ordens no Complexo Prisional do Curado, no Recife
Mesmo sem superlotação, presídios continuam cercados de problemas. Até a nova unidade já registrou mortes e enfrenta denúncias de maus-tratos e calor

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Apesar da diminuição expressiva da população carcerária nos últimos três anos, o Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife, permanece com graves problemas de violações de direitos humanos. Não só isso, a figura dos chaveiros não chegou ao fim: detentos seguem comandando pavilhões e dando ordens aos demais - numa clara falta de controle do Estado.
A procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes encaminhou à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF), relatório detalhando os problemas nas unidades do Complexo Prisional do Curado, incluindo o novo presídio, que já somou duas mortes e denúncias de maus-tratos e calor.
O documento responde aos questionamentos feitos pelo órgão após nota da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que expressou preocupação com a continuidade de violações no Complexo.
A procuradora relatou que, embora o Estado tenha realizado reformas nos presídios, as melhorias são insuficientes. As inspeções realizadas pelo Conselho Penitenciário do Estado, do qual o MPF é integrante, revelaram persistência de construções irregulares, pagamentos por celas e precariedade na assistência material.
Sobre a contagem de vagas, o MPF identificou que o Estado considera apenas a quantidade de camas de alvenaria em celas coletivas como parâmetro, desconsiderando fatores como espaço físico. A procuradora ressaltou que, embora o número de detentos esteja abaixo da capacidade nominal, o cenário continua de superlotação funcional, comprometendo o acesso a direitos básicos.
Sobre a figura dos "chaveiros", o MPF constatou que a prática persiste sob nova roupagem. Segundo o órgão, a substituição por "representantes de pavilhão" não eliminou o problema, pois os presos continuam exercendo funções similares.
"O 'representante do pavilhão', até o momento, apresenta a essência de centralização da comunicação e o status sobre outros detentos permanece, tal qual o 'chaveiro'. A eliminação da figura do chaveiro do sistema prisional ainda permanece distante da realidade", descreveu o relatório de nove páginas, obtido pela coluna Segurança.
A falta de efetivo suficiente de policiais penais é apontada como uma das causas da permanência da irregularidade.
Em maio deste ano, diante da falta de estrutura mínimo, o Presídio Aspirante Marcelo Francisco de Araújo (Pamfa) foi desativado e começou a ser demolido.
A Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) informou que ainda não sabe o que será feito no espaço. Extraoficialmente, há informações de que o presídio demolido deve dar lugar a uma central de audiência de custódia para presos em flagrante.
De acordo com o relatório da procuradora, a direção da Presídio Juiz Antônio Luiz Lins de Barros (PJALLB) reconheceu a existência de membros de facções como Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV) e Comando Litoral Sul (Trem Bala).
"Quanto à estrutura, existe um pavilhão, não habitado, totalmente destruído com diversos entulhos de obras inacabadas, impossibilitando a utilização deste espaço, que se assemelha a um galpão", citou o documento.
Por determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as unidades mais antigas do Curado seguem proibidas de receber novos presos.
PRESÍDIO NOVO, MAS COM PROBLEMAS BÁSICOS
Já o Presídio Policial Penal Leonardo Lago (PLL), que começou a ser ocupado em março deste ano, tem problemas na infraestrutura. As celas metálicas não tem acesso a energia elétrica e a ventilação é limitada, apontou o MPF. Há denúncias de tortura, maus-tratos e duas mortes registradas em três meses - uma delas confirmada como homicídio.
"O PLL foi idealizado para ser um exemplo no sistema prisional de Pernambuco, com sua arquitetura inovadora e regras mais rígidas, como a proibição da figura dos chaveiros e das cantinas. (...) No Entanto, o cenário identificado é de violações aos direitos humanos", apontou a procuradora.
"A nova estruturação desconsiderou o clima tropical úmido de Recife e, propositalmente, construiu uma unidade sem acesso à energia nos pavilhões, utilizando chapas de metal com apenas a abertura para a passagem das refeições como portões. O resultado é um estabelecimento com níveis altíssimos de calor, restrita circulação de ar e, consequentemente, dados aos detentos, que passam 22 horas dentro dessas celas", concluiu.
A coluna pediu um posicionamento da assessoria da Seap sobre as denúncias de violações no Complexo. Se houver resposta, o texto será atualizado.