Picanha, drinks e drogas: testemunha detalha festas no Presídio de Igarassu
Em depoimento à PF, mulher contou que entrou 3 vezes com facilidade na unidade. Processo por corrupção tem 14 réus, incluindo ex-gestores e policias

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O depoimento de uma mulher à Polícia Federal detalhou como ocorriam as festas no Presídio de Igarassu, localizado no Grande Recife. O relato faz parte do processo judicial, com 14 réus, que não está mais em segredo de justiça. Entre os acusados há um ex-secretário, um ex-diretor da unidade e oito policiais penais.
A recifense de 25 anos, cujo nome será preservado, foi ouvida na condição de testemunha. Ela contou que já esteve em três festas no Presídio de Igarassu, sem especificar as datas. Na primeira vez, o convite foi feito por uma amiga para o aniversário do presidiário Lyferson Barbosa da Silva, chaveiro de um dos pavilhões e apontado na investigação como um dos líder do esquema de corrupção e com contato direto com o ex-diretor Charles Belarmino de Queiroz.
No depoimento, a mulher citou que chegou à unidade por volta das 9h e que havia "muitos policiais próximo de uma porta de cor verde, em uma espécie de acesso especial". Ela disse que não entrou na fila normal de visitantes regulares e que teve acesso, por meio da amiga, ao anunciar que iria encontrar Lyferson.
A testemunha disse que não entrou com celular. E que foi recebida pelo presidiário. "Na festa de aniversário de Lyferson havia muitas pessoas, cerca de 10 parentes, prima, mãe, padrasto e
amigos", descreveu.
A mulher relatou que um policial penal estava ajudando o detento na organização, especialmente a receber as comidas. Na festa, segundo ela, havia um barman preparando drinks com uísque e vodka. E que também estavam disponíveis aos convidados drogas, como maconha e cocaína, consumidas em espaço reservado.
A testemunha disse ter presenciado aparelhos celulares na festa e afirmou ter certeza que os policiais penais tinham ciência do evento, visto que "estavam muito próximos e liberando o acesso".
CÂMERAS COBERTAS
O relato da mulher reforça as regalias aos presos e qualquer falta de pudor da direção do Presídio de Igarassu em relação às diversas irregularidades.
Ela disse que, nas outras duas vezes em que esteve no presídio, as festas também foram lideradas por Lyferson. "Ele colocava uma espécie de cortina para isolar o local [corredor]."
Segundo a mulher, ele usava copos nas câmeras de videomonitoramento para evitar a gravação. Ela descreveu que havia som no pavilhão, além de comidas como picanha, camarão e outros petiscos.
"Não parecia que estava dentro de um presídio, diante da qualidade da comida e da segurança que era passada por Lyferson e pelos policiais penais", citou o depoimento.
Ela disse que visitou a cela do presidiário e que havia três aparelhos de som, aquários, dois passarinhos, perfumes importados, diversos tênis caros e iPhones de última geração.
No ano passado, Lyferson foi transferido para a Penitenciária Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, onde permanece cumprindo pena.
Ele agora também é réu por corrupção ativa, favorecimento real impróprio, organização criminosa e tráfico de drogas.
EX-GESTORES VIRARAM RÉUS
Charles Belarmino de Queiroz, que exerceu o cargo de diretor do Presídio de Igarassu entre 1º de abril de 2016 até o final de 2024. foi preso preventivamente na operação La Catedral, em 25 de fevereiro deste ano.
Mensagens de WhatsApp encontradas no celular de Lyferson confirmaram a forte relação entre os dois. Nos diálogos, o presidiário fazia pedidos, como autorização de entrada de celulares e drogas, e recebia sinal positivo do ex-gestor.
Charles responde pelos crimes de corrupção passiva, prevaricação, favorecimento real impróprio, tráfico de drogas, organização criminosa, corrupção ativa.
Já o ex-secretário executivo de Administração Penitenciária e Ressocialização André de Araújo Albuquerque responde por corrupção passiva e organização criminosa.
Ele foi preso na segunda fase da operação, em abril, após um vídeo encontrado no celular de Charles, com data de 6 de setembro de 2024, mostrar o ex-secretário recebendo maços de dinheiro e guardando numa sacola. Para a PF, a quantia se tratou de propina, entregue na sala da diretoria.
Ex-secretário negou, em interrogatório. Ele confirmou ter recebido valores de Charles, mas disse que se tratava de "presente, em razão de sua atuação religiosa".
Na lista, ainda estão oito policiais penais, uma dentista que atuava no presídio e dois detentos (chaveiros). A Justiça deu prazo para que o grupo apresente a defesa prévia.