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Cantor diz que fez show em festa com álcool, celulares e mulheres no Presídio de Igarassu

Em depoimento à Polícia Federal, músico conhecido como MC Tocha disse que valor do cachê foi entre R$ 8 mil e R$ 10 mil, mas não se recorda a data

Por Raphael Guerra Publicado em 17/07/2025 às 10:42 | Atualizado em 17/07/2025 às 14:28

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O depoimento de um cantor à Polícia Federal reforça as provas de que festas ilegais, com bebidas alcoólicas, celulares e mulheres, ocorriam livremente no Presídio de Igarassu, localizado no Grande Recife. A investigação resultou em ação penal com 14 réus, entre eles um ex-secretário, um ex-diretor da unidade e oito policiais penal.

No processo - que não está mais em segredo de justiça -, consta o interrogatório de Hemerson da Silva Ferreira, conhecido como MC Tocha. O músico de brega-funk, com mais de 530 mil seguidores apenas numa rede social, afirmou ter recebido cachê entre R$ 8 mil e R$ 10 mil para se apresentar no Presídio de Igarassu, mas alegou não lembrar a data.

O depoimento de MC Tocha aconteceu em 13 de março deste ano. Cerca de três semanas após a primeira fase da operação La Catedral, que prendeu o ex-diretor do presídio, Charles Belarmino de Queiroz e sete policiais penais por participação no forte esquema de corrupção.

O presidiário Lyferson Barbosa da Silva também foi alvo - apontado como líder de um pavilhão e com contato direto com o ex-diretor e os policiais penais por meio de WhatsApp. 

MC Tocha disse, em depoimento, que "esteve uma ou duas vezes no Presídio de Igarassu" para se apresentar. E que, em outras ocasiões, também foi visitar amigos, apesar de ter ciência que é proibido. 

Ele declarou que conheceu Lyferson na unidade e que viu policiais penais na entrada e saída do local. 

No interrogatório, na condição de testemunha, o cantor disse que presenciou o consumo de bebidas alcoólicas, mulheres e presos usando celulares no dia em que se apresentou. Afirmou não ter visto consumo de drogas.

O MC declarou não ter conhecimento se o diretor ou algum policial penal tinha conhecimento da festa e que não se recorda quanto tempo durou. Afirmou ainda não lembrar quem foi o responsável pelo pagamento do cachê. 

Por fim, pontuou que a apresentação musical ocorreu em dia de visita e que não viu a presença de crianças no local. 

O relato do MC Tocha se assemelha ao depoimento de uma mulher, que confirmou à Polícia Federal ter participado de festas ilegais no Presídio de Igarassu. Conforme revelado pela coluna Segurança, na quarta-feira (16), a testemunha de 25 anos afirmou que os eventos tinham bebidas, comidas e até drogas.

A testemunha disse ter presenciado aparelhos celulares na festa e afirmou ter certeza que os policiais penais tinham ciência das festas.

CONFIRA LISTA DOS RÉUS E CRIMES ATRIBUÍDOS:

1 - Charles Belarmino de Queiroz (ex-diretor do presídio)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, favorecimento real impróprio, tráfico de drogas, organização criminosa, corrupção ativa.

Acusação: Exerceu o cargo de diretor do presídio entre 1º de abril de 2016 até o final de 2024. Segundo o MPPE, "valendo-se de sua posição de comando, autoridade funcional e conhecimento aprofundado da rotina carcerária, estabeleceu e liderou, de forma consciente e voluntária, uma organização criminosa estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas".

Charles é acusado de receber pagamentos periódicos de dinheiro cobrados de presidiários para permitir atividades ilícitas nos pavilhões e o funcionamento de comércios irregulares.

2 - André de Araújo Albuquerque (ex-secretário executivo de Administração Penitenciária e Ressocialização)

Crimes: corrupção passiva, organização criminosa.

Acusação: Teve a prisão determinada após vídeo encontrado no celular do ex-diretor da unidade mostrar ele recebendo maços de dinheiro e guardando numa sacola. 

"O contexto do recebimento da propina, somado à sua posição estratégica no topo da hierarquia da Seap/PE, revela que André não era um agente periférico ou omisso, mas peça central na manutenção institucional da engrenagem criminosa", descreveu a Polícia Federal.

3 - Lyferson Barbosa da Silva (detento/líder de pavilhão)

Crimes: corrupção ativa, favorecimento real impróprio, organização criminosa, tráfico de drogas.

4 - Eronildo José dos Santos (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, favorecimento real impróprio, prevaricação, organização criminosa, tráfico de drogas.

Acusação: Lotado no Presídio de Igarassu desde 2011, exercia a função de chefe de disciplina e segurança. Investigação indicou que ele se comunicava com Lyferson utilizando o WhatsApp. Nas mensagens, o policial ordenava procedimentos que deveriam ser tomados no pavilhão para autorizar a entrada de visitantes não cadastrados e/ou fora do horário de visitação.

5 - Newson Motta da Costa Neto (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, tráfico de influência, tráfico de drogas, violação de sigilo funcional qualificada, organização criminosa, prevaricação.

Acusação: Apontado como informante de Lyferson. "Nas conversas, percebeu-se que possivelmente o policial penal colocava entorpecente para dentro do presídio em conluio com Lyferson, fazia buscas em bancos de dados para a organização criminosa que Lyferson compõe e outros delitos", descreveu a PF.

6 - Cecília da Silva Santos (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, violação de sigilo funcional qualificada, prevaricação, organização criminosa.

Acusação: Segundo a investigação, ela se utilizava da função pública para receber benefícios irregularmente e solicitava presentes de Lyferson, "além de passar informações restritas sobre outros presos".

7 - Moisés Xavier da Silva (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, violação de sigilo funcional, organização criminosa.

Acusação: Lotado no setor de enfermaria do Presídio de Igarassu, ele teria facilitado a renovação da habilitação de motorista de Lyferson. O esquema teria envolvido o valor de R$ 5 mil.

8 - Ernande Eduardo Freire Cavalcanti (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, violação de sigilo funcional, organização criminosa.

Acusação: Segundo investigação, ele realizava frequentemente pedidos de comidas para Lyferson. O pagamento ocorria por meio de Pix. Mensagens também indicaram que o policial pedia dinheiro ao presidiário. Certa vez, teria solicitado duas notas de R$ 50 para abastecer o carro particular com combustível.

9 - Everton de Melo Santana (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, organização criminosa.

Acusação: Mensagem de 6 de agosto de 2022 mostra que ele entrou em contato com Lyferson perguntando sobre um pedido de sushi. Polícia Federal descreveu Everton como mais um servidor público que facilita a entrada de alimentos não autorizados.

10 - Reginaldo Ferreira Aniceto (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, organização criminosa.

Acusação: Segundo a PF, ele fazia serviços para Lyferson em troca de recompensas. Em conversa no dia 6 de maio de 2022, o presidiário solicitou que Reginaldo escolhesse um tênis. Já em 14 de junho do mesmo ano, o servidor foi até um shopping e retornou mandando imagens do tênis escolhido.

Mensagens indicaram que o policial facilitava a entrada de pessoas não autorizadas, a pedido de Lyferson.

11 - Ednaldo José da Silva (policial penal)

Crimes: corrupção passiva, prevaricação, organização criminosa.

Acusação: Descrito pela Polícia Federal como um servidor com "desequilíbrio financeiro" e que chegou a pedir empréstimos a Lyferson. Em uma das conversas, solicitou R$ 3 mil.

12 - Edilma Alves Francisco de Andrade (dentista do presídio)

Crime: corrupção passiva, prevaricação.

Acusação: Segundo o MPPE, mesmo remunerada pelo Estado para prestar assistência odontológica gratuita aos detentos do Presídio de Igarassu, ela exigia e recebia pagamentos adicionais pelos serviços.

13 - Edgleisson Carlos Alves dos Santos (detento/líder de pavilhão)

Crimes: corrupção ativa, organização criminosa, tráfico de drogas.

Acusação: Investigação indica que ele mantinha interlocução direta, frequente e privilegiada com Charles, utilizando essa relação de confiança pessoal e operacional para praticar e participar ativamente de diversos crimes, atuando como peça fundamental na organização criminosa.

14 - Antônio de Souza Sobrinho (detento/líder de pavilhão)

Crimes: corrupção ativa, organização criminosa.

Acusação: Considerado um elo da então direção da unidade com os presos que lideravam os pavilhões. Aparece no vídeo do suposto pagamendo de propina ao ex-secretário André. 

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