Maquinista que salvou passageiros de incêndio no Metrô do Recife alerta: "Estamos em risco devido à degradação"
Maquinista relata pânico dos passageiros durante incêndio em vagão e alerta que usuários e operadores estão sob risco devido à degradação do sistema
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O incêndio que destruiu parcialmente um dos trens do Metrô do Recife, no sábado (25/10), foi um episódio de risco extremo, e que não resultou em tragédia graças à ação rápida do maquinista e à ajuda da comunidade do entorno quando o fogo começou. O maquinista Antônio Carlos Bezerra Neto, 60 anos e 38 anos de experiência na função, conversou com o JC e descreveu o momento de pânico vivenciado pelos passageiros que estavam a bordo do trem no trecho da Linha Centro entre as estações Curado e Alto do Céu.
Sem a atuação rápida do metroviário - é importante destacar -, talvez alguns passageiros que estavam no metrô incendiado tivessem se machucado, sofrido com a fumaça ou até vivido algo mais grave. Na conversa, o maquinista confirmou que, na situação atual do sistema metroviário do Grande Recife, todos estão em risco, tanto passageiros quanto operadores.
“Todos que operam o metrô diariamente têm feito o possível, mas está muito difícil sem recursos básicos e investimentos. E também assustador porque sabemos da nossa responsabilidade pela vida dos usuários que transportamos”, desabafou. Aproximadamente 50 passageiros estavam viajando no metrô que pegou fogo.
O PÂNICO COM O INCÊNDIO E A AÇÃO RÁPIDA
Antônio Carlos, conhecido carinhosamente entre os metroviários como ‘Batata”, contou que o incêndio começou após uma manobra de energia solicitada pelo Centro de Controle Operacional (CCO). “Inicialmente, o trem parou por falta de energia, e o CCO pediu que desenergizasse o trem e aguardasse cerca de 15 minutos. Ao reenergizar, a situação persistiu, e cerca de três minutos depois, eu ouvi um barulho muito forte. Imediatamente, os usuários correram para a cabine, batendo e gritando para que eu abrisse a porta. Gritavam que havia fogo”, relembrou.
O fogo teve início no último vagão da composição (quarto vagão), na parte traseira. E o maquinista revelou que só soube do incêndio porque um morador da comunidade subiu no muro e alertou que havia fogo na parte superior do trem. “Ele gritou: maquinista, tem fogo, tem fogo. Foi quando, rapidamente e mesmo ainda sem a determinação do CCO, eu decidi abrir as portas para os passageiros descerem na via. Foi muito tumulto e tive medo de a fumaça, que já começava, se espalhar por todos os vagões”, contou.
A retirada dos passageiros foi possível com a ajuda da comunidade local, que utilizou escadas e cadeiras para ajudar os usuários a pular o muro que isola o metrô, e dos ambulantes que coordenaram a saída de mulheres, crianças e idosos. Após a retirada de todos, Bezerra Neto tentou, junto a um segurança, debelar o fogo usando extintores do salão, mas a proporção do incêndio era grande.
“Eu acabei inalando fumaça e passando mal, o que me forçou a desistir, até porque, pela dimensão do fogo, não havia mais o que fazer. Só os Bombeiros conseguiriam apagar as chamas, aquela altura muito altas. E como os passageiros estavam a salvo, era possível recuar”, contou.
DEGRADAÇÃO CHEGOU AO LIMITE MÁXIMO
O maquinista Antônio Carlos Bezerra Neto, que dedicou 38 anos ao sistema, reforça o que todos já sabem: que o incêndio no vagão é reflexo direto da deterioração da infraestrutura do metrô. Ele classificou a operação atual como muito desgastante e degradante para os operadores.
“A degradação chegou a um limite insuportável, fazendo com que a operação seja algo extremamente desgastante e degradante para a gente que está lá, todos os dias, em contato com os usuários. Isso tudo devido às condições dos trens e da via".
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O problema estaria associado a falhas estruturais, como a falta de energia, cabos que estão quebrando, e questões de manutenção. O maquinista mencionou que esta é a primeira vez que a empresa enfrenta um trem pegando fogo devido a um curto-circuito, que provavelmente ocorreu no retorno da energia. Ele também lembrou de outro episódio de risco, em Joana Bezerra, quando um fio da catenária energizado caiu na plataforma, gerando um risco muito alto de choque para os passageiros.
Ao ser questionado sobre o que pode ser feito para melhorar a situação do Metrô do Recife, o maquinista fez um apelo urgente ao governo federal: que mande recursos para o metrô, independentemente da decisão política de conceder ou não a operação e gestão do sistema à iniciativa privada.
“A situação é crítica, com a operação sendo feita sem recursos, sem nada. É preciso investimento no sistema porque estamos no limite máximo. Aliás, eu acho que já passamos do limite", alertou.