Senado convoca ministros para explicar edital de Medicina da UFPE para assentados da reforma agrária

Além da presença dos ministros na Comissão de Fiscalização e Controle, também foi aprovado um convite para reitor da UFPE, Alfredo Macedo Gomes

Por Mirella Araújo Publicado em 09/10/2025 às 15:25 | Atualizado em 09/10/2025 às 15:28

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Os ministros da Educação, Camilo Santana, e do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, foram convocados pelo Senado para prestar esclarecimentos sobre os critérios do edital para o processo seletivo do curso de Medicina do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), ofertado pelo campus Caruaru da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

O requerimento, de autoria do presidente da Comissão de Fiscalização e Controle (CTF), o senador Dr. Hiran (PP-RR), foi aprovado nesta quarta-feira (8). Além da presença dos ministros, também foi aprovado um convite para o reitor UFPE, Alfredo Macedo Gomes.

"Um curso de Medicina com viés absolutamente ideológico, o que nos causa uma perplexidade extrema. A classe médica se assustou, e eu, como presidente da Frente Parlamentar da Medicina, fiquei extremamente preocupado. Vamos abrir um precedente muito perigoso. Eu nunca vi isso. Isso é uma novidade muito ruim para a formação do médico", afirmou Dr. Hiran, segundo informações da Agência Senado.

A iniciativa vem sendo alvo de críticas de políticos, como o deputado federal e ex-ministro da Educação Mendonça Filho (União Brasil), e entidades médicas, como o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), a Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe), Associação Médica de Pernambuco (AMPE) e Academia Pernambucana de Medicina (APM).

Entenda os critérios do edital e as disputas judiciais

O edital para o curso de Medicina é fruto de uma parceria entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a UFPE. Foram abertas 80 vagas: 40 para ampla concorrência e outras 40 destinadas a candidatos que se enquadram nas modalidades de ações afirmativas (cotas).

Segundo o edital, cujas inscrições se encerraram no dia 20 de setembro, podiam se candidatar assentados da reforma agrária e integrantes de famílias beneficiárias do Crédito Fundiário; educandos egressos de cursos promovidos pelo Incra; educadores que atuam junto às famílias beneficiárias; acampados cadastrados pelo instituto; e pessoas quilombolas.

Para participar da seleção, os candidatos devem ter concluído o Ensino Médio antes da inscrição e apresentar a documentação exigida que comprove o vínculo com o Pronera.

O processo de avaliação é dividido em duas etapas eliminatórias. Na primeira, a comissão do Incra analisa os documentos enviados para verificar se o candidato pertence ao público-alvo do programa. A ausência de comprovação ou o envio de documentos falsos resulta na eliminação imediata.

Na segunda etapa, de caráter eliminatório e classificatório, os candidatos passam por duas avaliações com pesos diferentes. A primeira é uma prova presencial de redação em Língua Portuguesa, com peso 6, em formato dissertativo-argumentativo e nota mínima de 5,0, conforme os critérios da Portaria MEC nº 391/2000.

A segunda é a análise do histórico escolar do Ensino Médio, com peso 4, considerando as notas de Língua Portuguesa, Biologia e Química dos três anos, cuja média aritmética simples é multiplicada pelo peso para compor a pontuação final. Segundo a UFPE, esse modelo de avaliação já é utilizado em outros vestibulares destinados a públicos específicos, como o Vestibular Quilombola e o Intercultural Indígena.

A UFPE também deixou claro que a proposta de criação de uma turma extra de graduação em Medicina seria ofertada através de vagas supranumerárias, tendo sido aprovada pelo Conselho Superior da UFPE, por meio da Resolução nº 1, de 29 de julho de 2025.

No entanto, no dia 1º de outubro, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) decidiu suspender o edital, atendendo a uma ação popular do vereador do Recife e médico Tadeu Calheiros (MDB). Já nesta segunda-feira (6), a Justiça Federal derrubou a liminar, autorizando novamente que o edital prosseguisse.

Acontece que uma nova decisão, divulgada no dia seguinte, voltou a suspender o processo seletivo do curso de Medicina ofertado pelo Pronera. A nova liminar foi proferida pela 9ª Vara da Justiça Federal de Pernambuco, após ação movida pelo vereador do Recife Thiago Medina (PL).

Guga Matos/JC Imagem
Reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Alfredo Gomes - Guga Matos/JC Imagem

UFPE ainda irá se pronunciar sobre nova decisão da Justiça

A coluna Enem e Educação entrou em contato com a UFPE e solicitou esclarecimentos sobre a nova decisão judicial. Por meio da Assessoria de Comunicação (Ascom), a universidade informou que a Procuradoria Federal está acompanhando os processos relacionados ao caso e que uma manifestação oficial será divulgada ainda nesta quinta-feira (9).

Em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, no dia 25 de setembro, o reitor da UFPE reiterou que as vagas do Pronera não são exclusivas para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), mas sim destinadas a um grupo mais amplo de assentados e acampados reconhecidos pelo Incra, além de quilombolas.

"Ele [o Pronera] oferece cursos em todas as instituições de ensino superior que se candidatam a essa parceria. Hoje temos 27 cursos de graduação dentro do Pronera, nas cinco regiões do país, desde Engenharia Sanitária, Pedagogia, Veterinária, Zootecnia, Agronomia, entre outras áreas credenciadas que ofertam essa iniciativa", afirmou Gomes.

Ainda durante a entrevista, o reitor criticou a propagação de desinformações em torno das pautas das universidades, especialmente sobre os serviços prestados à população.

"Outras universidades também ofertam. Mas, como se trata de Medicina, que é um curso que mexe com instituições poderosas na sociedade, surge essa polêmica", observou.

"Nesse caso específico, a gente está falando de um programa que já tem 27 anos, certo? Um programa que vem formando muita gente no Brasil ao longo desse tempo. Mas os cursos oferecidos sempre foram voltados para áreas historicamente menos privilegiadas do ponto de vista das classes sociais e também dos grupos profissionais que têm interesse direto", explicou.

A coluna Enem e Educação também solicitou um posicionamento do Ministério da Educação (MEC), que informou apenas que "as universidades federais, nos termos do Artigo 207 da Constituição Federal de 1988, têm autonomia para decidir suas políticas próprias de acesso".

A pasta acrescentou que isso inclui a celebração de convênios, como nos editais voltados a beneficiários do Pronera, que promove a educação do campo para populações das áreas de reforma agrária e territórios quilombolas.

 

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