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Início do Arco Metropolitano é oportuno, mas trecho de 25,5 km é pouco para desenvolver Pernambuco, alertam especialistas

Obras do trecho Sul do Arco Metropolitano vão começar em Pernambuco. Raquel Lyra assina ordem de serviço nesta sexta-feira (12/12), em Moreno

Por Roberta Soares Publicado em 11/12/2025 às 15:45 | Atualizado em 11/12/2025 às 18:43

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Talvez a obra de infraestrutura mais antiga e esperada na Região Metropolitana do Recife, o Arco Metropolitano vai começar a ser construído nesta sexta-feira (12/12) pelo governo de Pernambuco, sob a gestão da governadora Raquel Lyra (PSD). Obra de infraestrutura viária planejada para reduzir o volume do tráfego de veículos na BR-101 que corta a RMR e, principalmente, melhorar a logística entre os polos industriais do Estado, uma primeira parte do Arco terá a ordem de serviço assinada pela governadora às 10h30, às margens da BR-232, em Moreno.

A ordem de serviço será para o início das obras do Segmento 2 do Lote 2, que ligará o entroncamento da BR-232, em Moreno, ao entroncamento com a BR-101, no Cabo de Santo Agostinho, no Grande Recife. As obras fazem parte do programa PE na Estrada e representarão um investimento de R$ 632 milhões. O trecho que será implantado tem 25,32 quilômetros e é considerado, assim como todo o Lote 2, o de mais fácil execução por não ter entraves ambientais, como o Lote 1 ou trecho Norte do Arco, que segue com o traçado indefinido porque atravessaria a Área de Proteção Ambiental (APA-Beberibe).

O início das obras do quase lendário Arco Metropolitano é comemorado por todos porque representa o início de um projeto fundamental para a infraestrutura do Estado, sendo a primeira grande obra viária realizada em Pernambuco desde a duplicação da BR-232, ainda em 2006, pelo então governador Jarbas Vasconcelos. Mas ressalvas a uma possível ‘euforia desmedida’ do governo do Estado com a ordem de serviço para o primeiro trecho também têm sido feitas por especialistas.

Maurício Andrade, engenheiro civil e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), além de membro do Comitê Tecnológico Permanente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PE), celebra o começo das obras do trecho Sul, mas alerta para a necessidade de completar todo o corredor rodoviário, essencial para a economia e o redesenho logístico da Região Metropolitana do Recife.

“O início das obras de um trecho do Arco Metropolitano concretiza uma expectativa que se arrasta há muitos anos, sendo muito importante e oportuno. Mas é preciso ter convicção e consciência de que 25,5 km é pouco. Embora o trecho ligue diretamente Moreno ao Cabo, o que já deve atrair um volume de tráfego direto para o Porto de Suape e facilitar o escoamento na direção Oeste e Norte de Pernambuco, ele não resolve os problemas estruturais de trânsito na capital”, alerta o professor.

Thiago Lucas/ Artes JC
Arco Metropolitano - Thiago Lucas/ Artes JC

O especialista afirma que a construção da primeira parte não resolve problemas de circulação no chamado contorno urbano que a BR-101 faz da RMR, principalmente em relação ao transporte público. “É o caso de gargalos como o tráfego que corta o centro comercial de Abreu e Lima e a travessia do Recife. Essa primeira parte não vai permitir, por exemplo, a liberação da BR-101 para o transporte público. Os ônibus e caminhões permanecerão travados”, afirma.

Maurício Andrade destaca, ainda, que a conclusão total do projeto é fundamental e seria uma oportunidade para um novo redesenho econômico da Região Metropolitana do Recife, promovendo um reposicionamento de áreas de logística e industriais. “Para isso, é crucial que os governos de Pernambuco e Federal encontrem meios de financiar a obra completa, inclusive com a participação privada por meio de Parcerias Público-Privadas (PPPs)”, ressalta.

É PRECISO ENFRENTAR O DESAFIO AMBIENTAL DO SEGMENTO NORTE

BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
O Arco Metropolitano é uma obra de infraestrutura viária planejada para reduzir o volume do tráfego de veículos na BR-101 que corta a RMR e, principalmente, melhorar a logística entre os polos industriais do Estado - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

O professor também adverte que o governo de Pernambuco precisa ampliar urgentemente a discussão sobre o segmento Norte do Arco Metropolitano, que tem sido negligenciado. O projeto inicial para o Norte apresenta um grande desafio: a necessidade de passar pela Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia-Beberibe.

Estudos internos na universidade têm sido realizados para avaliar as alternativas. Uma das possibilidades é contornar a APA, o que, no entanto, aumentaria em 25 km o trajeto e, consequentemente, elevaria os custos. Outra alternativa seria passar pela APA, mas com cuidados ambientais importantes - o que deverá ser a opção adotada pelo Estado.

O acréscimo de 25 km no trajeto, necessário para contornar a área protegida, poderia diminuir a atratividade da via, levando caminhões e veículos a continuarem utilizando a BR-101 que passa pelo Recife. Além disso, o aumento da distância percorrida implica também no aumento de emissões. “A decisão final deve colocar na balança a questão ambiental, a questão econômica, e considerar os impactos da poluição, seja na área urbana já saturada ou em uma área rural potencialmente impactada”, explica.

CRÍTICAS AO INÍCIO DAS OBRAS NO TRECHO SUL

A decisão da governadora Raquel Lyra de autorizar o início das obras do segundo segmento (trecho Sul) do Arco Metropolitano é vista como uma forçação de barra para tentar viabilizar o trecho Norte do corredor, segundo Stênio Cuentro, engenheiro civil e presidente da Associação Brasileira de Engenheiros Civis (Abenc).

Segundo Cuentro, o governo optou por começar pela parte mais fácil, que já possui recursos, estudo de impacto ambiental (EIA), traçado definido e está em uma área usada majoritariamente para plantação de cana de açúcar. Contudo, o grande problema do projeto reside na proposta de agressão à APA Aldeia Beberibe e à população que reside ali.

O engenheiro enfatiza que o que está em discussão não é apenas uma rodovia, mas sim o futuro da RMR. “A APA Aldeia Beberibe é considerada o maior recurso da RMR, pois corresponde a 31 mil campos de futebol, onde é produzida boa parte da água da região, além de realizar a regulação do clima, da fauna, da flora e da temperatura”, lembra.

O SENTIDO DE INTEGRALIDADE DO PROJETO ORIGINAL

JAILTON JR./JC IMAGEM
O professor adverte que o governo de Pernambuco precisa ampliar urgentemente a discussão sobre o segmento Norte do Arco Metropolitano, que tem sido negligenciado. O projeto inicial para o Norte apresenta um grande desafio: a necessidade de passar pela Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia-Beberibe - JAILTON JR./JC IMAGEM

A concepção inicial do Arco Metropolitano previa uma ligação que começaria na BR-101 Norte, na altura de Igarassu, cruzaria a APA Aldeia Beberibe (com três traçados estudados) e se encontraria com a BR-408, perto de Carpina e São Lourenço da Mata (o chamado trecho Norte). O segundo trecho, que agora receberá a ordem de serviço, ligaria a BR-408 ao Porto de Suape.

Para quem não lembra, a proposta do Arco Viário Metropolitano nasceu como um compromisso do governo do Estado com a Fiat na época de sua instalação, porque a empresa precisava evitar a perda de tempo e dinheiro ao passar por Abreu e Lima. “Entretanto, como o Arco ou mesmo o miniarco prometido não foram viabilizados, a Fiat tomou suas próprias decisões e mudou seu esquema de frota, que hoje opera das 20h às 6h da manhã, quando a BR-101 Norte está livre, para retirar aproximadamente mil carros por dia”, explica o engenheiro.

Cuentro ainda alerta que o Arco Metropolitano só tem sentido na sua integralidade, ligando a BR-101 Norte à BR-101 Sul. “O trecho Sul isolado funcionará apenas como um estímulo para desviar parte do tráfego que vem do interior do Estado (Limoeiro, Carpina, Tracunhaém) para Suape, evitando a área da Arena Pernambuco. De forma similar, quem sai de Suape em direção ao Sul evitará o trecho de Prazeres, conectando-se à BR-408.

ALTERNATIVAS E IMPACTOS AMBIENTAIS

Para evitar a complicação e a devastação na APA Aldeia, a ABENC sugere um conjunto de soluções. A primeira alternativa é a ampliação e mudança de classe da rodovia estadual PE-41, que liga Igarassu à BR-408. Atualmente uma rodovia classe 5, ela poderia se tornar classe 3 (velocidade diretriz de 60 km/h, com terceira faixa). Essa melhoria custaria R$ 60 milhões, o que representa um investimento 25 vezes menor do que o valor previsto para o trecho Norte (R$ 1,6 bilhão, segundo a comparação). Além disso, evitaria cruzar por dentro de Araçoiaba.

A segunda solução indicada pela Abenc envolve o gerenciamento do uso da BR-101, impondo restrições de horário para o tráfego pesado de passagem. “Caminhões e carretas de grande porte circulariam apenas durante a noite (após as 20h), uma prática que já ocorre em serviços essenciais, como a coleta de lixo no Recife, e em rodovias de outros estados, como Santa Catarina, para gerenciar problemas de tráfego. A restrição visa especificamente o tráfego que passa pelo Recife porque o traçado da BR-101 o obriga a cruzar a cidade”, sugere Stênio Cuentro.

O engenheiro insiste que, caso o Arco Metropolitano seja construído dentro da APA Aldeia Beberibe, os impactos seriam imensos. “Uma rodovia classe zero, como o Arco, exige uma faixa de rolamento de 100 metros, resultando no desmatamento de uma área de 100 metros de largura por 30 quilômetros de extensão. Os impactos não param na construção: empresas de logística se instalariam ao longo da rodovia, comprando terrenos ao redor e avançando no desmatamento e na devastação da APA Aldeia-Beberibe.

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