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Mobilidade urbana: Brasil precisa de R$ 500 bilhões para reverter crise e transformar transporte público no País

Se a rede futura for implementada, o número de pessoas atendidas por esses sistemas de alta e média capacidade pode aumentar em até 501%

Por Roberta Soares Publicado em 10/08/2025 às 13:21 | Atualizado em 10/08/2025 às 16:36

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O Brasil enfrenta um desafio monumental no setor de mobilidade urbana, com a necessidade de investimentos bilionários para modernizar e expandir sua infraestrutura de transporte público coletivo. A segunda parte de um estudo abrangente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) - Estudo Nacional de Mobilidade Urbana (ENMU) - identificou a urgência de destinar até R$ 500 bilhões até 2054 para praticamente dobrar o tamanho do sistema de metrô e quadruplicar a rede de BRT (Bus Rapid Transit) e veículos leves sobre trilhos (VLT) nas próximas décadas.

O plano faz parte de um mapeamento construído em parceria com o Ministério das Cidades que mapeou 194 projetos de transporte público de média e alta capacidade nas principais regiões metropolitanas do País. Dois desses projetos, entretanto, não foram considerados viáveis, fechando o pacote em 192 iniciativas - todas, vale ressaltar, com viabilidade para concessões públicas.

Atualmente, a rede base de metrô no Brasil, incluindo o que já está construído e em fase de implementação, totaliza 376 km. O plano do BNDES prevê um acréscimo de 323 km. Já a rede combinada de BRT, VLT ou monotrilho, que hoje soma 631 km, passaria para expressivos 2,5 mil km. A ideia é que todas as grandes cidades venham a ter sistemas de BRT e metrô se complementando, bem integrados, aproveitando as vantagens de cada sistema.

ESTUDO BUSCOU PROJETOS EM 21 REGIÕES METROPOLITANAS

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Foco do estudo é o transporte público coletivo de média e alta capacidade para tentar tirar as pessoas dos automóveis e motos - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

O mapeamento do BNDES buscou projetos em 21 regiões metropolitanas com pelo menos 1 milhão de habitantes - A Região Metropolitana do Recife entre elas. Embora a lista completa ainda não tenha sido divulgada, o BNDES espera fazê-lo em alguns meses. No entanto, já foram analisadas obras como a expansão da Linha 4 do Metrô no Rio de Janeiro (ligando Jardim Oceânico ao Alvorada) e a criação da Linha 3 (do centro de Niterói a São Gonçalo).

Em São Paulo, a primeira filtragem incluiu o crescimento da Linha Verde (de Cerro Corá até Vila Madalena) e a construção da Linha Ônix (entre São Bernardo do Campo e Bonsucesso). Além disso, São Paulo prevê uma ampliação de 96 km em sua malha de trens, somando-se aos 308 km existentes. Os corredores de ônibus também devem crescer de 326 km para 483 km em três décadas.

Se a rede futura for efetivamente implementada, juntamente com incentivos como integração de modais e tarifa única ou reduzida, o número de pessoas atendidas por esses sistemas de alta e média capacidade pode aumentar em até 501%. Em evento do jornal O Globo, o Ministro das Cidades, Jader Barbalho Filho, salientou o compromisso de seu governo em investir R$ 42 bilhões na área em quatro anos, destacando a necessidade de perenidade nas ações.

A pandemia de COVID-19 agravou a crise que o setor de transporte já vivenciava, com a demanda chegando a cair até 80% no pico de março de 2020. Mesmo até meados de 2023, o volume de usuários ainda estava, em média, 15% abaixo do patamar pré-pandemia, indicando uma demanda perdida que migrou para outros modos, como carro próprio, moto ou aplicativos. A exceção notável é o BRT do Rio de Janeiro, que demonstrou recuperação devido a grandes investimentos em sua requalificação.

CAPACIDADE DE EXPANSÃO DA REDES DE METRÔ, VLTs E BRTs É DE 2,5 MIL KM

GUGA MATOS/JC IMAGEM
Foco do estudo é o transporte público coletivo de média e alta capacidade, como as redes de metrô - GUGA MATOS/JC IMAGEM

Nacionalmente, o estudo do BNDES e do Ministério das Cidades aponta que o Brasil teria capacidade para ampliar significativamente a rede de transporte público de média e alta capacidade. Somadas, as 21 maiores regiões metropolitanas (RMs) do País têm potencial para expandir em 2,5 mil quilômetros as redes de metrôs, trens, Veículos Leves sobre Trilhos (VLTs), Bus Rapid Transit (BRT) e corredores exclusivos de ônibus. As chamadas Redes Futuras de transporte teriam uma perspectiva para serem implantadas até 2054.

O estudo prevê mais 323 km de linhas de metrô, 96 km de trens urbanos, 1.930 km de sistemas de BRT, VLT ou monotrilho, e 157 km de corredores de ônibus. Atualmente, as 21 regiões metropolitanas pesquisadas, distribuídas nas cinco regiões do País, têm 2.007 km de rede de transporte público nesses modais.

São elas: Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Santos, Campinas, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Goiânia, Distrito Federal, Salvador, Maceió, Recife, João Pessoa, Natal, Teresina, São Luís, Fortaleza, Belém e Manaus.

Segundo o BNDES, nesta etapa foram avaliados 400 planos e projetos identificados no Boletim Informativo nº 3, divulgado em março deste ano. Do total, quase 200 projetos com foco em sistemas de média e alta capacidade têm demanda suficiente e serão capazes de ampliar o acesso da população nos próximos 30 anos.

“Estamos fortalecendo o planejamento urbano com base em dados concretos, que nos permitem identificar prioridades e orientar ações de médio e longo prazo. Nosso foco, com a mobilidade urbana, é tornar o transporte coletivo mais eficiente, dinâmico e sustentável, assegurando qualidade de vida à população. Reduzir o tempo de deslocamento, com conforto e segurança, transforma a forma como as pessoas vivem, acessam oportunidades e se relacionam com as cidades”, afirmou o ministro das Cidades, Jader Filho, na época da divulgação da segunda parte deste estudo, em julho.

DECISÃO POLÍTICA ANTES DE MAIS NADA

FELIPE RIBEIRO/ACERVO JC IMAGEM
O plano faz parte de um mapeamento de 194 projetos de transporte público de média e alta capacidade nas principais regiões metropolitanas do País - FELIPE RIBEIRO/ACERVO JC IMAGEM

O estudo aponta que, em todas as regiões metropolitanas, as simulações sugerem que as políticas públicas são necessárias para elevar a utilização do transporte público coletivo. Em determinadas localidades, as medidas seriam determinantes, pois não bastaria o aumento da extensão da rede de transporte de massa para reverter a tendência de queda no uso dos sistemas em todo o País.

Manter a participação do transporte público coletivo nos deslocamentos urbanos, aliás, é um grande desafio. O estudo aponta que essa queda foi verificada na maioria das RMs. A redução média é de 20%, mas em algumas RMs chega a 60%.


Destaca, ainda, que esse comportamento ocorreu também em cidades como Cidade do México (México), Santiago (Chile), Nova York (EUA) e Londres (Inglaterra). E que, como já se sabe, as principais causas são o crescimento da motorização individual, tarifas elevadas, baixa qualidade do serviço público, expansão urbana dispersa, concorrência com aplicativos de transporte, a pandemia da Covid-19 e as mudanças de comportamento da população.

Diante desse cenário, o estudo destaca que os projetos e propostas do ENMU visam preservar ou aumentar a participação do transporte público coletivo com uma mobilidade urbana mais eficiente. “Com a Rede Futura, espera-se a redução do tempo de deslocamento das pessoas, dos congestionamentos, do número de sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se define, segundo o CTB e a ABNT), das emissões de poluentes e GEE, bem como de uma melhor utilização do espaço público”, consta no estudo.

Com a implantação das Redes Futuras propostas pelo ENMU, mais de 80% das RMs atingiriam PNTs acima de 30%, sendo que as RMs da Baixada Santista (SP), Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP) atingiriam PNTs acima de 40%.

“Com a ampliação da cobertura do transporte público de massa, haveria um impacto social progressivo. 76% das RMs teriam incrementos de PNT mais elevados em segmentos menos favorecidos da população, com destaque para Campinas (SP), Goiânia (GO), Recife (PE), e Rio de Janeiro (RJ)”, reforça o estudo.

PRÓXIMAS ETAPAS DO ESTUDO DE MOBILIDADE

Entre junho e agosto, o foco do ENMU será a elaboração do Banco de Projetos, com o detalhamento dos quase 200 projetos de transporte público de média e alta capacidade que compõem as Redes Futuras. Essa etapa será divulgada no Boletim Informativo nº 5 e incluirá as estimativas de investimentos, custos, receitas, benefícios e as avaliações econômicas e financeiras preliminares.

Esse conjunto de informações contribuirá para o planejamento de médio e longo prazo dos entes públicos, permitindo uma análise estratégica para priorização dos investimentos em cada localidade.

Confira o Boletim Informativo nº 4, com os resultados parciais do ENMU, no endereço www.bndes.gov.br/enmu.

 

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