Inteligência Artificial e o futuro da educação: especialistas discutem impactos e caminhos no Rec’n’Play
Com o tema "O Futuro Feito por Gente", o REC’n’Play 2025 vai até sábado (18), com 700 atividades em tecnologia, negócios, cidades e economia criativa

Clique aqui e escute a matéria
O novo Plano Nacional de Educação (PNE), cujo relatório foi apresentado na última terça-feira (17) e segue em discussão na Câmara dos Deputados, traz em seu sétimo objetivo a meta de garantir conectividade, educação digital e a integração das tecnologias digitais de informação e comunicação na educação.
Mas, afinal, qual é o impacto da Inteligência Artificial (IA) na construção dessas transformações — e no futuro das salas de aula?
Para o professor Luciano Meira, um dos principais nomes da inovação educacional no país, o objetivo é importante, mas esbarra na falta de implementação concreta.
"Esse objetivo retoma as orientações da BNCC da Computação de 2023, sobre as quais ainda nada foi feito. Mas, para realmente criarmos o que eles chamam de 'cultura digital' — e que eu chamaria de uma cultura de transformação digital no espaço escolar —, e isso é possível de ser feito, nós temos recursos, mas temos pouca governança, afirmou Meira, que é professor associado de Psicologia da UFPE, professor colaborador da Cesar School e do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da Universidade Estadual de Campinas, além de head de Pedagogia da Proz Educação.
Durante a mesa-redonda realizada nesta quinta-feira (16), dentro da programação do Rec’n’Play 2025 — evento de tecnologia, criatividade e inovação sediado no Recife —, Luciano Meira e Silvio Meira, fundador e cientista-chefe da TDS Company, abordaram os desafios e oportunidades trazidos pela IA generativa na educação.
Para eles, a IA não deve ser vista como uma simples ferramenta incremental, mas como um ponto de ruptura em um sistema que já se encontra em crise crônica.
Ruputra sistêmica da educação
Em um artigo publicado recentemente, os Meira propõem quatro eixos estratégicos e acionáveis para que os sistemas educacionais, especialmente no contexto brasileiro, possam lidar com a IA não como uma ameaça paralisante, mas como uma alavanca histórica para uma reinvenção sistêmica da educação.
Segundo Silvio Meira, ao se falar em transformação digital na educação, muitas vezes se esquece que o "digital" não é apenas uma ferramenta, mas parte de toda a plataforma de aprendizagem — assim como o letramento é.
"Não adianta nada eu fazer física analógica, matemática analógica, e aí ter uma formação 'digital' que vai contrariar o que o meu professor de matemática ou de ciências está dizendo, porque ele não faz parte do processo", afirmou Silvio.
Ele também relembrou o lançamento de um manifesto por ocasião da fundação do Porto Digital, que falava sobre a cultural digital popular. "Não queríamos pegar a cultura popular e digitalizar. Existe uma nova cultura, ela tem que ser digital e se tornar popular. No sentido de que todo mundo tem que aprender e se instrumentar para aprender a fazer tudo", declarou o cientista.
IA e Aprendizagem
Ao elencar a requalificação docente, a reforma curricular radical, a infraestrutura pública de IA para a educação, além da governança e da ética, também surgiu a necessidade de incluir no debate os ecossistemas de inovação que capturam o valor da inteligência artificial no contexto dos espaços de aprendizagem — ou seja, na escola.
Nesse cenário, é preciso repensar o que significa aprender, conhecer e interagir a partir desse novo sistema educacional. Isso desloca o foco do simples acesso ao conteúdo para a qualidade da interação com o conhecimento.
"IA não é uma ferramenta ou instrumento apenas, pelo menos, que a gente usa para resolver problemas, mas um ambiente imersivo de aprendizagens, cuja dimensão epistêmica é radicalmente transformada pela própria IA. Você pode usar ChatGPT como instrumento, mas IA tem o valor redimensional nos processos de aprendizagem porque trata-se de um ambiente conversacional dialógico, e isso tem implicações bastante profundas na educação", explicou Luciano Meira.
Desafio do papel humano
O fato é que a inteligência artificial já está presente em salas de aula, plataformas digitais e metodologias de ensino. Na roda de conversa "Aprendizagem inteligente? Como a IA transforma a educação", realizada na Arena Educação do Rec'n'Play, Tanci Simões, professora e pesquisadora do CESAR, Vinícios Garcia, professor associado do CIN.UFPE, e Giordano Cabral, professor da UPE, debateram os impactos da IA na educação e seus potenciais para personalizar experiências.
“A gente precisa entender como usar a IA para ensinar, para aprender, e de que forma ela pode me ajudar a fazer melhor o que já faço hoje — ou até fazer de um jeito diferente, porque a IA me possibilita realizar coisas que antes eu não conseguia”, afirmou Tanci Simões.
Entretanto, ainda há diversos desafios relacionas à formação do professores. “Temos que conectar as práticas de ensino às formas como a IA potencializa o que já fazemos bem. Não é usar IA pra fazer algo totalmente novo, mas pra melhorar o que já funciona, pra ter mais produtividade e planejar melhor as aulas”, completou.
Um ponto de alerta, segundo Tanci, é sobre a necessidade de políticas e diretrizes claras nas escolas. “Os alunos ainda não têm maturidade pra lidar com essas ferramentas da mesma forma que os adultos. Então, é responsabilidade da escola garantir políticas e diretrizes de uso da IA — que orientem professores e estudantes para um uso ético, crítico, seguro e responsável”, defendeu.
Uso gradual e responsável da inteligência artificial na educação
O professor Vinícius Garcia reconheceu que mudanças trazem desconfortos e que, portanto, é importante estimular os professores, monitores e demais profissionais envolvidos no processo de ensino-aprendizagem a reconhecerem o que são essas ferramentas e como elas podem ser inseridas em suas práticas pedagógicas.
“É uma ferramenta nova, com extremo potencial, e, como toda ferramenta de grande potencial, a gente precisa ter cuidados. Acho que esse é o momento e o espaço ideal pra discutir e experimentar novas visões de mundo sobre esse tipo de adoção”, afirmou.
Ele lembrou que o uso exagerado da tecnologia já trouxe lições importantes. “A gente já experimentou isso com o celular, com o uso exacerbado de telas. Não é legal, é preciso controlar. E o mesmo vale pras ferramentas de IA. Elas são baseadas em contextos pré-definidos, são treinadas, e o mundo muda mais rápido do que elas conseguem acompanhar. Mas têm usos muito bons”, explicou.
"A ideia é combinar as inteligências — a minha, a sua, a de todos — com a inteligência social e, com a inteligência artificial, ampliar nossas possibilidades, consolidar entendimentos e provocar novas visões que talvez a gente não tivesse visto antes”, concluiu.