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Não há indícios de que Trump tenha tarifado o Brasil por compra de diesel russo

Presidente anunciou taxação de importações brasileiras em retaliação a julgamento do ex-presidente Bolsonaro; EUA também compram combustível de Putin

Por Projeto Comprova Publicado em 25/07/2025 às 19:07

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Um post no Instagram viralizou ao afirmar que o Brasil está financiando a Rússia na guerra contra a Ucrânia ao comprar diesel russo e que “essa é uma das principais razões pelas quais estamos sendo sancionados tão severamente pelos Estados Unidos”.

O vídeo analisado pelo Comprova afirma ainda que “as sanções não virão somente dos Estados Unidos, mas agora virão de todos os países da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte]”.

Mas não é bem assim. O post acerta ao falar sobre os valores que o Brasil gastou ao comprar diesel russo: US$ 95 milhões em 2022, US$ 4,5 bilhões em 2023 e US$ 5,4 bilhões em 2024.

O autor fala do grande salto entre o último ano do governo de Jair Bolsonaro (PL) e os anos de Lula (PT).

O Comprova contatou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e confirmou os números.

No entanto, José Augusto de Castro, presidente-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), destaca que “o fato de o Brasil comprar mais diesel não significa nada em relação à guerra.

“O Brasil pode importar do país A, B ou C, o que são levadas em conta são decisões técnicas, anteriores a esse conflito”, explica.

Maurício F. Bento, professor de economia internacional na Hayek Global College, reforça: “O Brasil importa diesel não porque apoia a Rússia, mas porque que precisa de diesel e o país mantém preços bastante competitivos e favoráveis. Esse relacionamento existe porque é algo positivo para o próprio Brasil”.

De acordo com ele, como muitos países romperam com a Rússia por conta da guerra, o país continuou tendo que vender seus produtos e, assim, acabou baixando os preços, o que fez com que o Brasil fizesse importação recorde mencionada no post.

Se o que o autor do post diz fosse verdade, então seria correto afirmar que os Estados Unidos também financiam a Rússia, uma vez que, em 2024, eles importaram US$ 3,3 bilhões do país de Vladimir Putin.

Ou que o Brasil financia a Ucrânia, tendo em vista que, em 2024, importou US$ 55,6 milhões daquele país.

O governo norte-americano anunciou que pode aplicar tarifas sobre países que fazem comércio com o mercado russo, como o Brasil.

A medida foi anunciada após fracassarem as tratativas de um cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia, em julho.

Mas há outra sanção anunciada pelo presidente Donald Trump contra o Brasil que nada tem a ver com a Rússia: tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros por conta, segundo Trump, de uma “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro (PL) e um suposto déficit dos Estados Unidos nas relações comerciais com o Brasil, como mostrou o Comprova.

Trump não fez nenhuma conexão entre a aplicação das tarifas e a compra de diesel russo pelo país.

O autor do post fala em possíveis sanções da OTAN contra o Brasil, referindo-se a uma declaração do secretário-geral da instituição, Mark Rutte.

Em 15 de julho, ele afirmou que Brasil, China e Índia podem ser punidos por importar produtos da Rússia. Mas ele se referia às sanções mencionadas por Trump, não a uma medida da OTAN.

“Se a Rússia não levar a sério as negociações de paz, em 50 dias ele (Trump) aplicará sanções secundárias a países como Índia, China e Brasil. Meu incentivo para esses três países em particular é que você pode querer dar uma olhada nisso, porque pode te atingir muito forte”, declarou Rutte.

A declaração foi divulgada um dia depois do anúncio de Trump sobre novas sanções.

O republicano, no entanto, não detalha o que seriam essas tarifas secundárias e quem seria afetado.

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, rebateu as declarações de Rutte. “Não faz sentido discutir questões comerciais com um funcionário de uma aliança militar da qual sequer participamos”, declarou.

Segundo o chanceler, o debate sobre relações com a Rússia é pauta para debates bilaterais e na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Maurício F. Bento, entrevistado pelo Comprova, disse que, “se o Brasil simplesmente rompesse com a Rússia (para agradar a OTAN), seria o Brasil adotando os interesses de outro país”.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O vídeo foi postado por um perfil com mais de 2,6 milhões de seguidores.

Na descrição, o autor se diz “cientista da mente inconsciente, formador de líderes do novo tempo e cristão com missão de forjar Inquebráveis”.

A página apresenta vídeos sobre temas de repercussão, com ênfase em política e religião.

Nas postagens, o autor costuma fazer críticas ao governo Lula e ao ministro Alexandre de Moraes, além de demonstrar apoio a Trump.

Ele aparece com boné com a inscrição da campanha do republicano, “Make America great again”.

O post verificado aqui foi visualizado mais de 1,1 milhão de vezes até a publicação deste texto.

Por que as pessoas podem ter acreditado?

O post é em formato de vídeo, mas, logo na legenda, o autor escreve: “Eu tenho pra onde ir quando tudo “explodir” mas e o povo que não tem?”.

Mensagens alarmantes costumam ser usadas por desinformadores para prender a atenção dos internautas.

Ao sugerir que o Brasil estaria acabando como nação, o autor gera sentimentos como nervosismo e ansiedade no espectador, fazendo com que ele não pare para refletir no assunto abordado.

O vídeo inicia com a frase “se for inteligente, assista até o final” escrita sobre a imagem, o que atiça o internauta, levando-o a acreditar no conteúdo, uma vez que supostamente foi publicado por uma pessoa inteligente.

Fontes que consultamos

Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, reportagens sobre o tema e entrevistas com José Augusto de Castro, da AEB, Maurício F. Bento, da Hayek Global College.

Por que o Comprova investigou essa publicação?

O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento.

Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema

O Comprova já explicou a sanção imposta pelos Estados Unidos ao Brasil e a sobretaxa estudada pelo país norte-americano para países que compram produtos da Rússia.

A checagem foi publicada em 25 de julho de 2025 pelo Comprova — coalizão formada por 42 veículos de comunicação que verifica conteúdos virais.

A investigação foi conduzida pela Folha de S. Paulo e Correio Braziliense, e o conteúdo também passou por verificação de Jornal do Commercio, Estadão, Correio de Carajás e NSC Comunicação.

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