"Mato mil leões por dia": mulher com tetraplegia e câncer de mama lança vaquinha para continuar tratamento

Entre a luta contra o câncer de mama e os desafios da tetraplegia, Yoko mobiliza forças, amigos e fé para seguir em frente e pede apoio em vaquinha

Por Maria Clara Trajano Publicado em 27/08/2025 às 18:37 | Atualizado em 27/08/2025 às 18:45

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Yoko Farias Sugimoto, 41 anos, aprendeu cedo que a vida pode mudar em um piscar de olhos. Ainda adolescente, ela viveu a perda da mãe em consequência do câncer. Aos 20 anos, viu seus planos de concluir o curso de relações públicas interrompidos por um acidente em uma cama elástica.

Durante um trabalho temporário em um parque de recreação, uma colega caiu sobre o seu pescoço, o que causou tetraplegia - condição em que há perda dos movimentos do tronco, pernas e braços. "Eu já não mexia mais nada do pescoço para baixo", relembra.

O choque foi imenso, mas a jovem não enfrentou sozinha esse recomeço doloroso. A avó, que já havia cuidado da filha com câncer, tornou-se o pilar da neta. "A minha força vem muito dela, sabe? A força de vó. Ela me dizia: 'Você vai recuperar'. Hoje, carrego essa esperança comigo."

Essas forças vêm, em grande parte, da fé, dos amigos e da lembrança desse apoio incondicional. Com o tempo, Yoko precisou se redescobrir, enfrentar a depressão pós-acidente e encontrar novos caminhos. Formou-se em gestão de eventos e, mais recentemente, em análise e desenvolvimento de sistemas.

Agora, duas décadas depois, enfrenta uma nova batalha: o diagnóstico de câncer de mama. "Eu fiquei completamente sem chão. Não é um diagnóstico que a gente espera. Passei dias chorando, sem acreditar", conta. O exame que revelou o nódulo foi feito justamente no dia do seu aniversário, em março deste ano.

Para continuar o tratamento oncológico e renovar as cadeiras de rodas (uma manual e outra motorizada, já desgastadas pelo tempo), Yoko abriu uma vaquinha online. O valor arrecadado vai ajudá-la não apenas com as despesas médicas, mas também a manter sua autonomia diante de tantas barreiras impostas pela falta de acessibilidade.

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Yoko e amigas, que têm sido pilar fundamental no tratamento contra o câncer - Cortesia

Câncer de mama: diagnóstico e tratamento

O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no Brasil e no mundo. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), a estimativa é de mais de 73 mil novos casos por ano no País em 2025.

Os principais fatores de risco incluem idade acima de 40 anos, histórico familiar, obesidade, consumo de álcool e exposição a hormônios. No entanto, qualquer mulher - e até mesmo homens, embora em casos raros - pode desenvolver a doença.

Entre os sinais de alerta estão:

  • Presença de nódulo endurecido na mama ou axila;
  • Alterações na pele da mama, como retrações e vermelhidão;
  • Secreção anormal nos mamilos;
  • Mudanças no formato ou tamanho da mama.

A detecção precoce é decisiva para o sucesso do tratamento. Por isso, a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) recomenda que mulheres realizem mamografia regularmente a partir dos 40 anos, além de consultas anuais com ginecologista ou mastologista.

Yoko reforça a importância do diagnóstico precoce. "No ano passado, eu fiz mamografia e não tinha acusado nada. Este ano, veio o diagnóstico. Então, é fundamental não deixar de fazer os exames."

De acordo com o oncologista Daniel Gimenes, o tratamento varia de acordo com o estágio do tumor e suas características, além de depender também das condições da paciente, fatores como idade, comorbidades e status menopausal.

"O prognóstico do câncer de mama também depende desses fatores. Quando a doença é diagnosticada no início, as chances de cura são elevadas acima de 90% com o tratamento. No entanto, quando há evidências de metástases, todos os procedimentos passam a ter como objetivo principal o prolongamento da sobrevida e melhora da qualidade de vida da paciente", explica.

Ainda de acordo com o oncologista, o acesso à informação de qualidade é um grande aliado no combate à doença.

"O diagnóstico não é o fim, mas sim uma continuidade, que não deve ser encarada com medo. Por isso, é importante fazer exames e manter a rotina das consultas médicas independente da idade. Deve-se confiar no médico, compartilhar seus anseios e não acreditar em tudo que lê na internet, tomando cuidado principalmente com as fake news sobre a doença", finaliza.

Mamografia e exames para rastreamento e diagnóstico do câncer de mama

"Acessibilidade ainda é um desafio"

Se o tratamento contra o câncer já é difícil, para Yoko ele se soma às barreiras diárias impostas pela falta de acessibilidade. "Muitas clínicas não têm macas adaptadas. Eu preciso de ajuda para subir, e nem sempre isso é oferecido. Já em relação ao transporte, muitos motoristas de aplicativo cancelam a corrida quando veem a cadeira de rodas."

A cadeira motorizada que utiliza atualmente tem mais de 15 anos e não dobra para entrar em carros convencionais. Por isso, ela depende de alternativas caras ou de muita paciência diante de recusas. "Já ouvi que a cadeira não podia ir porque ia sujar o carro. É muito doloroso ouvir isso."

Apesar das dificuldades, Yoko segue firme. Concluiu recentemente sua segunda graduação e sonha com estabilidade no trabalho. "O custo de vida de uma pessoa com tetraplegia é muito alto. Meu desejo é ter condições de manter minhas despesas sem depender tanto de rifas e bingos."

Resiliência e esperança

Ao relembrar sua trajetória, Yoko se emociona: "O que me dá orgulho é a minha resiliência, acreditar que tudo é possível. Eu não deixei de sonhar, mesmo com as dificuldades."

A mensagem que deixa para quem também enfrenta doenças ou limitações é direta: "A gente nunca pode desistir dos nossos sonhos. Por mais que a vida seja dura e difícil, a gente mata mil leões por dia. Ter uma deficiência ou passar por um problema de saúde é custoso, mas é preciso enfrentar com todas as nossas forças."

Hoje, sem mãe, pai ou irmãos próximos, ela encontra apoio em amigos e em uma rede de solidariedade que ajuda a custear o plano de saúde e o serviço de home care. A vaquinha atual é mais um passo nessa corrente.

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