Infecções respiratórias podem reativar células cancerígenas adormecidas nos pulmões, revela estudo

Publicado na revista Nature, estudo mostra que vírus respiratórios despertam células de câncer de mama inativas nos pulmões

Por Maria Clara Trajano Publicado em 05/08/2025 às 16:14

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Para quem passou por um tratamento oncológico e entrou em remissão, o alívio vem acompanhado de uma esperança: que a doença não retorne. Mas uma nova pesquisa publicada na revista científica Nature traz um alerta importante.

Cientistas descobriram, em experimentos com camundongos, que infecções respiratórias como gripe e covid-19 podem “acordar” células cancerígenas adormecidas nos pulmões, levando ao aparecimento de metástases.

Essa reativação, segundo o estudo, ocorre poucos dias após a infecção e pode levar a uma expansão agressiva de tumores em até duas semanas. Dados de humanos, analisados a partir de bancos de dados do Reino Unido e dos Estados Unidos, reforçam a conexão entre infecção respiratória e aumento na mortalidade por câncer.

Células cancerosas disseminadas

Grande parte das mortes por câncer de mama ocorre devido à metástase — quando células do tumor se espalham e formam novos focos, especialmente nos pulmões, ossos e fígado. O que chama a atenção é que essas células podem permanecer dormentes por anos, até se reativarem sem aviso.

O novo estudo investigou o que pode despertar essas células chamadas DCCs (do inglês disseminated cancer cells; células cancerosas disseminadas, em português). A resposta surpreendeu: a inflamação causada por vírus respiratórios comuns pode ser o gatilho.

Como o estudo foi feito

A pesquisa foi conduzida principalmente na Universidade do Colorado, com colaboração internacional, e envolveu camundongos geneticamente modificados para simular o comportamento do câncer de mama humano.

Os cientistas infectaram esses animais com versões do vírus da gripe (influenza A) e do SARS-CoV-2 adaptadas para roedores. Em poucos dias, observaram que células de câncer de mama que estavam inativas nos pulmões começaram a se multiplicar rapidamente, formando lesões metastáticas.

Esse "despertar" das células foi associado a uma proteína chamada IL-6, um mediador da inflamação que aumenta em infecções respiratórias. Quando os pesquisadores bloquearam a produção de IL-6 nos animais, as células cancerígenas permaneceram adormecidas, mesmo após a infecção viral.

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Inflamação e supressão imunológica

O estudo mostrou que há dois momentos cruciais: primeiro, a infecção ativa a inflamação e "acorda" as células adormecidas. Depois, com a inflamação diminuindo, o sistema imunológico passa a falhar em combater essas células.

Um dos motivos é que as células CD4+, que normalmente ajudam na resposta imune, acabam suprimindo a ação das células CD8+, responsáveis por destruir células cancerígenas. Esse ambiente permissivo contribui para que os tumores cresçam sem resistência.

Dados em humanos reforçam o alerta

Para saber se o fenômeno também ocorre em pessoas, os cientistas analisaram registros de mais de 4 mil sobreviventes de câncer do banco de dados do Reino Unido (UK Biobank) que testaram positivo para SARS-CoV-2 antes das vacinas estarem disponíveis. O risco de morte por câncer foi quase duas vezes maior entre os infectados do que entre os não infectados.

Nos Estados Unidos, o banco de dados Flatiron Health mostrou que mulheres com câncer de mama que tiveram covid-19 apresentaram risco aumentado de desenvolver metástases nos pulmões. Mesmo após ajustes por idade, comorbidades e tipo de câncer, a tendência permaneceu.

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