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Crise no transporte público: Após anos de queda, transporte público registra sinais de recuperação da demanda de passageiros, mas cenário segue difícil

Dados fazem parte do Anuário NTU 2024-2025, lançado no Seminário Nacional de Transporte Público, em Brasília, que tem cobertura da Coluna Mobilidade

Por Roberta Soares Publicado em 12/08/2025 às 10:30 | Atualizado em 12/08/2025 às 19:03

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Depois de anos e anos acumulando queda de demanda e vivendo o ápice da crise com a pandemia de covid 19, pela primeira vez o setor de transporte público coletivo por ônibus no Brasil demonstra sinais de recuperação. Dados operacionais de 2024 apontam para um aumento na demanda de passageiros, apesar de o cenário do setor seguir difícil e desafiador.

O Anuário NTU 2024-2025, lançado pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) no Seminário Nacional de Transporte Público 2025, revela que o número total de passageiros transportados aumentou 9,8%, enquanto a quantidade de passageiros equivalentes (pagantes) cresceu 4,7%.

Os dados também apontam que a quilometragem produzida – uma medida da oferta de serviços – cresceu 10,3% em 2024. E mais: o documento da NTU destaca também uma revolução silenciosa no financiamento do transporte, impulsionada pelo avanço dos subsídios públicos e da Tarifa Zero - integral ou parcial nos sistemas de ônibus do Brasil.

Nos últimos cinco anos, o número de municípios brasileiros que subsidiam o transporte coletivo mais que dobrou, passando de 120 para 241. Adicionalmente, 154 cidades já adotam a Tarifa Zero, sendo que em 127 delas o benefício é pleno e universal, ou seja, disponível todos os dias da semana para todos os usuários.

DADOS POSITIVOS TÊM RELAÇÃO DIRETA COM OS SUBSÍDIOS PÚBLICOS, APONTA A NTU

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Os dados também apontam que a quilometragem produzida – uma medida da oferta de serviços – cresceu 10,3% em 2024 - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

A NTU enfatiza que esses números comprovam o impacto positivo dos subsídios integrais na reconquista do passageiro. Contudo, a entidade alerta para a urgência da criação de uma política nacional, com diretrizes federais e fontes permanentes de financiamento, para que esse modelo se consolide de forma estruturada e garanta a qualidade do serviço.

Atualmente, os subsídios cobrem, em média, apenas 30% dos custos do sistema no Brasil, um índice significativamente menor que os 50% praticados, em média, em países europeus. A crescente diferença entre passageiros transportados e pagantes (em 2024, apenas 56,7% dos passageiros transportados foram pagantes, contra 72% em 2021) é um reflexo direto da adoção desse modelo de remuneração com aporte de subsídios.

O AVANÇO DOS SUBSÍDIOS E DA TARIFA ZERO

O Anuário 2025-2025 aponta que a expansão dos subsídios e da Tarifa Zero está redefinindo o modelo de financiamento do transporte em muitas cidades brasileiras. A duplicação de municípios que subsidiam o serviço em apenas cinco anos, somada ao crescente número de cidades com Tarifa Zero, aponta para uma mudança substancial na forma de acesso ao transporte pela população.

 

Robson Cesco/Divulgação NTU
Francisco Christovam, presidente executivo da NTU - Robson Cesco/Divulgação NTU

Esse movimento tem sido crucial para a reconquista de usuários, evidenciando o potencial dos subsídios integrais. No entanto, a NTU reforça que, para a sustentabilidade e aprimoramento da qualidade do serviço, é fundamental que o Brasil estabeleça uma política nacional de transporte público com diretrizes claras e fontes de financiamento permanentes. A cobertura de apenas 30% dos custos do sistema por subsídios no Brasil, em contraste com a média de 50% na Europa, sublinha a necessidade de maior investimento e estrutura federal.

DESAFIOS DO SETOR AINDA SÃO GIGANTES, PRINCIPALMENTE NA INFRAESTRUTURA PARA O TRANSPORTE PÚBLICO

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Seminário Nacional de Transporte, que acontece por dois dias, terá a cobertura da Coluna Mobilidade - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Apesar dos avanços na política tarifária e da recuperação operacional, o Anuário NTU 2024-2025 também revela um cenário de estagnação nos investimentos em infraestrutura de mobilidade urbana. Dados compilados desde 2023 mostram uma desaceleração na implantação de faixas exclusivas, corredores e sistemas BRT.

Mesmo com o lançamento do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o número de empreendimentos ativos e operacionalizados permanece abaixo do ideal, comprometendo a qualidade do serviço e a atratividade do ônibus como meio de transporte. Para a NTU, a ausência de infraestrutura dedicada resulta em maior tempo de deslocamento, menos conforto para o passageiro, maior custo e menor eficiência operacional.

FROTA DE ÔNIBUS SEGUE VELHA E REFLETE FALTA DE FINANCIAMENTO

Divulgação
Dados do Anuário do Transporte Público 2025 - Divulgação
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Dados do Anuário do Transporte Público 2025 - Divulgação
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Dados do Anuário do Transporte Público 2025 - Divulgação
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Dados do Anuário do Transporte Público 2025 - Divulgação

Outro ponto de atenção é a idade média da frota, que se manteve em 6 anos e 5 meses. A renovação da frota, embora evite o envelhecimento ainda maior dos veículos, é dificultada pela falta de oferta de crédito com condições adequadas para o setor, que impede a modernização e a transição tecnológica/energética.
Em um aspecto positivo, os principais itens de custos apresentaram estabilidade em 2024: o preço do diesel variou apenas 0,9%, e os salários dos motoristas não registraram aumento significativo, resultando em uma variação negativa de 1,0% no custo por quilômetro.

AINDA À ESPERA DO MARCO LEGAL DO TRANSPORTE PÚBLICO

TIÃO SIQUEIRA/JC IMAGEM
Levantamento aponta que houve uma redução de investimentos em infraestrutura para o transporte público, com destaque para a ampliação da prioridade viária com faixas e corredores exclusivos - TIÃO SIQUEIRA/JC IMAGEM

Em contrapartida aos desafios, 2024 marcou avanços importantes no campo legislativo e fiscal. A aprovação no Senado Federal do Marco Legal do Transporte Público Coletivo, agora encaminhado à Câmara dos Deputados, promete redefinir as bases da regulação do setor, promovendo maior segurança jurídica, melhor governança e novos modelos de contrato.

Além disso, a regulamentação da Reforma Tributária garantiu a isenção do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para o transporte coletivo urbano, metropolitano e semiurbano. Essa isenção representa um significativo alívio financeiro para os operadores e um passo importante na desoneração do serviço para os usuários.

“Os dados do Anuário reforçam a visão da NTU de que o transporte coletivo deve ser consolidado como uma política pública estruturante, integrada às agendas de mobilidade, climática, inclusão e desenvolvimento urbano. Não há mobilidade sustentável sem transporte coletivo forte, acessível e eficiente. Apesar dos avanços recentes, o setor ainda carece de uma estrutura federal permanente que reconheça o transporte público como prioridade nacional”, destaca Francisco Christovam, presidente executivo da NTU.

O Anuário NTU 2024-2025 foi apresentado oficialmente durante o 38º Seminário Nacional NTU – Rotas para um Transporte Público Mais Sustentável, realizado nos dias 12 e 13 de agosto de 2025, em Brasília. O evento é o principal fórum sobre transporte público coletivo e mobilidade urbana no Brasil, reunindo lideranças, especialistas, gestores públicos e representantes da sociedade civil para debater os rumos do setor. E está tendo a cobertura da Coluna Mobilidade.

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