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Câmara aprova urgência para projeto de anistia e abre caminho para votação em plenário

Aprovação, fruto de um acordo com a bancada bolsonarista, acelera a tramitação da proposta; Requerimento foi aprovado com 311 votos a favor contra 163

Por Túlio Feitosa Publicado em 17/09/2025 às 22:43 | Atualizado em 17/09/2025 às 22:50

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*Com Câmara Notíciais

A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta quarta-feira (17), o requerimento de urgência para a tramitação de um projeto de lei que concede anistia a envolvidos em atos de natureza política. A decisão, que acelera o andamento da proposta, abre caminho para que o mérito da anistia seja votado diretamente no plenário, sem precisar passar pelas comissões.

A aprovação da urgência, que contou com 311 votos a favor e 163 contrários - além de sete abstenções -, foi fruto de um acordo costurado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), com a bancada bolsonarista. Em troca, os deputados de oposição teriam concordado em apoiar a aprovação da chamada "PEC da Blindagem", que dificulta a abertura de processos contra parlamentares.

Ao pautar a votação, Motta afirmou que "o Brasil precisa de pacificação" e que caberia ao "Plenário, soberano, decidir" sobre o tema.

Os projetos com urgência podem ser votados diretamente no Plenário, sem passar antes pelas comissões da Câmara.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que um relator será nomeado nesta quinta-feira (18) para apresentar a versão de um texto que encontre apoio da maioria ampla da Casa. Segundo Motta, há visões distintas e interesses divergentes sobre os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 e, portanto, caberá ao Plenário decidir.

Motta explicou que buscará construir com o futuro relator um texto que traga pacificação para o país. "Tenho convicção que a Câmara conseguirá construir essa solução que busque a pacificação nacional, o respeito às instituições, o compromisso com a legalidade e levando em conta também as condições humanitárias das pessoas que estão envolvidas nesse assunto", declarou.

Debate em Plenário

Deputados da oposição e de outros partidos de direita e centro-direita defenderam a aprovação da urgência. Parlamentares de esquerda, base do governo, criticaram a votação.

O líder do Novo, deputado Marcel van Hattem (RS), defendeu a anistia politicamente pela pacificação do país e juridicamente pelo que ele chamou de "correção de injustiças". "Se tivéssemos já votado, não teríamos perdido tantos momentos que pessoas simples perderam no convívio familiar", afirmou.

Para o deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), vice-líder do governo, a proposta de anistia é absurda por incluir o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete altos funcionários do governo anterior entre os beneficiados. "Não existe pacificação com impunidade, com anistia para golpista", disse.

O deputado Gustavo Gayer (PL-GO), vice-líder da oposição, reforçou o tempo passado desde a apresentação do texto até a análise da urgência. "Depois de dois anos de muita luta e sofrimento, finalmente chegamos ao momento que pode marcar a história do país", afirmou.

O líder do PT, deputado Lindbergh Farias (RJ), declarou que os deputados, ao votarem na anistia, estão sendo "cúmplices de um golpe de Estado continuado" que nunca parou de escalar. Ele avaliou a votação como uma traição à democracia. "Hoje é um dia de vergonha do Parlamento, em que ele se abraça à covardia. Está faltando postura e atitude firme", criticou.

Porém, o líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), afirmou que não haverá "faca no pescoço" de Motta para cobrar a votação do mérito da proposta ainda nesta quarta-feira (17). "Vamos tratar desse assunto para fazermos justiça a milhares de pessoas condenadas a 17, 15 ou 14 anos de prisão ou vamos fingir que no Brasil está tudo bem?", questionou.

Para a líder do Psol, deputada Talíria Petrone (RJ), a anistia ao final da ditadura militar (Lei 6.683/79) fez com que alguns das Forças Armadas acreditassem na possibilidade de golpe. "Não podemos aceitar que esses tempos que formaram a nossa história voltem. A responsabilização contundente que chega a Bolsonaro e em militares com quatro estrelas é fundamental para aprofundar nossa democracia", declarou.

O deputado Alencar Santana (PT-SP), vice-líder do governo, disse que é falsa a conversa sobre pacificação do país, porque a maioria do povo é contra o anistia. "Aqueles que derem causa a aprovar a anistia ficarão marcados na história como traidores da pátria", afirmou.

Para o líder do PSB, deputado Pedro Campos (PE), não existe pacificação verdadeira sem justiça ou democracia. "O que vocês estão fazendo aqui envergonha o povo brasileiro, a nossa democracia, todos os que lutaram por uma Constituição cidadã", disse Campos, ao se dirigir aos deputados favoráveis ao texto.

O líder do MDB, deputado Isnaldo Bulhões Jr. (AL), defendeu uma proposta de dosimetria de pena aos condenados pelos atos de 8 de janeiro. "Não é isso que está acontecendo. Estamos apreciando um projeto de lei que trata de anistia para os que atentaram contra a democracia", disse.

Texto ainda será construído

O projeto de anistia que serviu de base para a votação da urgência, de autoria do deputado Marcelo Crivella (PL-RJ), não será o texto final. Ele e outros não tramitam mais junto com o texto aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (PL 2858/22), cuja versão propunha anistia mais ampla.

O texto original do PL 2162/23 diz que a anistia proposta compreende “os crimes com motivação política e/ou eleitoral ou a estes conexos, bem como aqueles definidos no Código Penal”. Esse texto, no entanto, não será o que irá à votação. Articulações de lideranças políticas junto a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) procuram uma saída que não implique anistia ampla, focando mais na redução de penas.

Com a aprovação da urgência, um novo relator será nomeado para construir um "texto substitutivo que encontre o apoio da maioria ampla da casa", segundo Motta. A partir de agora, se inicia uma nova e intensa fase de negociação.

Governo acena com "anistia light"

A construção desse novo texto será o principal foco de disputa. Nos bastidores, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sinalizado que é favorável a uma "anistia light", que poderia reduzir a pena dos condenados pelos ataques de 8 de Janeiro, mas sem estender o benefício ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

A oposição, por sua vez, busca um perdão amplo que anule as investigações e a inelegibilidade de Bolsonaro. Ainda não há previsão para a votação do mérito do novo texto que será elaborado.

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