Noronha completa 82 dias sem administrador geral após atrito entre Raquel Lyra e Alepe
Enquanto oposição represa sabatina de novo administrador geral do arquipélago na Assembleia, governo coloca adjunto para responder pela ilha

A administração do arquipélago de Fernando de Noronha se tornou um problema para o governo Raquel Lyra (PSD) por causa dos desentendimentos que se intensificaram nos últimos meses entre a gestora e a forte oposição atuante na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Neste domingo (20), a ilha completa 82 dias sem administrador definitivo.
A novela teve início no dia 28 de janeiro deste ano, quando a antiga administradora, Thallyta Figueirôa, pediu exoneração. Ela estava no cargo desde o início da gestão Raquel Lyra, sendo a primeira mulher a ocupar o cargo. Os motivos da saída dela não foram divulgados.
No mesmo dia, o governo estadual indicou o secretário executivo de Meio Ambiente, Walber Santana, para ocupar o posto. Biólogo e com experiência de trabalho na secretaria, ele foi visto como um bom nome técnico para gerir o arquipélago.
Contudo, para tomar posse, o novo administrador precisa passar por uma sabatina na comissão de Constituição, Legislação e Justiça (CCLJ) da Alepe. A entrevista deve ser agendada pelo parlamentar que preside o colegiado, sem prazo definido.
Em fevereiro, porém, o governo estadual perdeu o comando da CCLJ para a oposição, quando o deputado Alberto Feitosa (PL) foi eleito presidente do grupo após uma manobra oposicionista. Raquel também perdeu a liderança das comissões de Finanças, Orçamento e Tributação e de Administração Pública, outras das mais importantes do Legislativo.
A sabatina de Walber na Alepe foi marcada pela comissão para o dia 11 de março. Durante estas semanas, a oposição já fazia críticas à demora na substituição de Thallyta. Nesse período, o arquipélago passou a ter administração interina de Nathalie Mendonça, gerente-geral da ilha.
Um dia antes da sabatina, Raquel enviou um ofício à Alepe informando que desistiu da indicação de Walber, sem revelar os motivos.
A desistência se deu porque Raquel decidiu colocar um quadro político no cargo. Essa estratégia também foi usada em outros postos do governo, num movimento feito pela governadora para ampliar a musculatura política com vistas em 2026.
No lugar de Walber, o governo escolheu o advogado Virgílio Oliveira, indicado pelo partido Avante, que deixou o grupo de João Campos e passou a rumar com a governadora. O anúncio dele, porém, só aconteceu no final de março. A desistência da indicação anterior e a demora no novo anúncio aumentaram ainda mais a insatisfação da oposição quanto a vacância do cargo.
Acontece que um dia antes da indicação de Virgílio, o governo estadual publicou no Diário Oficial a troca de 29 profissionais na gestão de Noronha. Os nomes foram colocados pela nova equipe administrativa, antes mesmo da indicação formal do administrador, o que gerou mais revolta na oposição.
Na última terça-feira (15), o presidente da CCLJ, Alberto Feitosa, afirmou que as indicações antecipadas dos novos funcionários do arquipélago geraram um desconforto, indicando não ter pressa em fazer a sabatina com Virgílio. Ele também criticou a desindicação do nome anterior.
"Entendo a pressa, mas ficou um vácuo por parte do governo. Fizeram a indicação, corremos parar marcar a sabatina e na véspera chega um documento desindicando aquela pessoa. Estamos construindo ambiente para, no momento oportuno, fazer a sabatina”, disse Feitosa.
Além de represar a escolha de Noronha, a perda da CCLJ também representou atrasos para outros pedidos feitos pelo governo junto à Alepe, como a autorização para captar um novo empréstimo de R$ 1,5 bilhão, alvo de questionamentos sobre a necessidade de um novo crédito.
O deputado estadual Waldemar Borges, um dos mais críticos à demora na escolha do novo administrador da ilha, é autor de uma PEC que prevê a eleição direta para o cargo de gestor da ilha. Ele acredita que a indefinição sobre a pessoa indicada reforça a necessidade da iniciativa.
"A ilha ainda é vista sob um olhar colonizador. Os ilhéus não participam da escolha do dirigente. É preciso dar esse salto para que Fernando de Noronha seja administrada pelos moradores”, afirmou o parlamentar, ainda em março.
Novo administrador adjunto assume a gestão
No dia 8 de abril — ainda sem a sabatina de Virgílio Oliveira — o governo estadual nomeou José Aglailson Queralvares Neto como administrador adjunto do arquipélago. Ele é irmão do deputado estadual Aglailson Victor (PSB), que embora seja filiado ao partido de João Campos, tem certa aproximação com Raquel Lyra e chegou a comparecer à filiação da governadora ao PSD, em março.
Sete dias depois, ou seja, na última terça-feira (15), o novo adjunto passou a responder temporariamente pelas atribuições do cargo de Administrador Geral de Noronha, conforme publicação no Diário Oficial do estado.
Com a medida, ele assumiu as tarefas que estavam nas mãos de Nathalie Mendonça, que foi remanejada para o cargo de assessora especial da Secretaria da Casa Civil. Até a nomeação de Virgílio, ele será o responsável pelas decisões locais.
No mesmo dia da mudança, Aglailson Neto iniciou uma série de visitas a locais importantes do arquipélago, passando pelo Palácio São Miguel, Porto de Santo Antônio e Hospital São Lucas.
Na quarta-feira (16), ele continuou com os trabalhos institucionais e participou da primeira reunião com o Conselho Distrital de Fernando de Noronha, onde conversou com conselheiros sobre as necessidades dos ilhéus.
"Nosso compromisso é manter o diálogo aberto, fortalecer a participação social e garantir que as decisões levem em conta quem vive, trabalha e cuida de Noronha todos os dias", disse Aglailson Neto.
Enquanto isso, Virgílio Oliveira prefere não dar declarações públicas e se mantém recolhido até que, enfim, seja sabatinado pela Alepe e possa assumir a gestão do arquipélago.