A essencialidade de uma Imprensa livre
Liberdade de expressão não é liberdade de destruição, por exemplo, da civilidade, da ética, das instituições, da dignidade e da honra do outro
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Atribui-se a Gutenberg, por volta do ano 1450, a invenção da imprensa com tipos móveis (tipografia). Ao lado de outras descobertas do mesmo período (Renascimento), tais como o telescópio e o relógio de precisão, a imprensa escrita, quando livre, é para a democracia o que o oxigênio é para o ser vivo.
O trabalho da imprensa é informar as pessoas para que as pessoas formem a sua própria opinião, sem que a elas se ache que se pode determinar como devam pensar, algo ainda mais relevante nas denúncias de corrupção, sucessos e deficiências de políticas públicas e outros temas. É, por isso, tão revoltante assistir em períodos de predominância de discursos autoritários, quando eles ganham terreno, casos de insultos, estigmatizações e humilhações públicas a profissionais do jornalismo.
Em artigo replicado no site da Faculdade de Direito da USP, o ex-Ministro do STF Celso de Mello pontuou ser a liberdade de imprensa “um dos pressupostos legitimadores da própria noção de Estado democrático de Direito”, acrescentando: “A ampla difusão da informação, o exercício irrestrito de criticar e a possibilidade de formular denúncias contra o Poder Público representam expressões essenciais dessa liberdade fundamental, cuja prática não pode ser comprometida por interdições censórias ou por outros artifícios estatais utilizados para coibi-la, pois – cabe sempre insistir – esse direito básico, inerente às formações sociais livres, não constitui concessão estatal, mas representa, sim, um valor inestimável e insuprimível da cidadania, que tem o direito de receber informações dos meios de comunicação social, a quem se reconhece, igualmente, o direito de buscar informações, de expressar opiniões e de divulgálas sem qualquer restrição, em um clima de plena liberdade”.
Nossa jurisprudência vem sendo fiel, mesmo diante de tantos solavancos, à "Declaração de Chapultepec" (México, 1994), ao confirmar, precedente após precedente, ao longo do tempo, que nada é mais corrosivo que a pretensão do Estado e seus agentes de regular a liberdade de expressão (ou de interferir no seu exercício), exatamente porque o pensamento existe para ser livre. Dito documento é uma carta de princípios, não uma lei, mas consagra a premissa de uma imprensa livre como condição insuplantável para que as sociedades resolvam seus conflitos, sendo subscrita por diversos chefes de Estado, inclusive o do Brasil (FHC e depois Lula).
Não significa que a informação publicada não possa trazer ao seu autor responsabilização, mas que a interdição judicial nesse campo deve ser sempre uma excepcionalidade, lembrando que a censura foi banida do ordenamento jurídico brasileiro, o que é confirmado pela atual Constituição (artigo 220, § 2º).
Ruy Barbosa, patrono dos advogados brasileiros, ensinou que "toda lei preventiva contra os excessos da imprensa, toda lei de tutela à publicidade, toda lei de inspeção policial sobre os jornais é, por consequência, usurpatória e tirânica". À luz dessa compreensão, a liberdade de expressão não desnatura suposta liberdade de extrapolamento da crítica, como se todo abuso fosse “excesso de linguagem”, diluído no “calor da emoção”, isentando seu autor.
Liberdade de expressão não é liberdade de destruição, por exemplo, da civilidade, da ética, das instituições, da dignidade e da honra do outro, como não é liberdade de propagação de discursos de ódio e preconceituosos. No instante em que a Associação Nacional de Jornais reconhece como homenagem o papel do Jornal do Commercio nessa causa, no transcurso dos seus 106 anos, avulta-se em mim o orgulho de pertencer ao seu time de articulistas, com inteira liberdade para vocalizar o que penso, em assuntos ligados ou não à minha formação no Direito.
A maior demonstração disso é a garantia de que a informação seja trazida ao leitor como ela deve ser apresentada: plena, cabendo a ele, o leitor, dessa informação extrair sua verdade. Na pessoa do doutor João Carlos Paes Mendonça, Presidente do Grupo JCPM, compartilho da convicção de que uma sociedade com futuro é apenas aquela onde a imprensa seja livre para, como ele afirma tão acertadamente, dar voz aos protagonistas da notícia: os cidadãos.
Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado