OAB: 95 anos como pilar indispensável da democracia
A Ordem dos Advogados do Brasil, referência por seus 95 anos, demonstrou possuir todas essas virtudes, tornando-se a guardiã perpétua da República.
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As festividades em comemoração aos 95 anos de existência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil proporcionam uma reflexão que vai além de simplesmente celebrar uma data específica. É um momento para relembrar a história da instituição e reafirmar seu compromisso com o país, pois o percurso da OAB está intrinsecamente ligado à jornada de construção e fortalecimento do nosso Estado Democrático de Direito.
A Ordem foi estabelecida em 18 de novembro de 1930 logo após Getúlio Vargas assumir o governo por meio do Decreto 19.408 - ela foi considerada como "fruto primogênito da Revolução de 1930". Desde então, não se limitou apenas a um papel corporativo restrito; ao contrário, passou a desempenhar um importante papel na sociedade civil, se posicionando ativamente como voz forte e independente nos momentos mais desafiadores da República.
Os primeiros anos da OAB foram marcados por conquistas estruturais que moldaram sua identidade democrática. Isso desde o Regimento Interno aprovado em 13 de março de 1933 até a implementação do primeiro Código Ética, em 25 de julho de 1934 e que entrou em vigor em 15 de novembro do mesmo ano. Esses documentos estabelecem princípios éticos fundamentais que permitiram à OAB desempenhar seu papel como vigilante incansável em prol da classe e, consequentemente, da sociedade brasileira.
Na década de 1930 houve um evento histórico significativo com a inclusão do Quinto Constitucional na Constituição de 1934 - uma vitória importante para os advogados que permitiu sua representação nos tribunais. Esse marco inicial evidenciava o poder da OAB em ir além de interesses exclusivamente corporativos e impactar de forma positiva o sistema judiciário do Brasil desde cedo.
Durante os anos difíceis do período militar (1964 - 1985), a OAB se destacou como uma das poucas entidades capazes de sustentar vivo o ideal democrático em meio às adversidades da época. O pernambucano José Cavalcanti Neves, que esteve na presidência da OAB no período de 1971 a 1973, exigiu do governo militar providências contra a intimidação do exercício da atividade advocatícia, prejudicada pela autoridade discricionária da polícia e pela interdição do benefício do habeas-corpus. E em 1972, ao final do VI Encontro da Diretoria do Conselho Federal com os presidentes dos Conselhos Seccionais, Neves fez um veemente pronunciamento em favor do Estado de Democrático de Direito e das garantias fundamentais como elementos indispensáveis para o desenvolvimento socioeconômico do país.
Sob a liderança de Raymundo Faoro (1977-1979), a coragem institucional da OAB também se destacou de maneira marcante e tangível. Durante esse período, a Ordem assumiu um papel fundamental como um ponto de resistência não violenta em oposição ao governo militar e foi a partir dela que surgiu a primeira denúncia sobre o uso de tortura contra prisioneiros políticos no país. Faoro, mais tarde reconhecido com uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, conduziu a OAB a se tornar um bastião da legalidade em defesa da democracia.
A 7ª Conferência Nacional dos Advogados aconteceu em Curitiba, no ano de 1978, sob a liderança de Raymundo Faoro, e marcou um momento crucial na luta contra o autoritarismo. Abordando o tema central do Estado de Direito, o evento resultou na elaboração da notável "Carta de Curitiba", que se tornou a primeira acusação pública embasada contra a continuidade do AI-5 em contraste com as promessas do governo em relação à abertura política.
A "Carta de Curitiba" não se limitou a ser apenas um manifesto; trata-se de um documento jurídico meticuloso que delineou os princípios legais e éticos para o restabelecimento pleno do Estado de Direito, unindo a comunidade jurídica em nível nacional em prol da causa democrática comum. A repercussão significativa do evento evidenciou a ascensão da OAB como uma instituição respeitada e influente dentro da sociedade civil.
No ano seguinte, durante o período em que Eduardo Seabra Fagundes esteve à frente da presidência da OAB (1979-1981), a resistência da instituição ao regime militar alcançou um momento trágico e heroico. Em 27 de agosto de 1980 ocorreu a explosão de uma carta-bomba endereçada ao presidente da OAB no Conselho Federal. O ataque resultou na morte da secretária Lyda Monteiro da Silva. Esse atentado terrorista perpetrado pelos órgãos de repressão tinha como objetivo intimidar a liderança da Ordem. No entanto, acabou por ter o resultado oposto ao esperado e fortaleceu ainda mais a determinação dos advogados brasileiros na luta pela redemocratização do país.
Lyda Monteiro foi simbolizada pelo sacrifício como um ataque à brutalidade do governo e à bravura dos que enfrentaram o terrorismo estatal na OAB. Mesmo após sobreviver ao atentado, Seabra Fagundes permanece como líder da resistência democrática no país e mostra que nem mesmo ameaças de morte podem calar os advogados brasileiros.
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