As narrativas eleitorais e a intenção de voto
Prevejo que existirão duas oposições na eleição de 2026. Uma liderada por Flávio Bolsonaro e outra, não necessariamente desbolsonarizada
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Em vez de olharmos sistematicamente para a intenção de voto, proponho que os amantes da estratégia eleitoral e das pesquisas, olhem o que cada candidato poderá contar na eleição. Dessa forma, é possível prever o resultado da disputa eleitoral vindoura. As narrativas servem para conquistar eleitores e, quando identificadas previamente, sugerem o futuro.
O que Lula contará ao eleitor na campanha eleitoral? Em primeiro lugar, dirá que precisou consertar e organizar a casa, já que o ex-presidente Jair Bolsonaro quebrou o Brasil, em particular, as finanças. Falará que trouxe de volta as políticas sociais que foram extintas durante a era Bolsonaro. Apresentará o Pé de Meia como grande política educacional e o Mais Especialistas como política pública eficiente. Mostrará que na sua era, a taxa de desemprego diminuiu consideravelmente e que, apesar dos juros altos, a economia cresceu.
O presidente Lula será apresentado como um líder democrático e respeitado pelas grandes lideranças mundiais. Além de ser um profundo negociador. Neste instante, dirá que Jair Bolsonaro, mais seus filhos, atentaram contra a soberania brasileira ao convencer o presidente Trump a taxar os produtos brasileiros e que tal medida prejudicou em muito a economia brasileira. Após contar detalhadamente esta história, Lula aparecerá como negociador nato que convenceu o presidente americano a remover as tarifas contra o Brasil. Lula, mais uma vez, exaltará a da força democracia brasileira. Quanto a segurança pública, dirá: "Nosso governo prende os grandes, combate a lavagem de dinheiro, e defende penas duras para milicianos e membros do crime organizado".
A campanha presidencial do PT está pronta. Como falei, muitas estórias serão contados e influenciarão o eleitor. Em razão delas, Lula chegará em 2026 em condições propicias para novo trunfo eleitoral. E o que a oposição tem para contar? Prevejo que existirão duas oposições na eleição de 2026. Uma liderada por Flávio Bolsonaro e outra, e não necessariamente desbolsonarizada, liderada por um candidato do União Brasil/PP ou de outro partido de menor envergadura.
Flávio Bolsonaro dirá: "Meu pai é vítima do sistema corrupto. Foi perseguido por Alexandre de Morais e está preso injustamente. Os direitos do meu pai foram violados e o Brasil precisa voltar a ser um país democrático. Cadê a picanha que Lula prometeu? Veja que está tudo caro. E olha: Lula e o PT são amigos de bandidos, do crime organizado". Esta narrativa é insuficiente para conquistar os eleitores indiferentes, ou seja, que não são Lula e nem Bolsonaro. Conclusão: Flávio Bolsonaro não tem boas estórias para contar.
Vislumbro que o outro candidato da oposição fará acenos para os eleitores bolsonaristas e indiferentes. Dirá que o Brasil precisa de um novo caminho e o que o governo do PT não trouxe as conquistas econômicas prometidas, como inflação menor e consumo de picanha. Trará a pauta da segurança pública e prometerá medidas duras contra o crime organizado. Mas não dirá o fundamental: Que o Brasil precisa de um novo caminho sem Lula e Bolsonaro. E não dirá pelo equivocado medo de perder eleitores bolsonaristas.
Considerando a calcificação do antilulismo, as boas estórias que o presidente Lula contará na campanha não serão fortemente suficientes para lhe garantir ampla vitória sobre seus adversários. A rejeição ao PT e a Lula e a ausência de um candidato de oposição claramente desbolsonarizado tendem a possibilitar a ida de Flávio Bolsonaro ao segundo turno.
Não fiquem tensos e ansiosos com as pesquisas de intenção de voto. Olhem atentamente quais estórias (narrativas) os candidatos poderão contar para conquistar o eleitor. Elas revelam muito coisa sobre como a eleição ocorrerá.
Adriano Oliveira , cientista político. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência