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Fone de ouvido com tradução simultânea é sentença de morte das escolas de inglês

A grande questão é: ainda faz sentido investir anos em algo que a tecnologia já entrega de maneira instantânea? ....................

Por FELIPE PEREIRA Publicado em 22/10/2025 às 0:00 | Atualizado em 22/10/2025 às 12:01

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O anúncio mais recente da Apple pode mudar em definitivo o futuro de um mercado bilionário: o das escolas de inglês. Com a chegada dos novos fones de ouvido da marca, agora equipados com tradução simultânea em tempo real, o idioma deixa de ser uma barreira para a comunicação global e, junto com isso, começa a ruir a lógica que sustentou milhares de cursos e franquias no Brasil e no mundo. Penso no quanto o inglês foi, durante décadas, um diferencial competitivo.

Pouca gente o dominava, e saber a língua era sinônimo de destaque em qualquer currículo. Depois, deixou de ser um diferencial para se tornar praticamente obrigatório, sobretudo no mercado de trabalho. As escolas de idiomas cresceram surfando nessa demanda, transformando a fluência em promessa de ascensão social e profissional. Só que, agora, a tecnologia vai resolver esse problema com uma única tacada: basta colocar um fone no ouvido e conversar, sem tropeços, com qualquer pessoa, em qualquer idioma.

Na prática, toda a demanda por aprendizado do inglês falado e ouvido começa a perder valor. As pessoas agora podem compreender e serem compreendidas sem precisar estudar anos em uma escola de idiomas. A curto prazo, é um rompimento de barreira necessário para democratizar a comunicação global. No entanto, a longo prazo, esse movimento tende a levar o setor educacional de idiomas a um colapso. E não falo em especulação futurista. O que o Google Tradutor fez com o inglês escrito, ao permitir navegar em sites nessa língua visualizando o conteúdo em português automaticamente, a Apple está começando a fazer com o inglês falado. Hoje é o AirPod; amanhã, será qualquer outro dispositivo como os óculos inteligentes, cada vez mais baratos e acessíveis. O que antes exigia anos de estudo, apostilas e mensalidades, agora cabe em um chip.

Reconheço que existe um argumento forte em favor das escolas: aprender um idioma é mais do que traduzir palavras. Estudar inglês estimula a cognição, desenvolve o cérebro, abre importantes portas culturais. Concordo com tudo isso. Entretanto, também acredito que essa disrupção tecnológica desloca o eixo. Deixa de estar no campo da necessidade prática, que foi a base de sustentação do setor, e passa a ser um diferencial cultural. Como modelo de negócio massificado, as escolas de inglês estão com os dias contados.

Se as últimas décadas foram marcadas pela explosão de escolas bilíngues e cursos on-line, esta que se inicia será lembrada como a era em que a inteligência artificial assumiu o posto de tradutor universal. E, ao que tudo indica, não existe plano pedagógico que consiga competir com um fone que simplesmente resolve o problema em segundos.

A grande questão é: ainda faz sentido investir anos em algo que a tecnologia já entrega de maneira instantânea? A marca da maçã já deu a sua resposta. Agora, as escolas de inglês terão que dar a resposta delas, e rápido.

Felipe Pereira, doutor em administração, escritor e especialista em aceleração de negócios com inteligência artificial e marketing digital

 

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