Como manter a racionalidade num mundo insano?
Na atualidade, vivemos num mundo VUCA, no acrônimo em inglês. que traduz-se como volátil, incerto, complexo e ambíguo em português

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Nos idos de 1970, David L. Rosenhan, psicólogo americano e professor emérito da Universidade de Stanford, conduziu um experimento cujo resultado foi publicado na revista Sciencecom o título "On Being Sane in Insane Places" (Sobre Estar Sadio em Lugares Insanos).
A experiência consistiu em duas partes.
Na primeira, colaboradores sadios (pseudopacientes) se internaram em conceituados hospitais psiquiátricos dos Estados Unidos. Eles simularamalucinaçõesauditivas, diziam que escutavam uma voz falando uma das três palavras: "golpe", "vazio" ou "oco". A normalidade dos comportamentos dopseudopacientesfoi avaliada pelos médicos como característico de suas “doenças”.
Nesta fase, nenhumpseudopacientefoi detectado, inclusive, ocorreu de alguns deles serem diagnosticados com esquizofrenia.
Na segunda parte, uma renomada instituição, que já conhecia a primeira fase, teria que descobrir quem eram ospseudopacientes que iriam se internar. Foram encaminhados para avaliação pacientes comuns, nenhum erapseudopaciente. A equipe médica “identificou” em alguns casos como farsantes ou suspeitos, pacientes reais. Em suma, qualquer um poderia alegar alucinações, de que escutou do além, por exemplo, a palavra "golpe" e ser tratado como lúcido.
Rosenhan demonstrou na primeira parte do estudo, falha em se detectar a sanidade, e na segunda, falha na detecção da insanidade.
Na atualidade, vivemos num mundo VUCA (acrônimo em inglês: volatility, uncertainty, complexity e ambiguity), em português, traduz-se como volátil, incerto, complexo e ambíguo.
A volatilidade é vista nas mudanças rápidas e imprevisíveis da economia, da política, da tecnologia...
A incerteza está na imprevisibilidade de prever o futuro e tomar decisões com base em informações limitadas.
A complexidade se encontra nas interações entre diferentes, múltiplas e interdependentes variáveis e fatores.
A ambiguidade se materializa pela complicação em interpretar informações e tomar decisões, proveniente de um cenário incerto e complexo.
Soma-se a este mundo, a dificuldade em se fazer uma leitura da realidade, fruto das fakenews, deepfakes, pós-verdade, guerra de narrativas e diferentes percepções, um conjunto de “fenômenos” que se tornaram corriqueiros, em especial, nas redes sociais.
As fakenews, que sempre existiram, tomaram uma dimensão inimaginável, fatos reais convertidos em mentiras e meias verdades.
As deepfakes, ou ventriloquismo digital, enganando os “olhos” do público.
Com a pós-verdade, os fatos objetivos se tornaram menos influentes que as emoçõese as crenças pessoais.
Na guerra das narrativas, o conflito de versões de uma mesma história tenta convencer a opinião pública sobre uma ideia.
A percepção, por sua vez, fazendo cada pessoa interpretar e incorporar em sua mente informações questionáveis.
Todos estes fenômenos circulam rapidamente e de forma simultânea, chegando a todos os pontos do planeta pelo emprego da internet, smartphones, inteligência artificial, entre outros.
Agrega a este ambiente a manipulação das massas, quando atitudes e opiniões, próprias de cada um, se ajustam às novas que são inerentes a uma coletividade.
Em 1921, Sigmund Freud, em sua obra "Psicologia das Massas e Análise do Eu", argumentou que “inserido na massa, o ser humano pensa, sente e age de maneira diversa de quando está sozinho”. Resumindo, o indivíduo submete sua singularidade à massa e se deixa levar por outros.
Não se deve esquecer o efeito “manada”, quando cada vez mais pessoas seguem, ou passam a agir, de acordo com o grupo dominante, sem refletirem o porquê de adotar determinado procedimento.
Mas como conduzir a massa, direcionar a opinião pública?
Pela propaganda, ferramenta para se atingir um fim. Dirigida a quem? Ao povo ou aos intelectuais? Os intelectuais normalmente ditam as condutas, as regras, assim sendo, resta o povo como resposta. Por sermos latinos, emotivos, muito mais fácil se dirigir ao povo de forma sentimental do que racional.
Por fim, aproximadamente 50 anos depois da publicação de Rosenhan, uma jornalista americana e estudiosos da psiquiatria questionaram a pesquisa do psicólogo.
Eles não conseguiram comprovar a idoneidade do trabalho como um todo, que a experiência, possivelmente, seria uma fraude.
Eita, que mundo louco!
E agora, acreditar no quê e em quem?
Como manter a racionalidade num mundo insano?
Swami de Holanda Fontes, Coronel da Reserva