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Irã, Israel e a guerra digital

O presente texto apresenta resultados de um estudo do Departamento de Ciência Política da UFPE sobre a guerra entre Irã e Israel no contexto digital

Por Maria do Carmo Soares de Lima e equipe Publicado em 14/09/2025 às 16:58 | Atualizado em 14/09/2025 às 17:09

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Em contextos de guerra e conflito, compreender como sociedades reagem emocional, ética e politicamente tornou-se fundamental para analisar as ações dos Estados e o terreno simbólico sobre o qual essas ações se legitimam. Mais recentemente, com a intensificação das guerras assimétricas e a digitalização dos conflitos, o comportamento civil passou a ser também objeto de análise empírica. Estudos quantitativos de emergência que analisaram padrões de mobilidade, comunicação e resposta coletiva diante de acontecimentos sugerem que a guerra não se limita aos campos de batalha físicos. Ela também é travada no imaginário, nas emoções e nas redes sociais que conectam indivíduos em escala global.

Por exemplo, o trabalho de Leasure e colaboradores (2023) demonstra como dados de redes sociais podem apoiar respostas humanitárias rápidas em cenários de guerra. Utilizando a plataforma de anúncios do Facebook, combinada a dados populacionais pré-conflito, os autores estimaram diariamente, por idade e sexo, o tamanho da população ucraniana após a invasão russa em 24 de fevereiro de 2022. Em apenas três semanas, cerca de 5,3 milhões de pessoas foram deslocadas internamente.

O presente texto apresenta resultados originais de um estudo realizado pelo Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco sobre a guerra entre Irã e Israel no contexto digital. O trabalho explorou os conceitos e técnicas essenciais na Mineração de Dados com o objetivo do desenvolvimento de conhecimento. Nesse sentido, apresentou a forma e o processo para compreender os sentimentos dos usuários no contexto de conflitos globais, utilizando como estudo de caso o conflito mais recente envolvendo Irã e Israel. Esse processo possibilitou o conhecimento acerca das nuances sentimentais e políticas das pessoas dentro das mídias sociais, de forma a contribuir com a identificação de padrões comportamentais relacionados à interpretação de conflitos e guerras.

Observamos que os usuários da rede social X apresentaram, em sua maioria, uma prevalência de sentimentos de neutralidade referentes ao conflito. É possível inferir que esse fator pode ter tido maior relevância por falta de interesse na questão, opinião verdadeiramente neutra e notícias possivelmente selecionadas na coleta de dados. Esse resultado não se mostrou surpreendente ou muito desprendido do contexto cotidiano dos usuários, que pode ter sido também determinante por incluir apenas a língua portuguesa e inglesa.

Com a intenção de compreender mais a fundo as bandeiras dessas mesmas opiniões, utilizamos uma abordagem assistida com algoritmo Random Forest. Dessa vez, os resultados retornaram com quase 43% “Contra-Israel”, 31% “Contra-Irã” e uma diminuição considerável de neutros, com 26%. Isso nos leva a considerar que nem sempre a expressão de sentimentos neutros está desprendida de vieses ideológicos e que, apesar de um caráter inerte na primeira análise, ainda há uma reprovação popular da conduta de Israel dentro do conflito.

Ainda, as duas análises observam coisas diferentes e, portanto, os objetivos se alteram entre elas, o que resulta em classificações distintas. Por conta disso, apesar de as duas análises possuírem em sua classificação a categoria “neutro”, os conceitos de neutralidade são diferentes. Sob essa perspectiva, enquanto a primeira atribui um valor matemático positivo, negativo ou neutro, a segunda análise faz uma identificação de forma quanti-qualitativa, considerando seus respectivos contextos. Isto posto, são atribuídos como neutros todos os tweets que não entram nas duas outras categorias.

A partir do que foi exposto, podemos concluir que nosso modelo de análise de sentimento teve uma boa expressibilidade de acurácia e demonstrou prevalência de especificidades que, por meio da agregação desses resultados, foi possível identificar a tendência das amostras: sentimentos neutros em relação ao conflito e uma predominância do viés político contra Israel. Essa pesquisa aprofunda a compreensão da percepção dos conflitos, analisando a perspectiva daqueles que os observam, muitas vezes sem envolvimento direto.

Maria do Carmo Soares de Lima e equipe

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