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O conselho de Medrado

Medrado era um jovem e excelente zagueiro do Vitória quando estudante de direito da Universidade Católica da Bahia, na década de 60.

Por ARTHUR CARVALHO Publicado em 03/09/2025 às 0:00 | Atualizado em 03/09/2025 às 10:30

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De vez em quando, eu jogava contra ele defendendo o time da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, e ele da Universidade Católica. Formado, foi ser delegado civil no interior.

Pouco depois de nomeado, aconteceu um crime bárbaro no seu distrito, com o massacre de oito crianças negras por um grupo de fanáticos. Depois de praticar o "ritual", beberam o sangue das vítimas. Sendo chacina de grande repercussão estadual, nacional e internacional, quando Medrado foi entrevistado para explicar o episódio cometido com requintes de perversidade, barbárie e primitivismo, respondeu no mesmo estilo tranquilo e calmo como jogava seu clássico futebol: "Leiam os sertões. Tá tudo lá!" Pegou o boné e encerrou a entrevista. Sem descer aos detalhes mórbidos do fato macabro.

Quando o leitor me pergunta como é possível e permitido pelas divindades a existência de tipos feito Nero, Hitler, Trump, Putin, Benjamin Netanyahu, Nicolás Maduro, Silas Palavrada Malafaia, o boca de latrina, lembro de Medrado: Leiam Lombroso e Ferri, criminalistas italianos, fundadores da Escola Positivista, segundo os quais, certos indivíduos nascem predispostos ao crime. Machado de Assis ia mais fundo: "Não é a ocasião que faz o ladrão, o ladrão já nasce feito." Leiam Recordações da Casa dos Mortos, Crime e Castigo e Os Irmãos Karamazov. Leiam os Irmãos Dagobé, conto de Guimarães Rosa, do livro Primeiras Estórias, em que os três irmãos Dagobé iam rezar contritamente no velório de suas vítimas. Leiam o conto Gato, gato, gato, de Otto Lara Rezende, do livro O elo partido e outras estórias, relato de um menino que se comprazia em esmagar os gatos com a sola dos sapatos cravados de pregos, espetando os pregos na barriga dos bichanos. Leiam um conto do dramaturgo e contista Tchecov (que se queixava do odor azedo do suor das bailarinas russas), cujo personagem principal do conto somente atingia o orgasmo quando o trem descarrilhava em consequência do desastre causado por uma agulha por ele posta no trilho.

Para aliviar a barra, tornando a leitura mais leve, leiam as crônicas líricas de Rubem Braga, os romances de Laurence Sterne e Xavier de Maistre. Não percam Don Quixote. Sem Miguel de Cervantes não haveria literatura.

Arthur Carvalho , FENAJ

 

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