Risco de perder créditos tributários na Reforma Tributária
A RT nasceu com a promessa de simplificação e neutralidade, mas ao não oferecer uma solução segura para os créditos acumulados...........

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A sistemática de apuração do ICMS, como regra geral, consiste na apuração de créditos nas entradas de mercadorias e débitos nas respectivas saídas, gerando uma diferença, que se for devedora resultará no recolhimento deste imposto e se for credora terá o direito a compensar nos meses subsequentes. Ocorre que as empresas de diversos setores da economia possuem créditos acumulados de ICMS. Um dos setores mais impactados são as exportadoras, isentas de ICMS na saída dos produtos. Isso gera acúmulo de crédito na cadeia de produção, sem possibilidade de compensação.
Diante da proximidade da Reforma Tributária (RT), com início de testes em 2026 e previsão para seu término em 2033, ano em que se encerra o período de transição e os atuais tributos sobre o consumo serão extintos, com a migração completa do novo modelo que seguirá plenamente vigente, as empresas de diversos setores da economia têm intensificado estratégias para evitar risco de perda de créditos tributários acumulados de ICMS.
Pois bem, o objetivo é utilizar os créditos antes do fim do ICMS, previsto para 2032, quando o referido tributo será substituído pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Caso não seja possível a utilização dos créditos tributários de ICMS, durante o período de transição da RT, os créditos existentes, até 31 de dezembro de 2032, só poderão ser compensados ou restituídos em até 240 parcelas mensais, ou seja, 20 anos depois, com atualização limitada pelo IPCA e apenas a partir de 2033. Essa situação é uma postergação incompatível com o custo de capital da indústria brasileira. Para qualquer empresário, é como se o Estado tivesse tomado um empréstimo gratuito e, mesmo assim, ainda devolvesse o valor em prazo longo, atualizado por índice que não atualiza adequadamente o montante do crédito tributário acumulado.
A situação se torna ainda mais delicada, devido à exigência de homologação estadual dos créditos tributários de ICMS. O processo, já conhecido pela morosidade e pela falta de critérios claros, funciona como uma barreira adicional, capaz de inviabilizar a transferência integral desses saldos para o novo sistema. Em muitos casos, a sensação é de que, mesmo cumprindo todas as formalidades legais, o contribuinte continua refém da boa vontade do fisco para exercer um direito básico, cujo risco se intensifica à medida que a transição se aproxima.
Há uma contradição evidente. A RT nasceu com a promessa de simplificação e neutralidade, mas ao não oferecer uma solução segura para os créditos acumulados, transfere ao contribuinte uma conta que não lhe pertence. Em países que já passaram por RT semelhante, a devolução rápida dos saldos credores foi tratada como condição essencial, para que o novo sistema funcionasse sem distorções. No Brasil, a ausência de um mecanismo ágil pode transformar esse cenário em uma das maiores perdas silenciosas da história fiscal brasileira. Por estes motivos, empresas já começaram adotar estratégias que incluem o ingresso de processos administrativos e/ou judiciais e/ou reorganizações societárias, a fim de minimizar os impactos, evitando perdas financeiras pela dificuldade de recuperação dos créditos tributários do ICMS.
Bruno Feldman e Cláudio Sá Leitão - Sócios da Sá Leitão Auditores e Consultores