A tradição da sociologia eleitoral em Pernambuco (1)
Este artigo foi publicado originalmente no Jornal do Commercio (JC) em 2 de dezembro de 1979.....................................

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O interesse renovado a partir do pleito de 1974, já comparado em importância às eleições legislativas de 1962, por estudos eleitorais, não só tem ensejado a publicação de novos títulos específicos como trouxe a superfície mediante levantamentos a cargo de sociólogos e cientistas políticos um vasto acervo bibliográfico de cunho nacional concernente à produção intelectual nessa área.
Em Pernambuco, vale ressaltar, o estudo sistemático desenvolvido por nossos cientistas sociais com base nos escrutínios estaduais iniciado há um quarto de século quando apenas Orlando Carvalho em Minas tratara cientificamente o tema, posteriormente publicado em livro (1958), autoriza destarte nomear-se uma tradição de sociologia eleitoral. O marco inicial "Uma pesquisa de sociologia Eleitoral: As Eleições de 3 de outubro de 1954 no Município do Recife" (1955) foi trabalho de equipe dirigida por Gláucio Veiga e Palhares Moreira Reis. A pesquisa pioneira, publicada na Revista Pernambucana de Sociologia, dirigida por Pinto Ferreira e Gláucio Veiga, objetivou construir um perfil topográfico da opinião política recifense procurando preliminarmente estabelecer a composição social da população e sua distribuição pelos bairros da cidade. Estratificando a população por rendimentos e classificando os bairros por estrato predominante. Do cotejo com os sufrágios obtidos pelos candidatos Cordeiro de Farias e João Cleofas, postulantes ao governo do Estado e Jarbas Maranhão, Barbosa Lima Sobrinho, João Roma e Antonio Novaes Filho, que pleiteavam a senatoria, foi obtido o índice de preferência política dos eleitores de cada bairro, decompostos os resultados oficiais por zonas e reagrupadas as seções - uma prática de microssociologia eleitoral conforme ARAMBOUROU (1952). João Cleofas venceu largamente no Recife, sendo seus mais poderosos bastiões, como indicou a pesquisa, os bairros de "classe média-média", "classe média-proletarizada" e "classe proletária" em função da atuação dos partidos de esquerda e do partido Comunista. Conclusões a que chegaram e que se tornariam assertiva comum nos estudos que se seguiram, ressaltam a absoluta supremacia das coligações de esquerda no município do Recife e a completa perda pelo governo do controle político acompanhando a proletarização das camadas sociais médias.
Ampliando o espaço da pesquisa subsequente, os mesmos autores à frente de equipe do Instituto de Ciências Políticas e Sociais elaboraram uma "Geografia Eleitoral de Pernambuco" (VEIGA et al, 1960) mapeando todo o Estado segundo os resultados expressos nos municípios-comarcas nas eleições governamentais de 1958 que envolveram Cid Sampaio e Jarbas Maranhão. Uma dinâmica eleitoral foi estabelecida face aos pleitos de 1950 e 1954 e a caracterização ligeira da realidade socioeconômica nas três regiões fisiográficas foi dotada de certo poder explicativo para a clivagem do Estado em municípios governistas e oposicionistas que passa a ser habitual nas análises que se seguiriam. Superando a simples análise quantitativa os autores abordaram os tópicos da conjuntura política local de maior incidência sobre as diversas forças sociais e buscaram referenciar a vitória de Cid Sampaio ao comportamento de variáveis político-institucionais como o novo processo de alistamento, a utilização da cédula única e a presença de tropas federais em todos os municípios, abalando o controle do eleitorado pelos potentados locais ou o fato novo representado pela tomada de posição das "classes produtoras" contrapondo-se a máquina política do PSD cimentada no agreste e sertão.
As duas pesquisas citadas estabelecem a moldura das demais. Vamireh Chacon procedeu à análise dos pleitos seguintes que assinalaram respectivamente o final da série realizada no período de normalidade democrática reunindo os antigos partidos e o início nas urnas do ciclo do bipartidarismo. Expressão oficial ao nível político partidário do regime de exceção inaugurado pelo movimento militar de 1964. Em "As eleições de outubro de 62 — Pernambuco" (1964) e "As Eleições Estaduais em Pernambuco — 1966" (1968) não há mudanças metodológicas sensíveis. Apenas, ganha espaço o exame histórico da transição. O desenvolvimento econômico é identificado como acelerador das lutas de classe e a intervenção das forças armadas na crise, já prevista no primeiro texto, encarada como exercício do poder moderador de que estariam investidas de fato desde 1889. A categorização "esquerda e direita'' é enriquecida como seus produtos extremos, os "ultra" respectivos, responsáveis aos olhos de autor pelas crises institucionais ocorridas ou vindouras.
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