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Adriano Oliveira: A história não se repetirá com Bolsonaro

Durante a sua era, Bolsonaro atacou instituições, urnas, imprensa. Foi, por várias vezes avisado, recebeu recados. Mas seguiu a estressar o sistema

Por ADRIANO OLIVEIRA Publicado em 02/08/2025 às 23:03

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Pesquisa do Datafolha divulgada em 02/10/2017 revelava que 54% dos brasileiros achavam que Lula deveria ser em preso em virtude das denuncias apresentadas pela Lava Jato. 40% afirmavam que não.

Nova pesquisa do Datafolha publicada em 02/08/2025 mostra que 48% dos brasileiros acham que Bolsonaro deveria ser preso pela tentativa de golpe e 46% são contrários. As acusações são diferentes, mas a história se repete. E assim seguirá?

Lula foi condenado, preso, “anistiado” e voltou à presidência da República. Bolsonaro será condenado, preso, anistiado e voltará à presidência da República? Afirmo que não! E explico as razões, as quais estão sendo desconsideradas pela direita que insiste em ser bolsonarista, em especial, os governadores Ratinho Júnior, Ronaldo Caiado, Tarcísio de Freitas e Romeu Zema.

Lula faz parte do sistema. Qual sistema? Algum aluno de Ciência política indagará. O sistema prático da política. É nele que as negociações ocorrem, dentre as quais, a distribuição de poderes e respeito aos espaço de cada ator político. O toma-lá-da-cá acontece naturalmente para garantir o funcionamento do sistema.

Os atores mais aptos ocupam os melhores lugares e têm os interesses preservados, a não ser que eles contrariem fortemente o interesse de outro ator ou instituição.
O sistema não admite intenso estresse, apenas os que provocam crises contornáveis.

A Lava Jato foi produtora de estrondoso estresse. Ela, durante três anos, denunciou e prendeu políticos e empresários variados. Desnudou o sistema ao mostrar como atores se relacionam em busca da conquista e manutenção do poder. Em decorrência da Lava Jato, Lula e Michel Temer, atores importantes e estratégicos da dinâmica política, foram presos.

Lula, durante as suas eras, fazia de tudo para não estressar o sistema. Distribuía poderes, respeitava as instituições. Quando exageros ocorreram, como no Escândalo do Mensalão, as instituições agiram, mas foram respeitadas pelo presidente da República. O poder delas não foi questionado. Alguns atores foram salvos e outros condenados, afastados da política, como o histórico quadro do PT, José Dirceu.

A Lava Jato estressou demasiadamente o sistema. Por consequência, instituições e atores se revoltaram contra ela. A atuação de variadas peças, como o ex-juiz Sérgio Moro, tonava inviável o funcionamento eficiente do sistema. Ele tentava realizar radicalmente a limpeza da política como se todos que a praticavam precisassem ser eliminados. A prática política tem dinâmica e éticas próprias, as quais possibilitam o adequado funcionamento do sistema. Todavia, o sistema não admite exageros, esclareço.

O sistema é conduzido por regras democráticas. Estão presentes a (1) alternância do poder, (2) a harmonia das instituições, (3) o respeito entre atores, (4) eleições e imprensa livres, e as (5) instituições punem os exageros contra o sistema. Crises econômicas graves podem provocar turbulências no sistema.
Bolsonaro, ao contrário de Lula, estressa intensamente e cotidianamente o sistema.

Durante a sua era, Bolsonaro atacou as instituições, as urnas eletrônicas, a imprensa. Foi, por várias vezes avisado, recebeu recados. Mas seguiu a estressar o sistema. Ao perder a eleição, conforme denúncia do Ministério Público Federal, além de fortes evidências, atentou contra a democracia, ou melhor, contra o sistema.

Eduardo Bolsonaro, tentando evitar a prisão do seu pai, estressa o sistema ao atacar fortemente a soberania do Supremo Tribunal Federal e setores da economia. Mesmo fora do poder e na iminência de ser preso, Jair Bolsonaro não muda o seu comportamento e segue com a equivocada estratégia de estressar o sistema.

A história não se repetirá com Bolsonaro. O estresse produzido pela família Bolsonaro fortalece o lulismo e poderia possibilitar o nascimento de uma força política desbolsonarizada que viesse a conquistar a presidência da República em 2026. Todavia, os governadores pré-candidatos à presidência sofrem de baixa autoestima e acreditam, equivocadamente, apesar das fartas evidências, de que só o bolsonarismo pode derrotar o lulismo.

Adriano Oliveira – Cientista político. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência – Pesquisa Qualitativa e Estratégia.

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