O STF na história democrática
A democracia também se faz pela avaliação dos erros e acertos das leis, e na observação dos excessos praticados por representantes dos poderes

Clique aqui e escute a matéria
A sessão de retomada do expediente de trabalho no Supremo Tribunal Federal (STF) para o segundo semestre, nesta sexta, 1º de agosto, foi marcada por manifestações institucionais maiores do que de costume nessas ocasiões. Por causa do tarifaço dos Estados Unidos aos produtos importados ao Brasil, cuja maior justificativa não vem a ser econômica, mas política, de maneira inédita nas relações comerciais entre os dois países, e das sanções da Casa Branca contra ministros do STF, especialmente Alexandre de Moraes, os discursos primaram pela defesa da Corte e de seu papel na garantia dos direitos constitucionais e dos valores democráticos.
O tom foi de coesão em torno do Judiciário, rechaçando interferências de qualquer natureza sobre os processos em andamento, como a explicitada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, ao anunciar a sobretaxa de 50% ao Brasil como uma espécie de punição ao que ele qualifica de perseguição a Jair Bolsonaro, em julgamento no STF por suposta participação em tentativa de golpe de Estado, na ordem de fatos que culminou na baderna e vandalismo nas sedes dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro de 2023, no primeiro mês do atual governo Lula, que venceu as eleições e impediu a renovação do mandato de Bolsonaro.
Em seu discurso, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, chamou atenção para a repetição de golpes, contragolpes, rupturas e tentativas de ruptura da legalidade constitucional na história brasileira. Assim como, desde a proclamação da República, o Supremo vem sendo alvo de ameaças e violências – a exemplo do que fez Getúlio Vargas, ao aposentar compulsoriamente seis ministros por decisões tomadas, ou ainda, ao permitir que o Congresso derrubasse as decisões que declarassem a inconstitucionalidade de alguma lei durante o Estado Novo.
Reafirmando o valor da Constituição de 1988, Barroso elogiou a estabilidade institucional que passou por impeachments, e declarou a importância do Judiciário, ao afirmar: “É nosso papel impedir a volta ao passado”. Para, em seguida, ressaltar que em diversos países, a necessidade de um tribunal independente e atuante é crucial para “evitar o colapso das instituições”. Que podem atingir outros poderes, via de regra subjugando o Legislativo. Vale recordar que assim como se ameaça o Judiciário, o Congresso brasileiro, na figura dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, já foi publicamente ameaçado de retaliações, caso não se alinhe contra o julgamento em curso no STF sobre o ato de 8 de janeiro e seus antecessores.
A estabilidade institucional mencionada por Barroso como conquista constitucional, no entanto, está longe de ser pacífica e imune a críticas, na atualidade. Inclusive no alcance das fronteiras de suas atribuições, Executivo, Legislativo e Judiciário não se satisfazem com os seus limites – e é aí que a mesma contundência às ameaças de fora deve ser aplicada, no âmbito de cada poder, e na harmonia que precisa ser buscada na construção democrática incessante. Pois a democracia também se faz pela avaliação dos erros e acertos das leis, na sucessão de tempos e sociedades mutantes. E na observação dos excessos praticados por representantes dos poderes – como o presidente da República e seus ministros, os juízes de todas as instâncias e os parlamentares eleitos para agir pela causa coletiva.