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Sérgio Gondim: 'Por que dormir bem é uma das coisas mais importantes'

Preservar o ritmo circadiano resguarda a fisiologia e pode ser importante inclui-la nas medidas gerais para preservar a boa saúde do ser humano

Por SÉRGIO GONDIM Publicado em 01/08/2025 às 0:00 | Atualizado em 02/08/2025 às 10:17

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Quando uma pessoa pública é vítima de uma doença, como aconteceu recentemente no Brasil, é comum que o assunto passe a ser debatido em todos os meios de comunicação e se o paciente participa de forma equilibrada, detalhando o acesso ao diagnóstico, à prevenção e tratamento, presta um serviço à saúde pública. Mesmo na luta árdua e sofrida do combate à doença avançada, encontra energia para fazer o bem, informando e transformando seu sofrimento em vidas salvas.

Nas últimas décadas a incidência geral de câncer tem aumentado, em particular câncer colorretal em pessoas mais jovens. Esse fato também é observado com outras neoplasias e tem sido estudado em várias frentes, com atenção voltada principalmente para os motivos envolvidos. Intuitivamente culpa-se o estilo de vida e os hábitos alimentares como principais suspeitos, mas a ciência é exigente e analisa cuidadosamente todas as possibilidades.

O maior número de casos de câncer em jovens ocorre em paralelo ao aumento significativo da exposição à luz artificial durante a noite e pesquisas passaram a analisar essa coincidência. A luz emitida por televisões, telas de computador e telefones pode suprimir a produção de melatonina, comprometendo o ritmo circadiano que regula o ciclo sono-vigília e está fortemente conectado com processos biológicos críticos como imunidade, secreção de hormônios, reparação de DNA e metabolismo. Ajuda a preservar a estabilidade genômica e o ciclo celular.

Numerosos estudos têm relacionado a interrupção circadiana ao início e progressão do câncer.

Essa relação foi analisada em um artigo de revisão publicado recentemente na Nature Immunology. As interrupções do relógio interno, causadas por problemas de sono ligados à exposição à luz noturna e hábitos alimentares irregulares podem ser o elo para a mudança de comportamento da doença ou, pelo menos, parte da explicação.

Foram observadas expressões alteradas de genes em vários tecidos, relacionadas com a quebra do ritmo circadiano reforçando a hipótese de que o aumento de canceres precoces pode ter relação com o trabalho errático, padrões de sono e alimentação da sociedade moderna.

Uma meta-análise envolvendo mais de 170.000 participantes detectou que a alta exposição à luz artificial noturna aumentou o risco de câncer de mama. Dados semelhantes foram observados em relação ao câncer de tireoide. Documentou-se maior incidência de câncer em enfermeiras com turnos de plantão noturno ininterruptos.

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Preservar a saúde circadiana, pode desempenhar um papel significativo na prevenção e tratamento da doença. As estratégias incluiriam observar os horários de sono e refeições (o trabalho noturno repetido também altera o ritmo de alimentação e o metabolismo de glicose, tendo relação com a síndrome metabólica e câncer). Nesse sentido seriam recomendados limites para o trabalho noturno, proteção contra exposição à luz artificial noturna, alimentação durante uma janela de 6 a 12 horas do dia e atividade física regular. O exercício, além de tudo, tem efeito positivo sobre a síndrome metabólica relacionada ao desenvolvimento de câncer e, agora sabe-se, também sobre o resultado do tratamento de câncer colorretal.

Recomendações visando a prevenção e o diagnóstico precoce têm sugerido maior vigilância em populações de risco, como adultos jovens expostos a desalinhamento circadiano. Também se estuda a cronoterapia que alinha a hora de administração da medicação para combater o câncer com o relógio do corpo, melhorando os resultados, seja por efeito direto dos medicamentos ou por aumentar a tolerância e permitir doses maiores e mais eficazes.

Preservar o ritmo circadiano resguarda a fisiologia e pode ser importante inclui-la nas medidas gerais para preservar a boa saúde. Assim, além de alimentação saudável, controle de peso, exercícios físicos, restrição de álcool e cigarros, ter boas noites de sono, sem telas, pode preservar vidas.

*Sérgio Gondim, médico

 

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