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A sogra tem afinidade para sempre

A sogra tem um vinculo permanente, e se o casal tem filhos, a sogra se torna avó. O papel de avó geralmente é ativo, presente na dinâmica familiar.

Por JONES FIGUEIRÊDO ALVES Publicado em 19/06/2025 às 0:00 | Atualizado em 19/06/2025 às 10:10

Extinto o vínculo conjugal ou convivencial, por evento morte, divórcio ou ruptura da união estável, cônjuges ou conviventes colocam-se no pretérito, seguindo-se as vidas de ambos ou a de um deles. Entretanto, segundo a lei, tal fato jurídico não faz cessar a relação parental (por afinidade) entre genro e sogra (art. 1.595, § 2º, Código Civil). A sogra é legitima, a afinidade não se extingue e ela continuará sendo sogra vida afora.

A cada união o homem haverá de acumular sogras, em perfeita harmonia intertemporal; divorciado ou viúvo da primeira esposa, não poderá casar com a mãe daquela ou com qualquer outra que se lhe seguir como sogra. No ponto, a doutrina assinala: há um vínculo perpétuo que configura o impedimento matrimonial do art. 1.521, II, do Código Civil (Flávio Tartuce, 2011).

Para além da relação parental dos afins, a sogra é legítima em ação de indenização por dano moral decorrente da perda do genro. O Superior Tribunal de Justiça confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro admitindo a legitimidade ativa da sogra, como autora de uma ação indenizatória por morte do genro, vítima de acidente de trânsito. As instâncias ordinárias concluiram que "a relação de constância e proximidade existente entre vítima e autora foi devidamente comprovada", quando o falecido "residia com a sogra, na residência da mesma, e era ela quem cuidava dos netos". (4a. Turma, REsp. n. 865.363-RJ).

O STJ já pronunciou que "o direito à indenização, diante de peculiaridades do caso concreto, pode estar aberto aos mais diversificados arranjos familiares, devendo o juiz avaliar se as particularidades de cada família nuclear justificam o alargamento a outros sujeitos que nela se inserem, assim também, em cada hipótese a ser julgada, o prudente arbítrio do julgador avaliará o total da indenização para o núcleo familiar, sem excluir os diversos legitimados indicados. (4ª Turma, REsp. nº 1076160).

O Ministro Relator Luís Felipe Salomão ressaltou que "a mencionada válvula, que aponta para as múltiplas facetas que podem assumir essa realidade metamórfica chamada família, justifica precedentes desta Corte que conferiu legitimação ao sobrinho e à sogra da vítima fatal".

A sogra é legítima no direito sucessório. Suficiente observar, na sucessão legítima e em falta de descendentes, deferir-se a ordem da vocação hereditária, aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge (art. 1.829, II, Código Civil). No mais, situa-se o exemplo: embora somente os filhos do herdeiro pré-morto sejam titulares na sucessão do avô paterno; em falecendo uma das filhas desse herdeiro após a abertura da sucessão, casada em qualquer que seja o regime de bens e sem filhos, o cônjuge concorre com o ascendente e, na hipótese, a mãe da filha falecida, na forma do art. 1829, II, do Código Civil. (TJRJ, 13a. CC,

Apel. Cível n. 0001213-42.2005.8.19.0202). Em menos palavras: o viúvo terá seu direito sucessório exercido, de maneira concorrente, com o da sogra.

A sogra também é legítima em relações obrigacionais, havida como beneficiária à retomada do imóvel locado e abrangido pela comunhão de bens do casamento (STJ - 5a. Turma, REsp n. 36967/SP), porquanto a afinidade parental de primeiro grau em linha reta a faz equivalente ao ascendente (STJ - 5a. Turma, REsp. n. 36365/MG).

Aparece legítimada em percepção de alimentos, com dedução das verbas pagas perante o imposto de renda, em razão de acordo judicial (STJ - 1a. Turma, REsp 1173538/MG).

Coloca-se igualmente legitimada na sua relação com o genro para os fins da Lei Maria da Penha, em interpretação extensiva do inciso III do art. 5º da mencionada lei, como destinatária de proteção, independente de coabitação. (TJRS - 1ª Câmara Criminal, Conflito de Jurisdição nº 70043571595). Nessa amplitude, situa-se a violência de gênero. Vejamos:

"Violência doméstica. Agressões perpetradas por genro contra sogra. Incidência da lei Maria da Penha. (...) Questão que não se confunde com a diferença biológica entre homens e mulheres, mas, sim, guarda relação com a desigualdade que se estabelece culturalmente entre os papeis destinados ao masculino e ao feminino nas relações familiares e íntimas de afeto. 2. No caso concreto, as ameaças perpetradas contra a ofendida tiveram origem na inconformidade do suposto autor do fato com término do relacionamento afetivo mantido com a filha da vítima. Esse é o fato que, segundo a ofendida, teria desencadeado a conduta agressiva de seu genro. Como visto, a origem do fato possui relação com a questão de gênero (...) (TJRS, CC Nº 70072697014, Relator: Sérgio Miguel Achutti Blattes, 3ª Câmara Criminal).

Em interessante e recente caso julgado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (05.05.25), no AgRg no HC 990249/SC, o ministro Ribeiro Dantas concedeu salvo conduto ao genro para o plantio de "cannabis sativa" com finalidade medicinal, em favor de sua sogra, admitindo a utilização conjunta de plantas já autorizadas.

A sogra tem um vinculo permanente, e se o casal tem filhos, a sogra se torna avó. O papel de avó geralmente é ativo, o que mantém ela presente na dinâmica familiar.

A sogra é uma questão já bem resolvida pelos tribunais. O Direito de família mais avançado tem tratado da inclusão da afetividade de modo mais amplo. Então, resta-nos tratar a sogra, bem resolvendo-a, com nossos afetos. A sogra será sempre legitima, não importa quantas.

Jones Figueirêdo Alves, desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista

 

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