José da Costa Soares: Padre Henrique, presente!
Passados 56 anos, a memória do padre Henrique permanece viva, inspirando todos aqueles que lutam pela causa dos direitos humanos neste país

Neste dia 28 de maio, às 09h30, a Universidade Federal de Pernambuco e o Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico Pernambucano prestarão uma homenagem à memória do Padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto, descerrando uma placa do projeto “História nas Paredes”, nas dependências da UFPE, a qual será adotada pela Associação dos Docentes da UFPE e pela vereadora Cida Pedrosa.
A escolha do mês de maio, mês em que o Padre Henrique foi sequestrado, torturado e morto pela ditadura militar brasileira, não poderia ser mais oportuna, dadas as tentativas recentes de revisionismo histórico assistidas neste país em torno do que foi o golpe de 1964 e todos os seus consectários políticos e humanitários
Mas, o que aconteceu com o Padre Henrique?
A história é muito trágica e dolorosa, transformando o jovem religioso em um mártir da democracia e dos direitos humanos deste país.
Na noite do dia 26 de maio de 1969, o jovem padre, então assessor direto do arcebispo de Olinda e do Recife Dom Helder Camara, foi sequestrado no bairro do Parnamirim, no Recife (provavelmente, pela mesma rural willys verde e branca, que, menos de trinta dias antes, promovera o atentado que deixara paraplégico o líder estudantil Cândido Pinto, na Ponte da Torre).
Na manhã do dia seguinte, 27, o seu corpo foi encontrado na Cidade Universitária, com marcas de espancamento, queimaduras, cortes profundos e três ferimentos produzidos por arma de fogo.
Era clara a motivação do crime: calar Dom Helder Camara
Naquele momento, o país vivia o pior período da repressão, conhecido como "anos de chumbo", intervalo compreendido entre a assinatura do AI-5 (13.12.1968) e o início do Governo Geisel (15.03.1974).
Dom Helder era uma personalidade internacionalmente reverenciada, integrando a linha da Igreja Católica que se opunha à ditadura militar, ao lado de outros clérigos, como Dom Paulo Evaristo Arns, Frei Beto e Frei Tito.
Um eventual atentado contra a vida do próprio arcebispo provocaria o clamor da comunidade internacional, desnudando, para o mundo, o regime autoritário brasileiro. Era preciso evitar essa exposição, buscando-se um meio indireto.
A vida do jovem Padre Henrique, então, aos 28 anos, foi escolhida para esse fim. Após o reconhecimento do corpo, o velório foi realizado na matriz do Espinheiro.
A censura impediu a imprensa de divulgar o fato
Nos arredores, um numeroso aparato policial intimidava quem desejasse aproximar-se. Mesmo assim, dezenas de sacerdotes e uma multidão de pessoas seguiram a pé até o cemitério da Várzea, enfrentando a presença ostensiva das forças policiais.
À porta do cemitério, Dom Helder pediu à multidão que deixasse que apenas a família adentrasse, conclamando os presentes a promoverem um silêncio profundo.
Anos depois, declarara o Dom da Paz: "era um silêncio que gritava". O hino da Campanha da Fraternidade "Prova de amor maior não há, que doar a vida pelo irmão" virou um símbolo daquele trágico acontecimento, marcando a resistência à ditadura no Recife.
Passados 56 anos, a memória do padre Henrique permanece viva, inspirando todos aqueles que lutam pela causa dos direitos humanos neste país.
Justiça não se faz com esquecimento.
Ditadura nunca mais.
Padre Henrique, presente.
José da Costa Soares, promotor de Justiça