Câmeras com reconhecimento facial podem aprofundar desigualdades em hospitais, alerta instituto
Enquanto a Secretaria de Saúde alega mais segurança, especialistas e sindicatos criticam o investimento e alertam para a violação de direitos

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A recente decisão do Governo de Pernambuco de instalar um sistema de videomonitoramento com reconhecimento facial em sete hospitais públicos da Região Metropolitana do Recife está gerando um intenso debate.
Com um investimento de R$ 15 milhões, a medida, justificada pela Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE) como uma forma de "melhorar o controle de acesso" e ampliar a segurança de pacientes e profissionais, acendeu um alerta em organizações da sociedade civil e sindicatos da área da saúde.
O Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec) publicou uma nota expressando profunda preocupação, classificando a iniciativa como uma "grave ameaça aos direitos fundamentais da população".
Segundo o instituto, a adoção de tecnologias de vigilância em espaços de cuidado e acolhimento compromete o acesso pleno à saúde e pode agravar desigualdades estruturais.
A organização destaca que sistemas de reconhecimento facial são conhecidos por apresentar um alto índice de erro com pessoas racializadas e trans, grupos que já enfrentam barreiras no acesso à saúde pública.
Para o IP.rec, a medida, em vez de garantir segurança, pode levar a constrangimento, exclusão e até violência institucional.
Além do risco de discriminação, o instituto aponta que o uso da tecnologia em hospitais fere princípios da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), como a minimização de dados e a proporcionalidade.
A coleta de biometria facial, um dado sensível e irreversível, em ambientes de saúde, poderia abrir precedentes perigosos para o uso indevido dessas informações.
"Em um estado com a pior cobertura de atenção básica à saúde no Nordeste, superlotação hospitalar e profissionais sobrecarregados, é urgente priorizar investimentos em acesso, acolhimento e qualidade no atendimento, e não em tecnologias que podem aprofundar desigualdades", afirma a nota do IP.rec.
A SES-PE, por sua vez, defende o projeto. O diretor geral de tecnologia da secretaria, Rodrigo Brennand, afirmou em entrevista à TV Jornal que a segurança é uma prioridade e que as 890 câmeras serão instaladas em áreas estratégicas, respeitando a LGPD e a privacidade, sem filmar locais sensíveis como consultórios.
A reação entre os profissionais de saúde é mista. Ludmila Outtes, presidente do Sindicato dos Enfermeiros de Pernambuco, declarou que "a categoria recebeu com muita revolta" o anúncio do investimento, apontando a falta de profissionais, medicamentos e materiais como prioridades mais urgentes.
Já o Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe) vê a medida como potencialmente válida para coibir violência e organizar o fluxo, mas ressalta a necessidade de resguardar a autonomia e a privacidade no exercício da medicina, mantendo-se vigilante contra possíveis usos indevidos do sistema.