SBPC 2025: Abertura dos debates defende projeto nacional de ciência como base da soberania do Brasil
Com mais de 200 atividades gratuitas, a 77ª SBPC convida o público a oficinas, exposições, palestras, feiras e rodas de conversa até o dia 19/07

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A defesa da soberania tecnológica e científica do Brasil voltou a ganhar destaque na abertura da programação científica da 77ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorre na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) até o próximo sábado (19).
Nesta segunda-feira (14), a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, ministrou uma conferência temática na qual destacou os avanços do setor no país e reforçou a importância de um projeto nacional de desenvolvimento diante das disputas e crises geopolíticas globais — em crítica à decisão política dos Estados Unidos de impor uma tarifa comercial de 50% contra o Brasil.
Segundo a ministra, a atual revolução tecnológica tem provocado mudanças profundas nos modos de produção e nas forças produtivas, tanto no Brasil quanto no mundo. Ela ressaltou que áreas como inteligência artificial, biotecnologia, robótica avançada e computação quântica estão transformando os processos produtivos e impactando diretamente diversos setores, inclusive os serviços públicos essenciais.
Luciana alertou, no entanto, que esses avanços também são influenciados por decisões políticas. “A covid-19 foi um exemplo claro de como, em situações críticas, é preciso mais ciência e mais tecnologia. No entanto, enfrentamos um cenário político que virou as costas para a ciência, ignorando as orientações da Organização Mundial da Saúde e até mesmo a importância da vacinação, que é o óbvio”, afirmou.
Ainda durante sua apresentação, a ministra Luciana Santos ressaltou o papel do estado, em termos de políticas públicas, como indutor desse crescimento científico e tecnológico. "Não se fez ciência e tecnologia sem um grande aporte de recursos públicos. A gente precisa transformar conhecimento em riqueza e em soluções para nossa gente", afirmou.
O Brasil mantém a 13ª posição no mundo em termos de produção de artigos e revisões de pesquisa, logo atrás da Índia (10º) e da Coréia do Sul (12º), porém à frente da Rússia (15º) e da África do Sul (21º) – países que compõem o BRICS ao lado do Brasil. Entretanto, o país está em 50º lugar em inovação.
"Ou seja, o que a nossa excelência da inteligência produz, e é no sistema público de ciência e tecnologia, é nas universidades, no institutos de pesquisa que tem 90% da nossa produção. Ela precisa e realizar em produtos e serviços para dar conta dos desafios nacionais e é isso que precisamos enfrentar", pontuou Luciana Santos.
Entidades científicas defendem democracia e soberania nacional
A Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) divulgaram, nesta segunda-feira, uma nota de repúdio às recentes ações do governo dos Estados Unidos.
"O Brasil é uma nação democrática, com instituições legítimas e uma comunidade científica ativa, plural e comprometida com os valores da liberdade, da justiça social e do desenvolvimento sustentável. A ciência tem papel central na construção da soberania e da autonomia nacional, e não pode ser subjugada por interesses externos de natureza política ou econômica", afirma o documento.
Durante a conferência temática, o presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro, destacou a importância de proteger o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro contra represálias, ameaças e ataques de governos estrangeiros, como o do presidente Donald Trump.
"Isso pode ser feito graças à ciência, que tem todas as condições de ser o principal fator de desenvolvimento econômico. Os Estados Unidos conseguiram, em quase dois séculos, se tornar a maior potência do mundo graças ao uso útil da ciência. A China, em poucas décadas, sombreia com os Estados Unidos nesse ponto", disse Ribeiro.
O presidente da SBPC também reforçou a necessidade de um compromisso efetivo do governo brasileiro — incluindo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário — com a valorização da ciência.
"Nesse momento, sofremos medidas que nos preocupam, como os cortes no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que deveria manter o volume de recursos tanto para empréstimos quanto para o financiamento a fundo perdido de pesquisas em instituições públicas. Tudo isso deveria ser preservado", criticou.
Reconhecer a origem das pesquisas requer investimentos para fortalecer os trabalhos desenvolvidos
Esta é a sexta vez que o Recife recebe a Reunião Anual da SBPC, mas é a primeira vez que a Universidade Federal Rural de Pernambuco sedia o evento. Para a reitora da UFRPE, Maria José de Sena, é uma grande responsabilidade receber o maior evento de ciência da América Latina.
"Não é só para a UFRPE, mas para o estado de Pernambuco e para o Recife. Esse é um momento ímpar. Estamos trazendo várias discussões, como a ciência quântica, o que está ocorrendo hoje e quais são os desafios das pesquisas sobre o câncer, muitas discussões sobre o meio ambiente, considerando que a COP 30 já está aí, 'batendo na porta' da gente. Então, esses temas da ciência, que hoje têm um olhar da sociedade bastante preocupado e que trazem impacto nas nossas vidas, serão trabalhados durante esta semana", afirmou a reitora.
Ainda de acordo com Maria José, a programação também inclui espaço para discutir os investimentos em educação. As universidades federais têm pleiteado a recomposição orçamentária para garantir seu pleno funcionamento. Assim como a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) divulgou na última semana que só possui recursos para funcionar até outubro deste ano, a UFRPE também enfrenta a mesma situação.
"Para ter ciência, para ter desenvolvimento, tem que ter investimento. As 69 universidades federais do país passam pelo mesmo momento de crise orçamentária. Estamos fazendo várias frentes junto ao governo federal, mas a situação não é fácil. Tem que se pensar num planejamento, que tenha consistência e permanência de desembolso orçamentário", criticou a docente.
No caso da UFRPE, o orçamento previsto para este ano é menor do que o montante destinado em 2014 — a instituição tem R$ 74 milhões, enquanto, há 11 anos, o recurso era de R$ 76 milhões.
"Do nosso orçamento, só podemos utilizar 1/12 avos, porque eu não tenho autonomia para trabalhar com esse orçamento. Então, do que temos mensalmente para receber, são R$ 6 milhões, mas a nossa necessidade é de quase R$ 10 milhões", explicou.
Programação da SBPC
Com mais de 200 atividades gratuitas, a 77ª Reunião Anual da SBPC convida a população a participar de oficinas, exposições, palestras, rodas de conversa, feiras científicas, apresentações culturais e ações voltadas a públicos de todas as idades.
Uma das principais atrações é a ExpoT&C, que reúne mais de 40 expositores — desde universidades e institutos de pesquisa públicos e privados até empresas, órgãos governamentais, sociedades científicas e agências de fomento. O evento segue até o dia 19 de julho, no campus Dois Irmãos da UFRPE. A mostra apresenta as mais avançadas tecnologias, produtos e serviços desenvolvidos no país.
Participam cientistas do Brasil e do exterior, estudantes, professores, lideranças sociais, representantes de povos tradicionais e populares, além de autoridades como a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, o ministro da Educação, Camilo Santana, e o CEO da American Association for the Advancement of Science (AAAS), Sudip S. Parikh.
A programação completa pode ser acessada no site oficial da SPBC, pelo link: https://ra.sbpcnet.org.br/77RA/.