Censo Escolar 2024: ampliação da oferta de tempo integral exige investimentos estruturais nas escolas públicas
Em Pernambuco, o número de matrículas no Ensino Médio em 2024 foi de 338.112, sendo 206.927 delas em escolas de tempo integral

O aumento no número de matrículas no Ensino Médio — tanto nas redes públicas quanto privadas — apontado pelos dados do Censo Escolar 2024, divulgados na última quarta-feira (9), teve como destaque o crescimento da modalidade em tempo integral.
Embora a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) — que estabelece que, até 2024, 25% das matrículas no Ensino Médio e no Ensino Fundamental deveriam ser em tempo integral — ainda não tenha sido atingida, o resultado foi bem recebido não apenas pelo governo federal, que tem investido fortemente, a exemplo do programa de incentivo financeiro-educacional Pé-de-Meia, em ações para combater a evasão escolar nessa etapa, mas também pelos governos estaduais, responsáveis pela maior parte dessas matrículas.
Em Pernambuco, o número de matrículas no Ensino Médio em 2024 foi de 338.112, sendo 206.927 delas em escolas da rede pública estadual, na modalidade integral. Isso colocou o estado, segundo o Ministério da Educação (MEC), na liderança nacional em número de estudantes matriculados em escolas com jornadas ampliadas, o que representa 69,6%.
Entretanto, a expansão da jornada escolar precisa ser mais do que uma meta quantitativa: ela deve representar uma transformação qualitativa e social. Isso significa que esse avanço deve se refletir também na qualidade do ensino, o que envolve a melhoria e manutenção da infraestrutura, valorização dos professores e profissionais da educação, e garantia de uma merenda escolar de qualidade.
"O que precisamos observar e também avaliar é como essa educação nas escolas de tempo integral está sendo conduzida pelos estados e municípios", afirmou o pesquisador do Observatório da Equidade Educacional do Núcleo de Excelência em Tecnologias Sociais (NEES) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Thomaz Edson Veloso, em entrevista à coluna Enem e Educação.
"De uma forma geral, o Brasil é um país de muitas desigualdades sociais e educacionais. Então, se a gente tem essa informação como premissa, políticas que atacam ou que tentem, de algum modo, diminuir essas desigualdades são, ao meu ver, muito bem-vistas por toda a população. Nesse cenário, se temos uma escola de tempo integral que possibilita a influência de políticas públicas associadas à inclusão e à igualdade racial, estamos atendendo a uma demanda — ou a uma premissa — do próprio Ministério da Educação."
-
Censo Escolar 2024: Pernambuco tem queda de matrículas na educação básica e especialistas apontam desigualdades a serem superadas
-
Censo Escolar 2024: Número de crianças matriculadas na creche e na pré-escola fica abaixo da meta
-
Censo Escolar 2024: Pernambuco mantém a liderança de matrículas em tempo integral; educação profissional e EJA apontam desafios
Reivindicações
No mesmo dia em que os dados do Censo Escolar 2024 foram divulgados, mais de 200 escolas estaduais realizaram atividades e protestos no Dia Estadual de Mobilização em Defesa da Escola Pública, segundo o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco (Sintepe).
As ações ocorreram entre os turnos pedagógicos e não resultaram na paralisação das aulas. De acordo com o Sintepe, "foram priorizadas escolas onde a infraestrutura era reconhecidamente precária".
“O que temos visto é a estrutura das escolas deficitária, com a recorrência de muitas reclamações sobre bancas escolares quebradas, pouca variedade e qualidade da merenda, ou falta de fardamento. Se temos mais de 86% dos nossos jovens matriculados nas escolas estaduais e essas instituições não oferecem as condições mínimas para o ensino e a aprendizagem, significa que estamos negando o direito à educação para nossos jovens”, exemplificou Ivete Caetano, presidenta do Sintepe.
Sobre a climatização das unidades de ensino, a Secretaria de Educação do Estado (SEE-PE) afirma que mais de 15 mil aparelhos de ar-condicionado já foram assegurados. Das 1.069 escolas da rede, 500 já contam com climatização, e a previsão é de que as 569 restantes sejam equipadas até o final do ano.
Outro ponto que vem chamando atenção — e que foi alvo de inúmeros questionamentos por parte dos estudantes durante uma audiência pública na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), com a presença do secretário estadual Gilson Monteiro — diz respeito à qualidade da merenda escolar.
Foram registradas denúncias em escolas de Referência em Ensino Médio (EREM) como Filipe Camarão, Augusto Severo e Bernardo Vieira, localizadas no município de Jaboatão dos Guararapes, além da Escola de Referência em Ensino Fundamental e Ensino Médio (EFEM) Governador Barbosa Lima, no Recife.
Segundo o Paulo Dutra, secretário executivo de Ensino Médio e Profissional do Estado, em resposta a coluna Enem e Educação, nessa quinta-feira (10), houve uma reunião com o titular da pasta, os secretários executivos e os gerentes das Gerências Regionais de Educação e Escola para que fossem realizada uma visita por escola.
"Ninguém está aqui dizendo que tudo esta perfeito, muito pelo contrário, o que estamos dizendo é que estamos batalhando para melhorar dia a dia. Eu também acredito que não se pode ter escola de tempo integral de qualidade, se você não tiver a merenda de qualidade também. Estamos fazendo esse levantamento", afirmou Dutra.
Educação Profissional
De acordo com o Censo Escolar 2024, a educação profissional e tecnológica (EPT) registrou 2.575.293 matrículas em 2024, das quais 1.570.993 foram na rede pública. Já a proporção de matrículas no ensino médio regular com formação técnica ou vocacional alcançou 17,2% entre 2022 e 2024, com aumento de 3,4 pontos percentuais no período.
Em Pernambuco, houve um recuo no número de alunos inscritos nesta modalidade de ensino. Em 2023, o total de matrículas (federais, estaduais, municipais e privadas) foi de 130.763, enquanto em 2024, foram registradas 110.230 matrículas.
Ao analisar apenas as escolas públicas estaduais, em 2024, foram registradas 52.984 matrículas, enquanto no ano anterior, a rede estadual contava com 72.124 matrículas.
Os pesquisadores Rodrigo Lins Rodrigues, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), e Gabriel Fortes, da Universidad Alberto Hurtado (Chile), ambos integrantes do Observatório de Equidade Educacional (NEES/UFAL), afirmam, em entrevista à coluna Enem e Educação, que a expansão da educação profissional técnica no Ensino Médio ainda enfrenta uma série de obstáculos que, embora já conhecidos, continuam desafiadores em grande parte do país.
"Um dos principais entraves está na infraestrutura das escolas, especialmente em regiões rurais e periféricas, onde a ausência de laboratórios, oficinas, equipamentos específicos e conectividade adequada limita a oferta de cursos técnicos integrados à formação geral. Segundo o Censo Escolar 2024, 26% das escolas de ensino médio ainda não possuem acesso à internet apropriada para atividades pedagógicas — um dado que compromete diretamente a modernização das práticas de ensino técnico", explicou Rodrigo Lins.
Outro desafio é a falta de professores com formação técnica específica. Muitos cursos oferecidos pelas redes estaduais não contam com profissionais habilitados, o que compromete a qualidade do ensino e a efetividade dos itinerários formativos do Novo Ensino Médio. A baixa atratividade da carreira para profissionais do setor produtivo, que geralmente encontram melhores condições fora da educação, agrava esse cenário.
Para o secretário executivo de Ensino Médio e Profissional do Estado, a rede deverá ter um acréscimo considerável de alunos no ensino técnico, a partir da oferta da modalidade como quinto itinerário formativo.