EDUCAÇÃO BÁSICA | Notícia

Censo Escolar 2024: Pernambuco tem queda de matrículas na educação básica e especialistas apontam desigualdades a serem superadas

Em Pernambuco, houve uma redução de 27.685 matrículas na educação básica, que passou de 2,149 milhões, em 2023, para 2,121 milhões no ano passado

Por Mirella Araújo Publicado em 11/04/2025 às 12:56 | Atualizado em 11/04/2025 às 17:08

Os resultados do Censo Escolar 2024, divulgados na última quarta-feira (9) pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), revelam que ainda existem desafios significativos a serem superados para alcançar avanços na educação.

Além disso, os dados reforçam que o país não conseguiu cumprir muitas das metas estabelecidas no Plano Nacional de Educação (PNE), cuja vigência, que terminaria no ano passado, foi prorrogada até o dia 31 de dezembro de 2025. Enquanto isso, um novo plano com metas e diretrizes para os próximos 10 anos ainda está em discussão no Congresso Nacional.

Segundo os dados do Censo Escolar 2024, o Brasil registrou 47,1 milhões de estudantes, distribuídos por 179,3 mil escolas em todas as etapas da Educação Básica. Em comparação com 2023, houve uma redução de 0,5% nas matrículas, o que representa uma diminuição de 216 mil alunos.

No entanto, ao analisar os dados por etapa de ensino, é possível identificar as principais diferenças no acesso à educação, evidenciando as disparidades entre as diferentes faixas etárias e regiões. Em Pernambuco, houve uma redução de 27.685 matrículas na educação básica, que passou de 2,149 milhões, em 2023, para 2,121 milhões no ano passado.

De acordo com Carlos Eduardo Moreno Sampaio, diretor de Estatísticas Educacionais do Inep, a redução nas matrículas não deve ser encarada como um problema, desde que esteja dentro dos limites demográficos de cada faixa etária. “É natural que haja variação, considerando a dinâmica populacional do Brasil”, afirmou.

Moreno destacou ainda a relevância da colaboração entre os diferentes níveis de governo para o avanço educacional. “Quase metade dos estudantes da educação básica são atendidos pelos municípios, o que torna a articulação entre MEC, estados e prefeituras fundamental para enfrentar os desafios no atendimento educacional”, concluiu.

Educação Infantil

 No que diz respeito à Educação Infantil, que abrange as etapas de creche (0 a 3 anos) e pré-escola (4 a 5 anos), o estado reflete a estagnação observada em nível nacional. O PNE estabelece como meta a ampliação das vagas em creches e pré-escolas, com o objetivo de atender pelo menos 50% das crianças de até 3 anos e garantir a universalização da educação infantil para crianças de 4 a 5 anos.

Em 2023, as matrículas na pré-escola somaram 233.012 alunos, enquanto as creches registraram 125.321. Já em 2024, o número de matrículas na pré-escola aumentou para 233.190, o que representa um pequeno crescimento de 178 alunos. Na creche, o número de matrículas subiu para 130.889, com um acréscimo de 5.568 matrículas em relação ao ano anterior.

Segundo a pedagoga e professora do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Catarina Gonçalves, em entrevista à coluna Enem e Educação, ainda há muitos municípios pernambucanos onde a oferta de creche é inexistente. Isso ocorre, em parte, porque, embora a legislação determine que é responsabilidade dos municípios promover o acesso à creche, ela não é uma obrigatoriedade, como é o caso da pré-escola. Como resultado, muitos gestores continuam a não investir o necessário. 

"Por que isso acontece? Primeiro, pela falta de políticas públicas efetivas para garantir a oferta de creches. E estamos falando de creches em tempo integral, que demandam um custo elevado. Segundo, há a questão da estrutura dessas unidades, que apresentam demandas específicas que outras etapas da educação básica não enfrentam, como as cinco refeições diárias, itens de higiene, fraldas e uma maior relação adulto-criança, já que é necessário contar com um número maior de educadores", explicou a doutora em Educação.

No caso da pré-escola, em que a matrícula é compulsória, mas que também não apresentou grandes avanços no Censo Escolar 2024, Catarina Gonçalves chama atenção para o fato de que não há fiscalização por parte do Poder Público para que essas crianças possam ter seu direito de estarem na escola garantidos. "Inclusive está tipificado no código penal que os pais que não matricularem seus filhos na escola, eles respondem por abandono intelectual, mas não tem fiscalização. A matrícula de crianças de 4 e 5 anos é um direito indiscutível", pontuou a pedagoga. 

Edson Holanda / PCR
Prefeitura do Recife afirmou que parte do recurso irá ser investido na triplicação das vagas em creches - Edson Holanda / PCR

Ensino Fundamental

O Censo Escolar 2024 mostrou que, em Pernambuco, as matrículas dos anos iniciais se mantiveram estáveis, com uma diferença de 0,04% em relação ao ano anterior. Foram registradas 6.647 matrículas na rede estadual, 470.317 na rede municipal e 196.054 na rede privada.

Já nos anos finais, houve uma redução de 1,32% nas matrículas em comparação aos dados de 2023. No total, as escolas estaduais possuem 119.023 matrículas, as unidades municipais têm 315.403 matrículas e a rede privada conta com 112.710 matrículas.

Embora esses números reforcem um maior protagonismo dos municípios na oferta desta etapa, já que concentram o maior número de matrículas, também destacam desafios para garantir qualidade e equidade no ensino.

Um dos principais obstáculos é a infraestrutura escolar. Muitas escolas municipais ainda funcionam em prédios antigos, com salas de aula inadequadas e falta de espaços para atividades complementares, acessibilidade e uso de tecnologias educacionais. Essas limitações comprometem a qualidade do ensino e dificultam a implementação plena da educação em tempo integral.

Segundo os pesquisadores Rodrigo Lins Rodrigues, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), e Gabriel Fortes, da Universidad Alberto Hurtado (Chile), do Observatório de Equidade Educacional (NEES/UFAL), em entrevista à coluna Enem e Educação, "os municípios enfrentam desafios críticos como a falta de recursos financeiros, infraestrutura inadequada e a alta rotatividade de profissionais. Além disso, a formação continuada de professores e a gestão eficiente são essenciais para melhorar a qualidade do ensino, especialmente na alfabetização, na transição entre etapas e no suporte psicossocial."

"É fundamental destacar que muitas redes municipais atendem a populações em situação de vulnerabilidade, o que exige um olhar atento para as questões de equidade. Crianças negras, indígenas, quilombolas, com deficiência ou vivendo em contextos de pobreza enfrentam barreiras adicionais ao aprendizado, que só podem ser superadas por meio de políticas específicas, intersetoriais e territorializadas", afirmou o pesquisador Rodrigo Lins Rodrigues. 

Educação de Jovens e Adultos (EJA)

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem encolhido desde 2018, segundo dados do Ministério da Educação (MEC). Em 2024, foram registrados 2,4 milhões de estudantes nessa modalidade, sendo 2,2 milhões na rede pública e cerca de 200 mil na rede privada.

Em Pernambuco, a EJA também segue em declínio. De acordo com o Censo Escolar 2024, o estado contabiliza 73 mil matrículas no Ensino Fundamental da EJA — mais de 18 mil na rede estadual, 54.334 na rede municipal e 1.218 em escolas particulares. Em 2023, o total de matrículas era superior a 77 mil alunos, o que representa uma queda de aproximadamente 5,2% em um ano.

"A modalidade da EJA ainda carrega um certo estigma social e é muitas vezes vista como uma alternativa de menor prestígio, o que pode desestimular potenciais estudantes a buscar a escolarização formal. A falta de políticas públicas específicas, investimentos contínuos e estratégias pedagógicas realmente voltadas à diversidade de trajetórias de vida também contribuem para a evasão e para a baixa adesão à modalidade", avaliou  o pesquisador Rodrigo Lins Rodrigues.

No Ensino Médio, em 2023, foram registradas 48.675 matrículas na EJA, sendo 47.030 em escolas públicas estaduais, 114 na rede municipal, 1.191 na rede privada e 340 na rede federal. No ano seguinte, o total de matrículas subiu para 50.136, representando um crescimento de aproximadamente 3%. Apesar do aumento geral, os dados mostram uma concentração ainda maior na rede estadual, que passou a ter 48.862 inscritos, um crescimento de 3,9%. Por outro lado, a rede municipal teve uma leve queda de 3,5%, passando de 114 para 110 matrículas.

A rede privada também registrou redução, com uma queda de 18,4%, indo de 1.191 para 972 matrículas. Já a rede federal apresentou a maior retração proporcional, com uma diminuição de 43,5%, caindo de 340 para 192 alunos.

Compreender de fato os motivos da queda nas matrículas é o grande desafio atual, segundo o pesquisador do Observatório da Equidade Educacional do Núcleo de Excelência em Tecnologias Sociais (NEES) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Thomaz Edson Veloso, em entrevista a coluna Enem e Educação.

Isso significa que olhar apenas os números não revela as causas por trás do cenário que estamos observando. Muitas pessoas acima dos 17 anos que não concluíram sua formação no tempo regular ainda podem retornar aos estudos por meio da Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Se esse público é significativo dentro da nossa sociedade, é fundamental oferecer oportunidades reais de acesso à modalidade. Isso exige o fortalecimento das ações de sensibilização e convencimento para que essas pessoas voltem a estudar.

"Por outro lado, a partir do momento que a gente aumenta a oferta da educação regular, e aumenta o atendimento às crianças em idade escolar, com o tempo passando, a necessidade de turmas de Educação de Jovens e Adultos acaba diminuindo, porque esse atendimento em idade escolar. É claro que essa relação demora pelo menos, um ciclo formativo de um indivíduo que seria de 12 anos, quando ele ingressa no ensino básico e chega ao final do terceiro ano do ensino médio", completou Thomaz Edson Veloso.

 

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