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Ambientalistas desaprovam licença para Petrobras na Foz do Amazonas e alertam para riscos ao meio ambiente

ONGs e cientistas afirmam que licença na Foz do Amazonas ameaça ecossistemas, fere compromissos climáticos e expõe o Brasil a críticas

Por Eduardo Scofi Publicado em 21/10/2025 às 11:19

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A licença concedida pelo Ibama para que a Petrobras perfure o poço Morpho, na bacia da Foz do Amazonas, provocou forte reação de ambientalistas e cientistas. Organizações da sociedade civil afirmam que a decisão representa um retrocesso ambiental e ameaça direta a uma das regiões mais sensíveis do planeta.

Segundo o Observatório do Clima, a medida é “desastrosa do ponto de vista ambiental, climático e da sociobiodiversidade”. O grupo informou que vai acionar a Justiça para pedir a anulação da licença e denunciar o que considera ilegalidades no processo de licenciamento.

“Lula acaba de enterrar sua pretensão de ser líder climático no fundo do oceano na Foz do Amazonas”, disse Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas da rede.

Para o Greenpeace, a autorização expõe a contradição entre o discurso internacional do Brasil e a prática doméstica. “Às vésperas da COP30, o Brasil se veste de verde no palco internacional, mas se mancha de óleo na própria casa”, afirmou Mariana Andrade, coordenadora da frente de Oceanos da organização.

Ela avalia que a abertura de novas fronteiras petrolíferas contradiz os compromissos do país com a transição energética.

Cientistas também expressaram preocupação. O climatologista Carlos Nobre, copresidente do Painel Científico para a Amazônia, afirmou que a floresta está “muito próxima do ponto de não retorno” e que não há justificativa para iniciar uma nova exploração de petróleo na região. Para ele, insistir no modelo fóssil pode comprometer o equilíbrio climático global.

Divisão dentro do governo Lula

A licença reacendeu tensões dentro do próprio governo. O Ministério do Meio Ambiente, liderado por Marina Silva, e o Ministério de Minas e Energia, sob Alexandre Silveira, travaram divergências durante o processo. A ministra defendeu o parecer técnico do Ibama, enquanto o titular do MME e a Petrobras pressionavam pela liberação.

José Cruz / Agência Brasil
Ministra Marina Silva manteve posição firme em defesa do parecer técnico do Ibama, que apontava riscos ambientais na Foz do Amazonas. - José Cruz / Agência Brasil

O Ministério do Meio Ambiente afirmou que a autorização para a Petrobras perfurar o poço 59, na bacia da Foz do Amazonas, “resulta de um rigoroso processo de análise ambiental” conduzido pelo Ibama.

Em nota, a pasta destacou que o órgão “exigiu aprimoramentos indispensáveis ao projeto, sobretudo nas medidas de resposta a emergências”, reforçando a segurança técnica do licenciamento.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva minimizou os riscos, dizendo “achar difícil” que a exploração cause danos ambientais, mas afirmou que a atividade será interrompida “caso haja problema”.

Entenda o caso

A Margem Equatorial é uma extensa faixa do litoral brasileiro que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte. A região abriga áreas marítimas profundas e pouco exploradas, com potencial para grandes reservas de petróleo e gás natural.

O bloco FZA-M-059, onde está o poço Morpho, foi leiloado em 2013, e o processo de licenciamento ambiental começou em 2014. A licença concedida pelo Ibama permite apenas a perfuração para pesquisa, etapa que serve para verificar se há petróleo em escala econômica.

Caso a presença seja confirmada, uma nova licença seria necessária para iniciar a produção.

PETROBRAS
Margem Equatorial tem grandes perspectivas de ser um novo Pre-sal no norte do Brasil. - PETROBRAS

Mesmo assim, especialistas consideram que o passo representa uma derrota ambiental. A região abriga 80% dos manguezais do país, com mais de 8 mil km² de extensão, e o maior cinturão contínuo de manguezais do mundo, entre os litorais do Pará e Maranhão.

Ricardo Fujii, especialista em conservação do WWF-Brasil, classificou a decisão como um retrocesso. “O Brasil não precisa abrir novas fronteiras petrolíferas na Amazônia para garantir segurança energética. Precisamos apostar em energias renováveis e na bioeconomia”, afirmou.

Ambientalistas apontam que, independentemente da fase exploratória não envolver produção, a perfuração em si já representa uma ameaça. Um eventual vazamento de óleo poderia atingir manguezais e recifes de corais, que se estendem por mais de 1.300 km, ainda pouco estudados. Além disso, a exploração pode afetar a pesca artesanal que sustenta comunidades do Amapá e do Pará.

Como afirmou o diretor regional para a América Latina e o Caribe da 350.org, Ilan Zugman, em entrevista à Rádio Jornal, “se fosse por uma questão técnica e científica, uma licença dessas jamais seria liberada, devido ao potencial de emissões de gases de efeito estufa e à sensibilidade da região, situada na costa do bioma amazônico".

Para ele, a decisão vai completamente na contramão das promessas e da postura do Brasil como líder climático, ainda mais às vésperas da COP30.

Reprodução/ Greenpeace
Vista aérea da Foz do Amazonas, no Amapá, onde a Petrobras recebeu licença para perfuração de poço exploratório de petróleo - Reprodução/ Greenpeace

A Foz do Amazonas é uma das áreas pesqueiras mais produtivas do Brasil, movimentando bilhões de reais por ano. Comunidades ribeirinhas e pescadores artesanais dependem diretamente desse ambiente, que pode ser impactado por ruídos, vazamentos e perturbações causadas pela perfuração.

“Passo histórico”, diz Alcolumbre; reação contrasta com ambientalistas

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), comemorou a autorização do Ibama, chamando-a de “passo histórico para o desenvolvimento do Brasil”. Segundo ele, a decisão mostra que é possível “conciliar crescimento econômico e preservação ambiental”, além de garantir benefícios às populações locais.

O entusiasmo do senador amapaense, no entanto, contrasta com a reação de ambientalistas e especialistas, que criticam o avanço da exploração na Foz do Amazonas e alertam para os impactos ambientais e climáticos da medida.

Segundo o Observatório do Clima, o discurso de “desenvolvimento sustentável” usado para justificar a exploração da Margem Equatorial reforça uma visão ultrapassada, baseada em combustíveis fósseis e em desacordo com os alertas científicos sobre a Amazônia.

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