Francisco Cunha: uma legenda na consultoria empresarial
Colunista, João Alberto traz os principais eventos pernambucanos e nacionais de sociedade, política, moda, cinema, entretenimento e temas relevantes

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Francisco Alberto Carneiro da Cunha Filho é natural do Recife, consultor, escritor e urbanista autodidata. Formado em Arquitetura e Urbanismo pela UFPE, optou por carreira pública como auditor do Tesouro Estadual antes de fundar, há 35 anos, a TGI Consultoria e cofundar a revista Algomais. Criador das Caminhadas Domingueiras, dedica-se a despertar consciência urbana e histórica no Recife. Autor de dezenas de livros, seu sonho é ver a cidade preparada para seu jubileu de 500 anos, em 2037.
Por que escolheu Arquitetura e Urbanismo?
Porque era uma espécie de meio do caminho entre ciências exatas e ciências humanas, e permitia uma atuação profissional que usava tanto ciência quanto arte, tanto conhecimento prático quanto intuição.
Chegou a atuar como arquiteto?
Profissionalmente, não cheguei a exercer a Arquitetura. Logo que me formei, fiz concurso para a Secretaria da Fazenda e me tornei Auditor do Tesouro Estadual. Depois, deixei o serviço público e passei a atuar como consultor de empresas, onde sigo até hoje. O urbanismo só veio me interessar quando passei a caminhar sistematicamente pela cidade e precisei estudar para entender o porquê da qualidade tão ruim da urbanização. Costumo dizer que me considero graduado em Arquitetura pela UFPE e pós-graduado em Urbanismo pelos pés.
Como começou o projeto das Caminhadas Domingueiras?
Estava escrevendo um livro sobre a história de Pernambuco junto com Carlos André Cavalcanti, e resolvemos ilustrá-lo com fotos do Recife atual. Quando estava fazendo a locação de dentro do carro para o estudo fotográfico, comecei a ter a sensação de que não estava vendo tudo e decidi que, quando publicasse o livro, iria andar pela cidade para tentar ver o que não estava conseguindo de dentro do carro. Passei a caminhar aos domingos, no início só, depois com alguns amigos. Quando me dei conta, estava caminhando com dezenas de pessoas que foram se agregando. Então, resolvi organizar as caminhadas coletivas. Daí surgiram as Caminhadas Domingueiras.
Por que investir em comunicação com a revista AlgoMais?
Como eu escrevia, desde 1994, uma newsletter semanal (Gestão Hoje – Conjuntura & Tendências), fui convidado, em 2005, por Antônio Magalhães e Sérgio Moury Fernandes, para criar a revista Algomais, com o objetivo de preencher uma lacuna que existia no estado. Depois de pensar um pouco, aceitei o desafio, junto com os demais sócios da TGI, com a condição de que a revista fosse um veículo de comunicação de defesa incondicional de Pernambuco. Como a condição foi aceita, passei a fazer parte do conselho editorial e a escrever a Última Página da revista. E lá já se vão quase 20 anos...
Opinião sobre o estado atual do centro do Recife?
Depois que comecei as caminhadas e o estudo da história e da urbanização do Recife, percebi que, assim como “o Recife é o museu vivo da história de Pernambuco”, posso dizer que o centro do Recife é o museu vivo da história do Brasil. Acontece que ele passou mais de meio século em decadência profunda e, hoje, recuperá-lo não é uma tarefa simples nem rápida. Mas já começou. O Bairro do Recife já iniciou um percurso de recuperação que não tem mais volta. E Santo Antônio e São José estão começando sua recuperação. Estamos trabalhando para que, em breve, comecem as construções de moradia, via retrofit, nos prédios da Guararapes.
Tem alguma cidade lhe inspira no sentido de mobilidade?
Paris. Lá tem sido feito um grande trabalho de reforço da mobilidade ativa (por bicicleta e a pé) e de restrição ao automóvel. Não sou inimigo do automóvel, o que sou contra é o automóvel e, mais recentemente, as motocicletas, ter prioridade absoluta à frente dos outros modos de deslocamento.
Quais os principais pontos a melhorar no Recife?
O Recife passou muito tempo sem planejamento de longo prazo, seja estratégico, seja urbano, e isso deixou a cidade como que “à deriva” em termos de orientação ordenada para o futuro. Com isso, passou a ser administrada com o “farol baixo”, voltada para o curto prazo, com ações de desenvolvimento pouco articuladas. Digo que, do ponto de vista urbanístico, o Recife virou uma espécie de quebra-cabeça desmontado. Só nos últimos anos é que essa perspectiva de longo prazo começou a ser retomada com o Plano Recife 500 Anos e o Projeto Parque Capibaribe, além do projeto Recife Cidade Parque.
Como surgiu a TGI Consultoria?
Quando tirei licença da Secretaria da Fazenda, fui trabalhar numa empresa de consultoria chamada Claudio Porto & Consultores Associados. Lá comecei como consultor, depois gerente, depois diretor da área de planejamento e desenvolvimento organizacional. Depois de alguns anos trabalhando com sede em Pernambuco, Claudio Porto resolveu se transferir para o Rio de Janeiro. Como não quisemos ir também, resolvemos ficar no Recife, juntamos a área de planejamento e de TI e fundamos a TGI Consultoria há exatos 35 anos.
Como enxerga a adesão do público aos seus “painéis?
Considero a adesão muito boa para uma atividade mensal remota e, uma vez por ano, no fim do ano, presencial, quando lotamos o Teatro RioMar para o balanço do ano que está terminando e projeções para o ano que vai se iniciar. Ao longo dos 27 anos da Agenda TGI, conseguimos consolidar, com um público fiel, aquele que é considerado o mais aguardado evento empresarial de final de ano no Recife. É motivo de muito orgulho.
O que é o projeto “Pernambuco em Perspectiva – Estratégia de Longo Prazo”?
Desde o início da TGI Consultoria, em 1990, observo sistematicamente o desenvolvimento de Pernambuco, inicialmente com a Pesquisa Empresas & Empresários, inclusive em parceria com o Sistema Jornal do Commercio de Comunicação. Ao longo dessas quase quatro décadas de pesquisas chegamos à conclusão de que o modelo de desenvolvimento de Pernambuco, esboçado nos anos 50 do século passado, com o apoio do lendário Padre Lebret, cuja cereja do bolo é o Porto de Suape, simplesmente se esgotou. Por conta disso, faz-se absolutamente necessária uma grande discussão que articule a sociedade, o governo e a academia, com o objetivo de redesenhar esse modelo de desenvolvimento do novo século, como as mudanças climáticas e a inteligência artificial, por exemplo.
Como escolher os líderes que participaram dos eventos?
Procuro convidar, para falar nos eventos do Pernambuco em Perspectiva, pessoas que tenham notório conhecimento sobre aspectos relevantes do desenvolvimento do estado, como foi o caso de Cristovam Buarque, Geraldo Eugênio, Sérgio Buarque, Tânia Bacelar, Raul Jungmann, Raul Henry, Sérgio Xavier, Ana Luiza Ferreira, Sérgio Cavalcante, dentre outros da mesma dimensão.
Como enxerga os possíveis futuros líderes?
Algumas pessoas gostam de dizer que pensar o futuro, nos dias de hoje, não costuma mais ser o que era antes. A meu ver, o mesmo acontece com a juventude. Para isso, contribui muito a revolução tecnológica e a impressão de maior facilidade de acesso à informação. Acontece que informação não é conhecimento, que requer o exercício do raciocínio. Tenho a impressão de que os jovens da atualidade tendem a confundir uma coisa com a outra, achando que já estão “prontos” para a liderança antes do tempo; ainda mais com o avanço da inteligência artificial, a qual não substitui, de maneira nenhuma, a inteligência “natural”, que não pode ser terceirizada sob pena de produzir líderes imaturos.
Um valor inegociável de um bom gestor?
O bom gestor precisa ter a capacidade de trabalhar, simultaneamente, com o farol alto e o farol baixo. Ou seja, capacidade de realizar no curto prazo em sintonia com o médio e o longo prazo e, ao mesmo tempo, conjugar ação local com sintonia global.
Existe alguma área empresarial pouco valorizada, porém de extrema importância?
Sem querer puxar a brasa para a sardinha, porém, mais de 40 anos de experiência em consultoria me fazem entender que a própria atividade é menos valorizada do que seria razoável, em virtude do seu importante papel de suporte e desenvolvimento à gestão e à governança, nesses tempos cada vez mais exigentes.
Opinião sobre o momento tributário do Brasil?
Até a aprovação da Reforma Tributária, vivíamos, no Brasil, um verdadeiro manicômio tributário. Uma loucura, com tributação em cascata e grande irracionalidade. Sou um otimista em relação ao que conseguimos fazer e penso que, em mais alguns anos, teremos uma importante alavancagem no desenvolvimento do país, quando a reforma estiver amplamente implantada.
Já existem preparativos para a Agenda TGI 2026?
Eu gosto de dizer que a próxima Agenda TGI começa a ser preparada quando termina a atual. Isso porque, por conta de nossa prestação de serviços de consultoria em planejamento estratégico, somos obrigados a estar continuamente atualizando os cenários econômicos, ambientais, tecnológicos, políticos etc. Com esse trabalho contínuo, vamos gerando conteúdos que julgamos ser adequado compartilhar com nossos clientes, amigos e leitores da Algomais. Daí os painéis mensais e anual da Agenda TGI. O grande evento realizaremos no Teatro RioMar, no dia 25 de novembro.
Quantos livros já escreveu ou foi coautor?
Creio que já escrevi, só e em coautoria, cerca de 30 livros sobre planejamento, gestão e governança empresarial e gestão de cidades. Todavia, outro dia descobri, espantado, que já fui editor de mais de 60 livros, uma atividade que nunca planejei exercer, mas que terminou se consolidando. Como escritor, gosto muito do livro Pernambuco Afortunado – Da Nova Lusitânia à Nova Economia, que escrevi com Carlos André Cavalcanti; dos guias de Olinda e Recife que escrevi com Plínio Santos; e do livro Calçada, o Primeiro Degrau da Cidadania, com Luiz Helvécio.
Algum líder no início da sua carreira?
Sim, em vários! Na Filosofia, Bertrand Russell e Edgar Morin. Na Teoria, Peter Drucker. Na Política, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães. Na Gestão, Murilo Tavares de Melo.
Maiores erros em empresas e gestões hoje em dia?
O maior erro é o imediatismo. São poucas as empresas, reproduzindo um erro gerencial, que conseguem conciliar o curto e o longo prazo. Um erro que, não raro, é fatal.
Um objetivo do qual se orgulha e um sonho futuro?
Tenho muito orgulho de ter ajudado a fundar a TGI e a torná-la relevante para a gestão e a governança em Pernambuco. Tenho muito orgulho também de ter criado as Caminhadas Domingueiras e de ter ajudado um bocado de gente a conhecer e a gostar mais do Recife. Meu sonho mais imediato é concluir e publicar o livro que estou escrevendo sobre a história do Recife. E meu sonho mais imediato é ainda conseguir ver o Recife como uma cidade que sabe qual é o seu futuro e caminha com ações consequentes para ele, e possa se tornar um exemplo quando completar 500 anos, em 2037, como a primeira capital brasileira a completar meio milênio.
Raio X:
Time: Sport.
Lugar bonito: A vista do Recife desde o Alto da Sé em Olinda.
Restaurante: Boteco Porto Ferreiro e Armazém São Jorge.
Hobby: História do Recife.
Esportes: Caminhada.
Comida favorita: Risoto de Camarão.
Inspiração: Millôr Fernandes e Bertrand Russel.
Livro: “Sapiens”, de Yuval Harari.
Filme: “Candelabro Italiano”, Delmer Daves.
Mania: Livros