João Alberto | Notícia

A devoção e a simplicidade do Padre Cosmo

Todas as segundas, a Coluna João Alberto traz entrevistas exclusivas com personalidades que se destacam na sociedade pernambucana

Por Julliana Brito Publicado em 15/09/2025 às 0:00 | Atualizado em 15/09/2025 às 9:13

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Padre Cosmo é um grande devoto de Nossa Senhora, nascido em Juá de Aroeiras, na Paraíba, tem 14 irmãos que moram entre Rio de Janeiro e São Paulo, e tornou-se padre aos 26 anos. Atualmente, ele está na Igreja de Santa Cruz, na Boa Vista.

Como foi sua infância?

Aos dois anos de idade fomos morar em Custódia, em lugar chamado Fazenda Sul de Novo. Foi uma infância sofrida, mas teve um lado muito bom. De experiência de vida, de oração em casa, de cuidar dos animais, de cuidar da agricultura. Não tenho o que reclamar, só a agradecer a Deus.

Em que momento você se tornou religioso?

A religiosidade começa desde a educação familiar, com a minha mãe. Eu lembro que eu era criança e já aos sábados a gente rezava dentro do oratório, com velas acesas, ouvia a Santa Missa que era transmitida pela Rádio Cultura. De tempos em tempos a gente ia à cidade para participar da missa na igreja de São José, em Custódia, onde eu fiz a primeira comunhão. Era uma experiência muito enriquecedora. Me lembro, por exemplo, num Natal, que mamãe comprou o menino Jesus, uma imagem bem pequena, e deu de presente para cada filho. Então fomos crescendo com essa presença religiosa, aprendendo e recebendo essa herança. 

Como começou os estudos católicos?

Foi depois do segundo grau. Eu já fiz o seminário em Surubim, com o Monsenhor Jonas Menezes, que me acolheu, em 1987, e ali começou. Mas já há muito tempo eu frequentava os Carmelitas, em Camocim de São Félix, com o Frei Pio. Frequentei também os franciscanos em Caruaru.

Você fez mestrado. Conte a experiência.

O mestrado que eu fiz foi em dogmática com especialização em Mariologia, recentemente em Roma. Foi tudo novo, porque eu aprendi mais como ser padre. Foi um momento de aprender uma língua diferente, uma cultura diferente, de ver que o mundo é diferente, não só é como a gente vê. Então, foi uma experiência riquíssima, foi um presente de Deus, que Nossa Senhora me deu, e eu tenho certeza que a Virgem Maria me ajudou, esteve comigo e minha mãe que está no mundo espiritual. Porque ela me estimulava muito, ela dizia: "meu filho, você ainda vai morar em Roma. Eu vou estar no céu, mas você na terra". Então foi tudo obra de Deus.

Primeira paróquia?

Nossa Sra. dos Remédios, para mim, foi uma experiência de primeiro amor, me marcou muito e passei 10 anos. Foi um momento tão bonito, tão rico, de aprendizado aos pés da Virgem Maria. Foi uma bênção. Se tem uma paróquia que eu estou com saudade, tenho muito carinho, que eu lembro com muito amor, é essa.

Cada missa é única?

Sim, cada missa é única, porque, na realidade, é o sacrifício de Cristo. A missa tem duas faces: o sacrifício e o banquete. Tem quem diga que "não pode bater palma na missa, porque o Papa João XVIII diz que bater palma na missa é aplaudir os algozes de Cristo", mas o Papa diz aquilo no contexto antes do Concílio do Vaticano Segundo, porque as pessoas eram muito radicais na liturgia, como ainda hoje algumas pessoas são. Mas a missa tem o lado festivo, então se você bate palma não é que seja um pecado. É que a liturgia deve expressar uma alegria que é de Deus, quando a gente se deixa mover pelo Espírito Santo. Claro, sem ferir a liturgia ou alterar a santa missa em si, na forma do seu rito. Mas para mim cada missa é única porque é uma experiência única diante de Deus. É como se saboreasse um alimento único.

A devoção por Nossa Senhora?

Creio que foi de mamãe, de ouvir ela rezar o terço diariamente. Mamãe lia a Bíblia, estimulava a refletir sobre a palavra de Deus. Era aquela mãe protetora, amável, mas que corrigia, dava palmadas de sandália havaianas - acho que é por isso que até hoje eu não gosto muito de sandália havaianas. Aprendi a rezar o terço, a salve rainha. Tudo ela quem me ensinou. Lembro que passei uma época sendo da Igreja Batista, e mamãe foi me tirar, dizendo que onde não tem Nossa Senhora a gente não pode ficar.

O que é a morte?

A morte para mim é um mistério, mas depois da morte de mamãe, há 12 anos, para mim, minha vida mudou, o olhar para as pessoas, para os valores, para as relações. Então, para mim, a morte é um momento muito sublime que Deus dá a cada um, onde a gente vai viver uma vida bem diferente dessa. No mundo espiritual, eu creio, à luz da revelação, que é uma vida muito boa, que Deus preparou para a gente. Como já disse São Paulo, em uma das cartas que ele escreveu, que Deus preparou coisas para a gente que os olhos não viram e o coração não sentiu, nem a mente sabe dizer aquilo que Deus preparou de tão bom para cada um de nós. Então a morte para mim é um momento de transição, mas tem muita bênção. Aqui nessa vida tudo é momentâneo e passageiro, enquanto a morte é a plenitude da vida.

Opinião sobre o novo Papa Leão XIV?

É um teólogo, muito bem preparado, com sensibilidade, popularidade, atenção e carinho. Tem uma palavra muito próxima do povo. Eu vejo que ele está exercendo muito bem o seu papado, por ser um papa jovem, tem muito a fazer pela igreja. A posição dele é como um farol que está para iluminar, mostrar a palavra de Cristo como aquela semente que é plantada no coração de cada um de nós.

O que é fé?

Algo que transcende nossos pensamentos, nossa realidade, mas é algo divino, tão sublime que acho que as palavras são poucas para definir. A Carta aos Hebreus 11:1 diz que a fé é a certeza do que não se vê e a posse dos bens espirituais. Então eu creio que a fé é essa capacidade que Deus deu a cada um de nós de a gente assumir a postura de confiança diante da presença de Deus, para que a gente possa vencer e realmente acreditar que, além dessa vida, tem uma vida melhor para a gente, que nos espera.

Quais as diferenças das duas padroeiras do Recife?

Bom, na realidade Nossa Senhora é uma só. Agora recebe os títulos Do Carmo e Da Conceição. As pessoas criam a devoção, tem fé, se dedica àquele santo, aquela santa, mas na realidade ela está se dedicando a Deus, pois os santos são de Deus. Agora, essa devoção no viés da imagem é uma maneira de direcionar o olhar, é a postura diante da vida espiritual que leva. Claro que a vida espiritual da gente deve ser pautada no evangelho, na doutrina da igreja. Então, Nossa Senhora é uma só. Às vezes as pessoas misturam, mas quando a gente sabe discernir, vê que a Virgem Maria é uma só, mas tem milhões de títulos na humanidade.

Como foi celebrar a missa no Santuário de Fátima?

Celebrar a missa no Santuário de Fátima foi uma experiência linda, porque cada missa é única, como eu sempre digo. Foi um momento que eu entreguei muito a Deus, a Santíssima Virgem e tudo deu certo, graças a Deus. Então, na minha vida hoje eu penso assim, que sempre Deus anda comigo, a Virgem Maria e o poder do Espírito Santo, e Jesus.

O que você faz no em Juazeiro do Norte?

Vou todos os anos, pois lá tem a Matriz, onde tem a pia batismal na qual o Padre Cícero foi batizado, então gosto de ir na Catedral, para rezar um pouco. Também é uma cidade muito linda, uma cidade que tem praças belíssimas. Quem não conhece, procure conhecer o Crato e Juazeiro, do Padre Cícero, que vale a pena.

Quais suas inspirações?

Sou inspirado muito em fazer orações, em fazer poemas, frases, pensamentos de autoajuda. Agora, estou fazendo um livro, já tem quase 200 orações, sobre a Virgem Maria. É um momento novo da minha vida.

Você é tutor de 6 cachorros. Quais os nomes e como é a relação com eles?

Eu tenho quatro cadelas e dois cachorrinhos. Os cachorros são Tibério e Apolo, e as cachorras são Mimosa, Cleópatra, Maria Augusta e Flávia Augusta. Eu gosto muito dos animais em geral. Se eu tivesse condição financeira eu faria uma casa só para resgatar os abandonados. Admiro quem faz um trabalho assim, de acolhimento, de ajudar os animais, que são as criaturas de Deus.

Seu curso de mariologia em Roma?

Bom! Foi um mestrado que fiz na melhor faculdade do mundo, chamada Mariano, em Roma, mas que é especialista só em Maria. Então, a gente estudava a santíssima Virgem Maria à luz da revelação de Cristo. Na verdade, a gente olha ao longo dos séculos o pensamento dos santos padres, como por exemplo Santo Agostinho, Santo Atanásio, São Bernardo de Claraval, São Pedro Damião, São Cipriano, São Tertuliano, até chegar ao Conselho do Vaticano. A gente estuda a doutrina sobre Maria ao longo da igreja nos séculos. De maneira que a minha tese foi Maria no pensamento de Dom Helder, porque é a igreja, é a minha diocese. Mas o curso foi muito bom, eu estou muito feliz, eu estou estudando mais porque a faculdade é só uma porta que se abre, a gente tem que percorrer essa nova caminhada para se aprofundar.

Em que igrejas já trabalhou?

Eu passei na igreja Nossa Senhora dos Remédios por 10 anos, depois em Bonança, Santa Teresinha, depois dois anos em São Pedro Mártir, em Olinda; São Lourenço da Mata, Rio das Velhas na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Guararapes, Igreja de Nossa Senhora da Paz, em Afogados …Graças a Deus foi muito bom, pra mim foram experiências únicas. Em cada lugar eu aprendi muito com o povo de Deus.

Depois das suas missas, o senhor atende várias pessoas. O que elas geralmente procuram?

A maioria são casais que estão em crise e pessoas que procuram a bênção para saúde. Tem muito sofrimento das pessoas, mas eu também aprendo muito, eu vejo como uma missão. Ser um auxílio na vida de alguém, é a missão que Deus chama cada um.

Ouvir tantos problemas cansa e traz problemas psicológicos?

Tem dias que eu chego em casa e estou quebrado, parece que levei uma pisa. O problema psicológico, eu não sinto não, sabe? Mas, tem coisas que me chocam profundamente. Por exemplo, quando mexe com criança, com idoso, com mulheres. Psicologicamente, não, mas fisicamente me afeta muito. E é claro que, de vez em quando, eu procuro um bom psicoterapeuta e converso um pouco. Porque tem coisas que eu preciso desabafar com alguém, eu procuro meu confessor, Padre Paulo, e converso, converso, e Deus vai dando a força. Uma coisa é certa, naquela hora que a gente está atuando ali em nome de Cristo, em nome da igreja, em nome de Jesus, a gente não está só, eu sinto que tem alguém conosco, os anjos de Deus, a força do Espírito Santo, tem alguém.

Como são suas viagens com peregrinos?

São viagens boas. A gente reza a missa, visita os lugares sagrados. Já fui quatro vezes à Terra Santa. A gente aprende muito com o guia de turismo local, é um momento de aprendizado. Esse ano vou fazer outra viagem e tô muito feliz, graças a Deus.

Tem surgido muitas novas vocações sacerdotais?

Pela estatística do Vaticano, que todo ano sai o anuário católico, a religião católica está crescendo. Se a religião cresce é um bom sinal. É claro que não é só a religião crescer, nós devemos crescer como batizados, como pessoas cristãs, crescer na fé, na oração, no amor… Porque o mundo precisa de gente com muita bondade, e aprender sempre a partilhar e amar as pessoas. As vocações sacerdotais têm surgido, por incrível que pareça, e têm aumentado. Um bom sinal é que o número de padres cresceu, padres jovens, com vigor, padres mais idosos também. Quando cresce o número de religiosos e de fiéis é sinal que o Espírito Santo está atuando. Devemos entender, aceitar e procurar crescer na fé, na doutrina e na oração, na prática da caridade.

RAIO-X

  • Time: Não sou de radicalidade do time, mas admiro muito o Sport.
  • Restaurante: Bode do Nô.
  • Comida: Comidas regionais.
  • Filme: ‘’O Morro dos Ventos Uivantes’’ e ‘’Pássaros Feridos’’.
  • Música:Música sertaneja, música clássica, música sacra e MPB.
  • Cantor: Amado Batista, Waldick Soriano, Gilliard.
  • Livro: ‘’As Glórias de Maria’’, de S. Afonso Maria de Ligório.
  • Local favorito: Beira-mar da praia
  • Hobby: Ler, sair para ver a natureza e ver documentários.

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